Libéria, no oeste da África, tira 50% dos jovens do mundo do crime oferecendo terapia e auxílio financeiro

Um estudo extraordinário realizado na Monróvia, a capital e maior cidade da Libéria, no oeste da África, revelou que a taxa de criminalidade entre os jovens pode ser drasticamente reduzida se eles tiverem apoio do Estado, com acompanhamento psicológico e uma renda básica universal.

Os pesquisadores Chris Blattman, Margaret Sheridan, Julian Jamison e Sebastian Chaskel descobriram que oferecer algumas semanas de terapia comportamental e algum dinheiro (US$ 45 por mês, ou R$ 225) para homens jovens em situação de vulnerabilidade reduz a possibilidade de que eles cometam crimes ou ajam com violência, mesmo 10 anos após a intervenção. 

Foto: Reprodução / Twitter: @cblatts

O valor de ajuda pode parecer pouco, mas é equivalente a 2 salários mínimos liberianos, sendo suficiente para a compra de alimentos e outros insumos básicos.

Em uma série de posts compartilhados no Twitter, Chris, um renomado economista da Universidade de Chicago – compartilhou que a semente do estudo foi plantada em 2009, quando ele estava saindo com um colega na Libéria chamado Johnson Borh, que lhe mostrou a capital Monróvia.

Chris, que estuda crime e violência, pediu a Borh que o levasse para visitar os bairros mais perigosos e periféricos da cidade, onde havia grande presença do tráfico de drogas e uma ausência quase total do Estado.

Libéria, país de 5 milhões de habitantes na costa oeste africana. Foto: Reprodução / Twitter: @cblatts

“Toda vez que vamos a um desses lugares marginalizados, onde muitos praticamente não tem o que comer ou vestir, vejo um cara na esquina engraxando sapatos ou vendendo roupas de carrinho de mão, ou outra coisa bem básica. Eles veem Borh, se emocionam e vem dar um abraço nele. Eu pergunto ‘como você conhece Borh?’. A cada vez, a mesma resposta: ‘Eu costumava ser um traficante’, e eles apontavam para o esconderijo de drogas ou onde roubavam carteiras, ‘mas depois passei pelo programa de Borh’. Após a 6ª vez que isso aconteceu, fiz Borh me contar tudo sobre o seu programa. Chama-se STYL: Transformação Sustentável da Juventude na Libéria”, compartilhou Chris no Twitter.

O programa Transformação Sustentável da Juventude na Libéria ofereceu a dezenas de homens oito semanas de terapia cognitivo-comportamental, um método baseado em evidências para lidar com questões como ansiedade, comportamento violento e estresse.

Foto: Reprodução / Twitter: @cblatts

Segundo o portal Vice, Borh adaptou a estratégia terapêutica para lidar com questões como violência e crime. “Ele e sua organização, a NEPI, recrutaram os homens mais perigosos da cidade. Pessoas que levavam vidas de violência. Os psicólogos se encontravam com eles em prédios abandonados, em grupos de talvez 20 pessoas por algumas horas por dia”, explicou Chris.

Durante essas reuniões, os homens também se reuniam com um conselheiro e praticavam mudanças comportamentais específicas, como controlar a raiva e exercer seu autocontrole.

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Eles também eram instruídos a construir uma nova identidade, completamente diferente de seu passado, mudando suas roupas e cortes de cabelo e trabalhando para se reintegrar à sociedade convencional.

Intrigado com o que viu, Chris decidiu realizar um grande estudo controlado com 999 dos homens mais perigosos de Monróvia, recrutados nas ruas, para estudar formalmente o quão eficaz esse tipo de programa poderia ser.

Os 999 homens, predominantemente jovens, foram divididos em quatro grupos. O primeiro recebeu apenas sessões de Terapia cognitivo-comportamental (CBT, na sigla em inglês) por 8 semanas. O segundo recebeu 200 dólares (R$ 1 mil) em espécie; o terceiro recebeu tanto a terapia quanto a ajuda financeira, enquanto o último não recebeu nada em dinheiro e ficou apenas em observação (grupo de controle).

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Um mês após a intervenção, os pesquisadores determinaram que tanto o grupo exclusivo de terapia quanto o grupo de terapia que recebia dinheiro estavam apresentando resultados positivos.

Um ano depois, eles descobriram que, embora os efeitos positivos naqueles que fizeram terapia tenham diminuído um pouco, aqueles que fizeram terapia e ganharam dinheiro ainda estavam mostrando grandes impactos. Tanto que o crime e a violência caíram cerca de 50%.

No entanto, Chris ainda não tinha certeza se os resultados se mostrariam duradouros a a longo prazo. Além disso, os especialistas com quem conversou previram que os resultados diminuiriam drasticamente ao longo dos anos, como acontece em muitas intervenções.

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Mas, de forma surpreendente, o resultado do estudo foi chocante de tão positivo! Chris rastreou os homens que participaram da pesquisa original 10 anos depois e os reavaliou, ficando muito feliz ao descobrir que o crime e a violência diminuíam em cerca de 50% entre aquele grupo que recebia terapia mais dinheiro.

De acordo com o pesquisador norte-americano, houve 338 crimes a menos por participante em 10 anos. Dado que havia custado apenas US$ 530 por participante para implementar o programa, o custo final foi de US$ 1,50 para cada crime evitado.

Mas por que a combinação de terapia e o auxílio financeiro funcionou? Chris acredita que os US$ 200 dados a cada homem permitiram que eles pagassem suas dívidas e até abrissem seus próprios negócios após o término da terapia. Isso também facilitou a consolidação de uma nova identidade, fora do crime, e mudanças comportamentais sólidas e pacíficas. “Basicamente, deu-lhes tempo para praticar o que é ser um bom cidadão”, disse o pesquisador.

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Inspirado pelo programa “STYL” na Libéria, a Universidade de Chicago vem implementando um programa semelhante, mas mais intensivo, chamado “READI”, no qual homens dos bairros mais violentos da cidade de Chicago, em Illinois (EUA), participam de sessões de terapia pela manhã e treinamento profissional à tarde por um período de 18 meses.

A cidade também abriga um programa chamado “Becoming a Man (BAM)”, ‘Se Tornando um Homem’, em tradução livre, onde alunos do ensino médio fazem sessões em grupo inspiradas na Terapia Cognitivo Comportamental (TCC).

Um estudo controlado determinou que as prisões criminais caíram cerca de metade durante o programa “BAM”.

Foto: Reprodução / Twitter: @cblatts

Embora seus efeitos tenham se dissipado ao longo do tempo, o programa foi muito econômico. “Trata-se de uma política progressiva e racional de ajuda social”, disse David Brotherton, sociólogo da Universidade da Cidade de Nova York. “A inclusão social é o meio mais produtivo de controle social e de uma sociedade mais justa”.

Fonte: GNN
Fotos: Reprodução / Twitter: @cblatts

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