SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Em meio à febre por gatos que se espalha pela internet, um pequeno filme independente da Letônia foi adoptado com força por internautas e pela sátira internacional. Despido de tramas mirabolantes, “Flow” se firmou porquê um dos títulos mais quentes da temporada com sua simplicidade, ao escoltar um gatinho em traçado entusiasmado.

 

Não há muito o que falar sobre a história, exceto que ela dispensa diálogos ao longo de seus 90 minutos e que acompanha um gato preto um tanto blasé, que vê a floresta onde mora ser inundada por um súbito e minaz fluxo de chuva -daí o nome do filme.

Conforme o nível da chuva vai subindo, o gatinho secção em procura de abrigos, escoltado por outros animais que encontra. Há, por exemplo, um simpático labrador, que é separado dos outros cachorros de seu grupo, mais agressivos e “gatofóbicos” que ele.

Mais tarde, também embarcam no paquete que leva o gato para um lado e para o outro um lêmure curioso, uma capivara zelosa e um pássaro secretário, um dos símbolos da África do Sul, que evoca sabedoria e nobreza, um pouco que se reflete na forma imponente com a qual foi desenhado.

“Eu dispensei a lógica ao fazer esse filme, pouco importou se esses animais eram de diferentes regiões ou biomas. Eu me preocupei em animar esses personagens de forma realista, sim, mas quis me distanciar de um documentário sobre a natureza, portanto exagerei nas cores, deixei as texturas imperfeitas”, diz o diretor Gints Zilbalodis.

Para que os movimentos dos animais fossem convincentes, o letão observou com afinco os seus gatos e cachorros de estimação. Sempre que tinham dúvidas sobre alguma situação específica, ele e seus animadores recorriam ao enorme ror de vídeos de gatos em redes sociais, porquê o TikTok.

Esse paixão por gatos, Zilbalodis acredita, se deve ao vestuário de eles serem animais com os quais nos identificamos. “Eles são honestos, conseguem ser calmos, mal-humorados, engraçados, expressivos, tudo de forma muito humana. São fofos, mas também podem ser babacas.”

Em seu segundo longa-metragem, o diretor já vinha explorando em seus curtas temas comuns a “Flow”, porquê a luta por sobrevivência, a premência de se ajustar ao ignoto e o conflito entre diferentes personalidades -ou, no caso, espécies. O filme, aliás, é uma expansão de um de seus curtas, “Acqua”, de 13 anos detrás.

Com um orçamento de tapume de US$ 3,7 milhões e produzido num software gratuito, “Flow” superou “Moana 2”, produzido pela Disney por US$ 150 milhões, e “Kung Fu Panda 4”, feito pela Dreamworks por US$ 85 milhões, ao invadir uma vaga na corrida pelo Oscar de melhor animação.

Ao longo dos últimos meses, foi encantando espectadores, venceu o Mundo de Ouro da categoria e se firmou predilecto ao lado de “O Robô Selvagem”, também da Dreamworks. A corrida pelo Oscar fica completa com “Divertida Mente 2”, da Pixar, “Wallace & Gromit: Avengança”, da Aardman Animations, e “Memórias de um Caracol”, outro independente.

A situação é sintomática do momento atual do cinema de animação. Hoje, muitos dos filmes e séries com traços mais experimentais e interessantes estão sendo produzidos longe dos grandes estúdios americanos.

Enquanto a Disney, fundadora da animação enquanto gênero cinematográfico, segue gerando imagens nos mesmos programas de computação, produtoras menores vêm experimentando com novas técnicas e até retomando processos antigos, mais artesanais. É o caso do brasílio Alê Abreu, indicado ao mesmo Oscar em 2016 por “O Menino e o Mundo”.

“É muito permitido ver animações independentes sendo reconhecidas. Nós não temos os mesmos recursos ou o mesmo orçamento de marketing, portanto simplesmente ter o seu filme visto por tanta gente já significa muito”, diz Zilbalodis.

“Por outro lado, justamente por não trabalharmos com um orçamento tão grande, temos mais liberdade para testar e decorrer riscos. Há muita coisa boa nos estúdios grandes, mas o cinema independente consegue descrever histórias mais pessoais, recorrer a técnicas menos comerciais.”

“Flow” ainda alcançou outro feito dificílimo para uma animação, ao figurar na corrida pelo Oscar de filme internacional. Nesta, será difícil triunfar, diante do peso das campanhas do francesismo “Emilia Pérez” e do brasílio “Ainda Estou Cá”.

Um pequeno gatinho chegar tão longe, porém, já é motivo de comemoração na Letônia. Fernanda Torres e Walter Salles criaram clima de Despensa do Mundo no Brasil, e o mesmo pode ser dito do que vem acontecendo no país do leste europeu, que está representado no Oscar pela primeira vez.

Uma estátua do protagonista, muito porquê pinturas suas, têm decorado a capital, Riga. O Mundo de Ouro que “Flow” venceu foi exposto no Museu Pátrio de Arte, gerando filas. O sucesso de público sítio ainda motivou o governo a anunciar grandes investimentos no audiovisual do país. Tudo graças a um gatinho.

FLOW

– Quando Estreia nesta quinta (21), nos cinemas
– Classificação Livre
– Produção Letônia, Bélgica, França, 2024
– Direção Gints Zilbalodis