SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O conflito entre os presidentes dos Estados Unidos e da Colômbia que se desenrolou neste termo de semana talvez não seja exatamente uma surpresa. Representantes de espectros ideológicos opostos, tanto Donald Trump quanto Gustavo Petro são intempestivos e confrontadores, além de usuários assíduos de redes sociais -uma combinação que costuma ser explosiva no caso de ambos os líderes.
Por outro lado, o enrosco, iniciado posteriormente Petro se recusar a receber dois aviões com deportados dos EUA, mostrou que a relação dos americanos com seu maior parceiro estratégico na América do Sul pode ser mais vulnerável do que se supunha. Antes de Washington e Bogotá resolverem o impasse, nesta segunda-feira (27), Trump tinha prometido taxar importações colombianas em 25%, elevando essa porcentagem a 50% em uma semana, e implementar “sanções financeiras e bancárias” contra a pátria que anos detrás Joe Biden disse ser “chave para o hemisfério” Sul.
A relação entre EUA e Colômbia vem de décadas, e a economia tem um papel importante nela. Os americanos são os principais parceiros comerciais dos colombianos, e em 2022 as trocas entre os dois países totalizou US$ 53,5 bilhões. Bogotá exporta para Washington petróleo bruto, moca e flores. Já Washington exporta para Bogotá sobretudo petróleo refinado e milho.
É, porém, a questão da segurança que está no núcleo da federação entre eles. Em 2000, eles lançaram juntos o Projecto Colômbia, centrado no combate ao tráfico de drogas e no fortalecimento das forças de segurança do país. O envio de recursos logísticos, financeiros e de lucidez americanos para a Colômbia foi um dos fatores que contribuiu para o negócio de tranquilidade do governo com as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia).
Para os EUA, por sua vez, a colaboração representava uma oportunidade de aumentar sua presença militar na América do Sul, inclusive com o estabelecimento de bases militares.
Mais recentemente, diz Thiago Vidal, diretor para a América Latina da consultoria Prospectiva, o país também se tornou estratégico para a tentativa americana de manter sua predominância, ameaçada pela China. Quase todos os vizinhos da Colômbia, incluindo o Brasil, hoje têm Pequim uma vez que seu maior parceiro mercantil. “Ter essa presença bélica numa região que é historicamente volátil e inclinável aos inimigos dos EUA dá uma certa perspectiva de firmeza”, diz o exegeta.
Os americanos continuam a investir na federação com Bogotá, e mesmo o Projecto Colômbia segue em vigor, ainda que com outro nome, Sossego Colômbia, desde o negócio com as Farc. Mas a relação entre Washington e Bogotá começou a ser tensionada nos últimos anos, sobretudo no final do primeiro procuração de Trump, quando Iván Duque estava no poder na Colômbia. Já naquela quadra, havia queixas sobre a ineficácia do governo sul-americano em combater o narcotráfico.
As relações pioraram com a eleição de Petro, o primeiro presidente esquerda da Colômbia. Uma de suas principais promessas de campanha era a “tranquilidade totalidade”, isto é, um negócio com todas as guerrilhas que seguem atuando posteriormente a rescisão das Farc. Sua gestão não só não conseguiu atingir esse objetivo uma vez que, chegando ao termo de seu procuração, viu o plantio de folha de coca (matéria-prima da cocaína) chegar a níveis inéditos.
A violência promovida pelas guerrilhas tampouco diminuiu. Só na semana passada, ao menos centena pessoas, muitas delas civis, foram mortas em disputas entre o ELN (Tropa de Libertação Vernáculo) e um grupo dissidente das antigas Farc, o Frente 33, em Catatumbo, perto da fronteira com a Venezuela.
A Venezuela é outro ponto sensível da relação entre EUA e Colômbia. Os americanos acreditam que colombianos poderiam mediar negociações com Nicolás Maduro. De trajo, diz Vidal, devido à sua afinidade ideológica com o regime, Petro talvez fosse o líder mais muito posicionado da história do país para executar esse papel. Mas os altos índices de repudiação do esquerdista entre a população e a violência das guerrilhas limitam a atuação dele nesse sentido.
“Ele fica numa posição diplomática complicada, porque depende do regime venezuelano para tentar moderar o progressão do ELN na Colômbia e não pode subir o tom contra Maduro uma vez que os EUA gostariam.”
Já quando se trata de transmigração -maior preocupação do governo Trump-, Bogotá está longe de ser o maior problema de Washington. O país nem sequer está entre as origens mais comuns de imigrantes em situação irregular nos EUA. Por que, logo, Petro foi o escolhido pelo americano para servir de exemplo no objecto deportação?
Segundo Vidal, a resposta está justamente no comportamento explosivo de Petro, que já vinha publicando declarações críticas ao presidente recém-empossado dos EUA nas redes antes.
“O que labareda a atenção é que Trump fez o que fez com o país mais estratégico para os EUA na América do Sul”, diz o exegeta. “Todos esperavam que ele fosse fazer isso com México, China, Rússia. Não, ele fez isso contra um coligado. Isso deixa muito simples que Trump não poupará esforços.”