CATARINA FERREIRA
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Um projeto de pesquisa liderado pela cientista brasileira Marina Hirota, da Universidade Federal de Santa Catarina, quer mapear e quantificar as interações entre a água que está na atmosfera, na superfície e armazenada no solo da amazônia. Os dados podem ajudar a entender como se dão eventos climáticos extremos.

 

Um dos objetivos da pesquisa é rastrear de onde vem e para onde vai a umidade que circula na amazônia, que influencia a saúde das bacias hidrográficas e o regime de chuvas de diferentes regiões do Brasil.

“É como se você pegasse uma gotinha em cima do Atlântico e visse onde ela vai chover, depois onde ela vai ser absorvida e transpirar [através da vegetação] e onde ela vai chegar em um rio”, afirma a pesquisadora.

Na atmosfera, a água que vem de diferentes bacias hidrográficas e do oceano forma nuvens em diversas regiões; Após a chuva, ela escorre, é absorvida pelo solo e vai abastecer os rios. Este sistema conta também com a contribuição da água subterrânea, em lençóis freáticos e aquíferos.

Calcular a quantidade de água em determinada região, conhecendo o caminho que percorre, ajuda a entender como funciona todo o ecossistema e como alterações na vegetação de uma região podem se tornar problemas em outro local, por vezes, resultando em eventos extremos. “O desmatamento que acontece num lugar vai ter um efeito na atmosfera de outro lugar, e, depois, na quantidade de chuva e no quanto essa chuva alimenta os rios.”

O estudo está em desenvolvimento e os resultados preliminares serão submetidos como artigos científicos, mas Hirota se mostra otimista nas descobertas feitas até o momento.

“Conseguimos entender que o papel da reciclagem da umidade é mais importante na amazônia entre os meses de julho e outubro”, afirma. Neste processo, a chuva que cai no solo é absorvida pelas raízes das árvores e volta à atmosfera pela transpiração da vegetação. No período citado por ela, o percentual de água que é reciclada na região é de 40%, acima da média anual, de 30%.

O dado é importante porque, com as correntes de vento, a água bombeada para o ar não necessariamente se tornará chuva na mesma região. “Então, se há desmatamento, queimadas ou qualquer coisa que cause mortalidade de árvores, você perde uma bomba que está tirando a umidade da superfície e levando para a atmosfera.”

“A gente vai conectar todas essas peças de quebra-cabeça para entender de onde está vindo a perturbação que fez com que, por exemplo, rios muito grandes e volumosos da Amazônia secassem.”

Nesta sexta (9), ela apresentou o desenvolvimento da pesquisa na conferência Amazonian Leapfrogging 3.0, evento organizado pelo Brazil Lab, da Universidade de Princeton, e pelo projeto Amazônia 2030, que financia a pesquisa de Hirota.

O ciclo de palestras realizado na universidade norte-americana contou com a presença de cientistas, líderes indígenas, representantes da sociedade civil e da política brasileira, como o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, para debater possíveis soluções para problemas como a seca e o desmatamento na Amazônia.

Os pesquisadores reuniram dados de satélites e informações colhidas em campo para compor um modelo capaz de rastrear o caminho da umidade. “É um modelo que consegue, em três dimensões, dizer pra gente para onde potencialmente essa umidade está indo. A partir de dados observacionais inseridos no modelo, a gente consegue rastrear como o ar se espalha para diferentes lados.”

Nesta etapa, o projeto conseguiu mapear e rastrear todo o movimento da água na atmosfera e também entre grandes bacias hidrográficas.

Os próximos passos, segundo a cientista, são aprimorar o mapeamento da água subterrânea e o rastreio da umidade nos rios também para, a partir disso, avaliar os impactos que as perturbações no sistema causam, como secas extremas e alterações no regime de chuvas. Essas informações são importantes para abordar problemas como o abastecimento de água para a agricultura dentro e fora da amazônia e impactos na segurança alimentar da população.