A pandemia da covid-19 fez com que os países terminassem 2020 com níveis de endividamento recorde e com muitas dúvidas sobre como esse problema poderá ser resolvido. Para a economista chefe do Banco Mundial, Carmen Reinhart, esse quadro pode desembocar em uma crise financeira global. “O cenário em que nos encontramos não é sustentável”, disse.
Ao longo deste ano, governos e bancos centrais despejaram montanhas de dinheiro em suas economias para tentar minimizar o impacto econômico da covid-19, e isso teve como consequência, na maior parte dos casos, o aumento das dívidas. E essa situação ocorre em um quadro em que as diferentes projeções para a atividade global de 2020 giram em torno de uma contração de 3%, o que automaticamente ajuda a elevar os índices de endividamento.
De acordo com o Debtclock, um site americano que registra o endividamento de alguns países, a relação dívida bruta pública em relação ao produto interno bruto (PIB) dos Estados Unidos estava em 100,79% – ultrapassando a casa dos 100%, o que não ocorria desde a 2.ª Guerra Mundial. Esse aumento é resultado direto dos gigantescos pacotes da ajuda aprovados como uma tentativa de minimizar o impacto da pandemia. Na década de 1960, essa dívida girava na casa dos 30% do PIB.
Além da maior economia do mundo, merecem destaque também a relação entre dívida bruta e PIB exibida pelo Japão (269,62%), Grécia (233,28%), Reino Unido (108,08%), França (116,35%), Itália (162,30%) e Canadá (109,72%) – ou seja, todos com endividamento maior que a produção doméstica. Entre os emergentes, os níveis são historicamente mais baixos por causa das condições internas da economia dos países, mas o patamar de Argentina (73,91%) e México (72,88%), por exemplo, também preocupa. No caso do Brasil, pela estimativa do governo federal, a dívida deve terminar o ano em 91% do PIB – no final do ano passado, estava em 74,3%.
Débitos
Um estudo do Fundo Monetário Internacional (FMI) apontou que 90% dos países avançados estão com nível de endividamento muito maior agora do que na última recessão global, a chamada crise financeira internacional, que começou em 2007 e perdurou até meados de 2009. “Está todo mundo quebrado agora, até mesmo o G-7. Ou melhor: especialmente, o G-7”, disse ao Estadão/broadcast o professor convidado em Relações Internacionais na London School of Economics (LSE) e ex-professor de estudos diplomáticos na Universidade de Oxford, Tristen Naylor.
Se a situação financeira está complicada para os países mais ricos, o cenário não é diferente para os de baixa renda. Nos últimos meses, em meio a muitas discordâncias entre EUA, União Europeia (UE) e China, o grupo das 20 economias mais ricas do mundo (G20), do qual o Brasil faz parte, decidiu suspender a cobrança do serviço das dívidas dessas nações. O programa, por enquanto, tem duração até junho deste ano. Há ainda chances de ser prorrogado.
Apenas à China, seria reembolsado este ano 60% de todo o valor. O grande debate dentro do G-20 é o de que o país asiático fez muitos empréstimos a países em desenvolvimento com condições que não são transparentes e com taxas de juros mais altas do que as que poderiam pagar. Segundo o FMI, os governos de mercados emergentes emitiram US$ 124 bilhões em dívidas em 2020, com dois terços dos empréstimos no segundo trimestre, auge da pandemia para muitos deles.
As crescentes pressões orçamentárias foram acompanhadas por uma nova onda de rebaixamentos da dívida soberana, o que amplia o risco para os credores. Tudo isso leva a crer que o assunto permanecerá em pauta constante ao longo de 2021. Uma das entidades que mais devem debater o tema é o G-20, que, curiosamente, passou a ser presidida em 1.º de dezembro pela Itália, país que já era alvo de críticas dos demais membros da UE por causa de descontrole fiscal mesmo antes da pandemia.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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