Filho de pai marceneiro e mãe costureira, Maicon Chagas teve uma infância humilde em Poções (BA). Ele conta que sempre estudou e trabalhou motivado pelo pai, que queria para ele uma boa educação. Em 2004, ele começou a experimentar cortar o cabelo dos amigos. E o mundo da beleza chamou sua atenção.
Hoje, aos 35 anos, Maicon comanda seu próprio salão. “Muita gente falava que não ia dar certo, mas hoje eu sou uma referência. Comecei por baixo, só com uma maquininha de cortar cabelo, e consegui tudo com muito esforço.” Mas Maicon também dedica seu tempo a uma outra paixão.
Desde criança, o segundo amor da vida de Maicon sempre foi o esporte: aos 12 anos, ele começou na capoeira e evoluiu no esporte até se tornar monitor, dez anos depois, em um projeto do governo federal voltado para crianças carentes de Poções. Quando o projeto acabou, no entanto, ele não quis deixar as crianças que participavam da atividade desassistidas: foi aí que surgiu a semente do Centro Cultural e Desportivo Educando pela Arte, projeto social criado por Maicon que, atualmente, atende entre cinquenta e setenta crianças e adolescentes, de 7 a 17 anos.
No primeiro evento: 200 crianças
O projeto, que se iniciou em 2008, de forma esporádica e apenas com aulas de capoeira, se expandiu em 2017, quando Maicon teve uma ideia. Recém-apaixonado pelo atletismo, depois de ter começado a correr no ano anterior, e movido pela vontade de consolidar o trabalho com crianças da periferia, ele organizou a primeira Corrida da Criança no dia 12 de outubro daquele ano.
“Notei que, onde não tem atividade cultural e esportiva, a criminalidade vira espetáculo. Então, quis fazer um evento pra atrair a molecada. Pedi ajuda do comércio local, da prefeitura. Pensei que teria pouca gente e, para minha surpresa, vieram 200 crianças. E muitas delas quiseram seguir em frente com a corrida”, conta ele.
Assim, Maicon expandiu o projeto, com atletismo e capoeira para as crianças todas as noites, além de eventos nos fins de semana e a tradicional corrida no Dia das Crianças. Sem recursos, o projeto seguiu recebendo doações, além de investimento do próprio Maicon. Mas nem sempre foi o suficiente.
“Os meninos corriam com o pé no chão mesmo porque a gente não tinha dinheiro para pagar tênis pra todo mundo. Ainda assim, quando eles corriam, eu via nos olhos deles a vontade de querer vencer na vida. E percebia o esporte como uma ferramenta mágica.”
Viral rendeu tênis para todos
Em 2020, por conta da pandemia, as atividades foram interrompidas, mas Maicon retomou a corrida anual no ano seguinte. Foi quando teve a ideia de mostrar o trabalho desenvolvido por ele com as crianças nas redes sociais. O vídeo de uma de suas alunas, a pequena Bieli, de 10 anos, correndo descalça, viralizou e sensibilizou o público, atraindo doações de tênis até de nomes conhecidos no esporte, como o atleta Wellington Cipó.
Depois de uma semana, todos os alunos tinham tênis. Além disso, o projeto ganhou espaço próprio e despertou o interesse de uma assessoria esportiva de São Paulo, que ofereceu capacitação para Maicon seguir com o trabalho. Enquanto isso, a correria para conseguir mais doações continua. E ele já se prepara para a Corrida da Criança deste ano.
Para o cabeleireiro, esse é só o começo do sonho que ele busca alcançar. “Queria levar essa ideia para mais lugares. Em cidades vizinhas, as crianças nem sabem o que é atletismo. Com mais apoio, a gente poderia espalhar o projeto e contemplar mais jovens”, diz. “Descobri que o segredo da vida está aí, em doar um pouco do seu tempo aos outros. Se todo mundo fizesse isso, o mundo seria um lugar melhor.”
Texto: Gabriel Oliveira
Foto: Pedro Magalhães
Conteúdo publicado originalmente na TODOS #44, em julho de 2022.
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