SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Desde que o Sukhoi Su-57 levantou voo pela primeira vez, há 11 anos, a Rússia não anunciava o lançamento de um novo modelo de avião de caça. Isso até esta terça (20), quando a mesma fabricante revela o Checkmate (xeque-mate, em inglês mesmo).
Trata-se de, assim como o irmão mais velho, de um avião que se anuncia de quinta geração. Conceito elástico, ele sugere capacidades de ser algo furtivo ao radar, fusão de dados sofisticada, integração com outras aeronaves e alto desempenho supersônico.
A Sukhoi apenas apresentou no salão aeroespacial Maks-2021 uma maquete do avião, que ainda não tem uma designação oficial. Não se sabe nada acerca do seu estágio de desenvolvimento ainda.
A marca, que integra a divisão de aviões de combate do conglomerado russo United Aircraft Corporation com a MiG, antecipou o surpreendente anúncio com uma eficaz campanha de viralização com vídeos e postagens em redes sociais nas duas últimas semanas.
Nela, a vocação naval do caça era sugerida com a presença de sensores de rastreio de navios. A maquete era acompanhada por um míssil antinavio KH-59MK.
Para prestigiar o evento, o próprio presidente Vladimir Putin esteve presente na abertura em Jukovski, perto de Moscou.
Isso reflete a ambição russa: convencer potenciais compradores no exterior, preferencialmente em mercados emergentes da Ásia, Oriente Médio e até América Latina, de que o avião é viável e irá incorporar de forma mais barata as tecnologias testadas no Su-57.
Assim, o desenho apresentado na maquete sugere uma versão peso-leve do grande avião bimotor que entrou em operação apenas no fim de 2020. Ele é monomotor, o primeiro caça do tipo desenhado no país desde a estreia do MiG-23 em 1970.
Isso barateia as coisas, talvez colocando um avião desses com um preço de prateleira em torno de US$ 50 milhões, ante US$ 80 milhões do americano F-35, seu alvo principal –conhecido por ser caríssimo para operar (US$ 38 mil/hora-voo).
Num dos vídeos da Sukhoi, pilotos de países-alvo da Rússia eram chamados para conhecer o avião: havia um emirati, um indiano, um vietnamita e até um argentino.
O vizinho do Brasil tem uma Força Aérea em estado de petição de miséria, e foi abordada neste ano pela China para a aquisição de caças leves FC-21 –que, com assentos ejetores britânicos, podem ter a venda impedida por Londres, rival de Buenos Aires sobre o tema das ilhas Falkland (Malvinas).
Um avião 100% russo não traria tal problema, mas a questão financeira pesa. Já a Índia é uma cliente quase certa sempre: 23% do total de exportações militares russas de 2016 a 2020 foram para Nova Déli, segundo o Sipri (Instituto Internacional da Paz de Estocolmo).
Já a partir das poucas imagens disponíveis, analistas militares gastaram bytes para tentar entender o que o Checkmate traria. Ele traz elementos que garantem um certo grau de furtividade ao radar, notadamente a entrada de ar ventral reminiscente do X-32, avião que perdeu a competição para o F-35 nos EUA, e copia do Su-57 o uso de estabilizadores verticais móveis.
Com desenho angulado e o presumido uso de materiais absorventes de radar, o novo modelo deverá estar para o Su-57 como o monomotor F-35 está para o principal avião de quinta geração em uso no mundo, o bimotor F-22.
Antes de tudo, claro, o avião precisa existir, e é aí que as coisas se complicam.
Dados sobre investimento em programas militares são escassos na Rússia, e a imprensa estatal só informa que a compra dos Su-57 teve US$ 2,63 bilhões destinados até aqui. É pouco dinheiro para o negócio todo, considerando que um avião desses custa perto de US$ 100 milhões.
Para tentar uma largada direta na carreira de exportação, é sempre necessária alguma compra do governo do país produtor. É assim no mundo todo: os caças turboélice Super Tucano e o cargueiro KC-390 da Embraer só conseguiram clientes externos depois de ver encomendas da Força Aérea.
Carência existe: há cerca de 250 bimotores leves MiG-29 rumando à aposentadoria, dando lugar aos modelos pesados da família do Sukhoi Su-27, que poderiam ser substituídos pelo Checkmate.
A Rússia também levanta dúvidas sobre a capacidade de desenvolvimento. Seus principais aviões exportados são da linhagem soviética do Su-27, conhecido como Flanker na designação ocidental.
São aviões altamente modernizados, como o Su-35, que conquistou encomendas recentes no Egito e na Argélia, e está sendo considerado pela integrante da Otan (aliança militar ocidental) Turquia, banida do programa do F-35 por comprar sistemas antiaéreos russos.
Mas são modelos da chamada quarta geração, o que projeta uma vida útil mais curta –ainda que haja uma tendência mundial em esticar ao máximo a operação desses caças, dado que são mais baratos de operar e, ao fim, dão conta do recado.
Os próprios Estados Unidos trabalham desta forma, tendo reduzido sua encomenda original dos caríssimos F-22, os quais podem até ser aposentados. Neste ano, comprou oito versões modernizadas do venerando F-15, a EX, por US$ 1,1 bilhão.
Outra questão para os russos é a tecnologia. Objeto de sanções ocidentais, o país de Putin experimentou muitas dificuldades para desenvolver o Su-57, seu primeiro caça realmente novo depois do fim da União Soviética, em 1991.
O desenho dele, pensado desde os anos 1980, foi finalizado em 2004. O primeiro protótipo voou seis anos depois, mas problemas com sua aerodinâmica e a impossibilidade de finalizar um novo motor arrastaram o projeto.
A Índia, parceira inicial da empreitada, desistiu em 2018. Mas os russos acabaram por encomendar 76 unidades, a primeira das quais está operacional desde dezembro passado. Exportações, até aqui, foram apenas rumores –nesta terça o responsável pelas vendas militares russas, Alexander Mikeiev, disse que há cinco países interessados.
Analistas apontam, por outro lado, modelos no mercado que passaram anos sem empolgar clientes externos e acabaram bem aceitos, como o caso do francês Dassault Rafale.
A Rússia quer manter sua posição ainda privilegiada neste mercado, embora não tenha tido sucesso em locais como o Brasil. Os 231 caças entregues para clientes externos de 2016 a 2020 somaram 49% dos lucros militares de Moscou no período.
Do ano 2000 para cá, a Rússia foi a segunda maior vendedora de caças do mundo, com US$ 61,5 bilhões exportados. Os EUA lideram com US$ 99,6 bilhões e os franceses vêm abaixo, com US$ 14,7 bilhões. No ranking geral de vendas bélicas, a ordem é a mesma, com 37% do mercado americano, 20% russo e 8,2%, francês.
Ameaçam no futuro a posição russa projetos de chineses (FC-31), apesar da dificuldade de Pequim para vender seus produtos militares fora do circuito asiático que inclui Paquistão e Mianmar, turcos (TF-X) e sul-coreanos (KF-21).
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