(FOLHAPRESS) – Um estudo feito com mais de 200 mil britânicos associou a multimorbidade a um aumento no risco de demência. Os achados de médicos do Reino Unido e da Alemanha foram publicados esta semana na publicação científica JAMA Open Network (The Journal of the American Medical Association).
Em linhas gerais, multimorbidade é quando o mesmo indivíduo possui múltiplas doenças crônicas. A depender do conceito, pode ser considerada a partir de duas ou mais enfermidades.
“É aquele paciente que você conhece que tenha, por exemplo, diabetes, hipertensão, asma”, diz o neurologista Diogo Haddad, do Hospital Alemão Oswaldo Cruz.
Os pesquisadores reuniram mulheres e homens sem demência e com idade mínima de 60 anos para acompanhar ao longo de até 15 anos – a média foi de 11,8 anos. Foram utilizadas informações do UK Biobank, banco de dados ligado ao sistema público de saúde britânico, coletados entre 2006 e 2010.
No período, 6.182 participantes desenvolveram demência. A taxa de incidência foi de 1,87 por 1.000 pessoas sem multimorbidade e 3,41 para quem apresentou múltiplas doenças.
Os pacientes com mais de um problema de saúde eram em sua maioria mulheres mais velhas de etnia não branca com menor qualificação educacional e moradoras de áreas mais pobres do Reino Unido.
“O estudo prova de uma forma coesa cientificamente que é a ideia de que pacientes que têm várias doenças têm mais risco de desenvolver demência, principalmente Alzheimer, ao longo da vida”, analisa Haddad.
“Com base nisso, posso dizer que se você cuidar bem da pressão alta e do diabetes ou mesmo se prevenir essas doenças, você estará prevenindo de maneira direta o processo demencial”, afirma.
A pesquisa ainda apontou que os pacientes sem fator de risco genético, mas com comorbidades, possuem um risco maior de desenvolver demência do que aqueles que não possuem múltiplas doenças crônicas.
“Muitas vezes as pessoas têm a ideia de que as demências e sobretudo o Alzheimer têm uma relação única e exclusivamente genética. Na realidade, não é. A doença é multifatorial”, esclarece o médico.
Outros fatores de risco Para a professora de geriatria Claudia Kimie Suemoto, da FMUSP (Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo), o artigo se destaca ao mostrar o agrupamento mais comum de doenças que aumentam os riscos.
Em mulheres é a associação de hipertensão, diabetes e doença coronariana e, no caso da dor, osteoporose e dispepsia. Já nos homens a combinação de diabetes e hipertensão, além da associação de doença cardíaca coronária, hipertensão e de AVC (acidente vascular cerebral) são os fatores de maior risco.
Maria Gabriela dos Santos Ghilardi, neurologista do HCor e doutora em neurologia pelo departamento de neurologia da FMUSP, lembra que o número de comorbidades está associado ao risco: quanto mais doenças crônicas, maior a chance de desenvolver demência.
Segundo a médica, tais doenças estão sempre interligadas e é preciso ter um diagnóstico para conseguir realizar o tratamento e, assim, prevenir outros problemas decorrentes delas.
Prevenção A neurologista Maria Gabriela dos Santos Ghilardi ressalta a indicação de prevenção como grande conclusão do estudo. Para a médica, ele tem “um impacto maior na prevenção porque através dela a gente consegue aperfeiçoar a identificação dos indivíduos que tenham um risco maior de desenvolver demência e, dessa maneira, atuar de uma forma mais efetiva prevenindo a doença”.
Em termos de políticas para saúde pública, o estudo aponta para o tratamento de doenças como diabetes e hipertensão como uma das formas de prevenção da demência.
“Para o Alzheimer, é muito mais importante ter uma saúde pública primária de qualidade do que pensar em como trazer mecanismos de teste genético”, ressalta o neurologista Diogo Haddad.
“Existem fatores na doença: os modificáveis e não modificáveis. Envelhecer, por exemplo, não é modificável. Por outro lado, hipertensão, diabetes, cigarro, álcool são fatores possíveis de controlar, modificar e tratar”.
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