SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Negociadores americanos e iranianos irão se encontrar neste sábado (12) em Omã para tentar reavivar as negociações visando evitar que Teerã desenvolva a bomba atômica. A chancelaria de Teerã disse nesta sexta (11) que quer dar uma “chance genuína” ao diálogo.

 

É a primeira tentativa de retomar o diálogo de fato desde que Donald Trump abandonou, em seu primeiro mandato, o acordo fechado em 2015 que trocava o fim de sanções ocidentais ao Irã pelo abandono dos objetivos militares de seu avançado programa nuclear.

Agora, o pessimismo impera a tentativa de Trump de chegar a um acordo, não menos porque o americano colocou suas forças de ataque em prontidão para ir às vias de fato contra os iranianos caso as conversas não avancem.

“Nós pretendemos avaliar as intenções e a resolução do outro lado neste sábado. Seriamente e com vigilância sincera, vamos dar à diplomacia uma chance genuína”, escreveu no X o porta-voz diplomático iraniano Esmaeil Baghaei. As conversas serão entre o negociador de Trump Steve Witkoff e o chanceler do Irã, Abbas Araqchi. O chanceler do Omã, Badr al-Busaidi, será o intermediário.

A seguir, um resumo de como a crise chegou ao ponto agudo em que está.

DESCONFIANÇA VEM DE LONGE

A relação de desconfiança entre Irã e EUA remonta a 1953, quando Washington e Londres patrocinaram a derrubada do governo que havia nacionalizado uma empresa petrolífera britânica. O golpe colocou no poder o xá Reza Pahlevi, altamente impopular.

Em 1979, religiosos fundamentalistas liderados pelo então exilado aiatolá Ruhollah Khomeini tomaram o poder e o xá foge parra os EUA, fundando a República Islâmica. A crise dos reféns na embaixada americana em Teerã, prego no caixão do governo de Jimmy Carter, acabou de vez com as relações diplomáticas entre os ex-aliados.

CONFLITOS PAUTAM A AGENDA

De 1980 a 1988, o Irã travou uma sangrenta guerra com o Iraque, cujo ditador Saddam Hussein recebia apoio dos EUA que depois o matariam. A política de expansão iraniana por meio de prepostos como o Hezbollah libanês floresceu, com choques como o atentado que matou 241 fuzileiros americanos em Beirute em 1984. Quatro anos depois, os EUA matam 290 iranianos ao derrubar por engano um jato comercial no golfo Pérsico.

COMEÇA A TENSÃO NUCLEAR

Após a primeira Guerra do Golfo (1991), os EUA buscam conter a proliferação de armas de destruição em massa na região. Isso leva a um embargo total à venda de petróleo e gás pelos iranianos. Teerã tinha um programa nuclear assistido pela ONU desde os anos 1950, mas nos anos 1980 a suspeita de que ele servia para disfarçar a busca pela bomba cresceu. Agora, viraria tema constante na agenda internacional.

APROXIMAÇÃO E O EIXO DO MAL

Após dois períodos breves de tentativa de negociação, no fim do governo Bill Clinton em 2000 e quando Washington e o Irã tinham um inimigo comum no Talibã afegão, George W. Bush colocou o país persa ao lado de Coreia do Norte e Iraque no chamado “eixo do mal”, em 2002. Quatro anos depois, o presidente Mahmoud Ahmadinejad acelera a produção de urânio enriquecido, enquanto faz uma abertura a Bush numa carta inédita. Não dá certo, e o iraniano denuncia Israel e a direita americana pelo fracasso.

O CAMINHO DO ACORDO

Em 2013, Barack Obama inicia a negociação com o moderado Hassan Rouhani, chamando à mesa seus aliados europeus, a Rússia e a China. O resultado veio dois anos depois, com o JCPA (sigla inglesa para Plano de Ação Global Conjunto), em que Teerã submeteu seu programa a um regime de inspeção e renunciou à busca pela bomba na prática, em troca do fim de sanções ocidentais e a liberação de US$ 100 bilhões congelados.

TRUMP ZERA O JOGO

Presidente, Trump fez os EUA saírem do JCPA em 2018, alegando que os iranianos apenas ganhavam tempo rumo à bomba. Passou à fase de coerção militar, pressionando Teerã a negociar sob a ameaça de ataques às instalações do programa. Trump manda matar o principal general do país, e depois uma operação israelense assassinou um cientista central para o programa nuclear.

O IRÃ ACELERA NOVAMENTE

Pressionada, a teocracia acelera a produção de material físsil, que é enriquecido em ultracentrífugas. A agência da ONU diz que as “linhas vermelhas” estão rompidas e que a bomba está à mão do Irã em questão de meses. A última estimativa fala em matéria-prima para de quatro a seis bombas rudimentares. O país assina um pacto estratégico e militar com a Rússia neste ano, que muitos temem embutir cláusulas secretas para ajudar na montagem de uma ogiva em mísseis balísticos.

MAS A TEOCRACIA ESTÁ ENFRAQUECIDA

Isso tudo ocorre em momento de fraqueza do regime. Primeiro, problemas econômicos e sociais levaram a protestos inéditos em 2022. Depois, a guerra disparada pelo aliado Hamas contra Israel levou à destruição de boa parte da defesa primária de Teerã, na forma de grupos como o terrorista palestino ou o Hezbollah libanês. Irã e Israel trocam fogo inédito à distância, com o Estado judeu sinalizando que pode atacar as instalações nucleares. Os aliados iranianos no Iêmen se envolvem na guerra e são objeto de pressão. Para piorar, o presidente radical Ebrahim Raisi morreu em 2024 em um estranho acidente de helicóptero.

TRUMP VOLTA À CARGA

Depois de ordenar ataques mais intensos aos houthis do Iêmen, Trump envia carta ao líder supremo do Irã, Ali Khamenei, dando um prazo até 1 de maio para aceitar negociar. Enquanto isso, concentra uma força de ataque aéreo com bombardeiros furtivos ao radar na base de Diego Garcia e dois grupos de porta-aviões no Oriente Médio, dizendo que irá à guerra se Teerã não conversar. Após negar agir sob pressão, o Irã aceitou conversas indiretas por meio de mediadores no Omã, que começam no sábado (10).

PESSIMISMO DOMINA O AMBIENTE

O problema das negociações é que o governo Trump já deixou claro que quer uma “saída Gaddafi” para a crise, aludindo ao fim do programa nuclear líbio pelo ditador em 2003, em troca do fim de sanções. Muammar Gaddafi acabou morto na sarjeta em 2011, lembram os iranianos. A Rússia tentou agir como mediadora, sem muito sucesso, e a Casa Branca renovou sanções contra o país persa. Além disso, Trump é conhecido por ofertas heterodoxas, usualmente reversíveis, o que deixa o cenário incerto.