Após os investimentos terem caído ao menor nível da história, o ministro dos Transportes, Renan Filho, assumiu o cargo com R$ 20 bilhões para gastar em infraestrutura de transporte – mais de três vezes a verba dos últimos anos.
Na primeira entrevista como ministro, o filho do senador do MDB Renan Calheiros, um dos primeiros do partido a declarar apoio ao presidente Lula nas eleições, antecipou que vai anunciar no próximo dia 16 um plano de ação para os 100 dias, que envolve retomar todas as obras paralisadas, reparar as rodovias para o escoamento da safra, preparar as vias para o período de chuvas e fortalecer a resposta para emergências. Ex-governador de Alagoas, ele defende um novo arcabouço fiscal que permita aumentar os investimentos prioritários.
O ministro recebeu o Estadão/Broadcast na sede do órgão que antes era ocupado pelo hoje governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, quando estava à frente do Ministério da Infraestrutura. “O Tarcísio conversava com os caminhoneiros, mas a parte dele mesmo, que era ajeitar as estradas, ele entregou pior do que recebeu.” Leia a seguir trechos da entrevista.
Quais são os principais desafios que o sr. vai ter?
O grande desafio é fazer uma discussão mais ampla para garantir sustentabilidade fiscal de médio e longo prazo, sinalizar que o Brasil é responsável com o seu nível de endividamento. Mas, ao mesmo tempo, garantir o funcionamento das políticas públicas e preservar os investimentos. Se não, vai obrigar um caminhoneiro a enfrentar uma estrada esburacada ou não ter uma ferrovia. É um grande desafio assumir esta pasta, principalmente neste momento em que o Brasil vive, porque o teto de gastos (regra que atrela o crescimento das despesas à inflação), impôs o mais baixo nível de investimento público da história recente. Foi um erro, propiciado pela dificuldade de o Paulo Guedes (ex-ministro da Economia do governo Bolsonaro) dialogar.
O seu ministério terá quanto em 2023 para investir?
O orçamento aprovado depois da PEC da Transição é de cerca de R$ 20 bilhões. Nos últimos anos recentes, não passaram de R$ 6 bilhões. Quando o DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura) foi criado, há 20 anos, tinha orçamento de perto de R$ 6 bilhões. Chegou a ter R$ 25 bilhões no auge da capacidade entre o governo Lula e o início do governo Dilma. Do governo Temer para cá, depois da imposição do teto, oscilou entre R$ 5 bilhões e R$ 6 bilhões, o que é exatamente o mesmo orçamento em termos nominais da época da criação do DNIT, que executa 90% do orçamento do ministério.
O sr. começa sua gestão com pé direito: orçamento mais de três vezes maior. O que fará com os recursos?
Vou apresentar um plano de 100 dias para o País. Nesse plano, vamos enfrentar principalmente cinco aspectos. Vamos retomar obras paralisadas; vamos garantir a revitalização da malha rodoviária que está no seu pior estado de conservação no período recente; preparar o País para o escoamento já que janeiro, fevereiro e março são os principais meses de escoamento da produção de grãos do País; preparar também o País para o período de chuvas, que tem trazido muitos problemas porque temos tido chuvas acima da média nos últimos anos; e fortalecer a pronta resposta para emergências, como incêndios e calamidades. Temos o recurso necessário para colocar o orçamento em pé. Vou apresentá-lo ao presidente e, se ele concordar, vamos anunciar no próximo dia 16. A reunião (ministerial) desta sexta-feira vai balizar a nossa atuação.
Quantas obras estão paralisadas na sua área?
São muitas. Elas estão paralisadas por extrema falta de recursos públicos. O ministério tem 96% das rodovias com contratos estabelecidos para a sua devida manutenção, mas a maior parte delas está com a manutenção paralisada por falta de recursos. O dinheiro chegou no último dia de 2022 e está em restos a pagar (despesas que foram autorizadas, mas não foram pagas e são transferidas para o ano seguinte) e será aplicado a partir dos 100 dias. A PEC abriu orçamento novo não só para 2023, mas também no governo anterior. Dos R$ 23 bilhões que a PEC abriu (em 2022), o DNIT tem R$ 2,5 bilhões. Nesses 100 dias, também teremos condições de executar esse orçamento.
O governo pretende expandir a malha?
Vamos expandir. O nosso desafio são os próximos anos. Vou discutir com o ministério da Economia alternativas para garantir investimentos nos próximos anos – e organizando isso no novo arcabouço fiscal que Haddad (ministro da Fazenda) vai apresentar. A gente pretende tocar todas as obras que estão paralisadas. Mas o que eu posso garantir é que os recursos garantem condições para a gente retomar todas as obras paralisadas de construção. Retomar significa que teremos o fluxo de caixa necessário para retomar todas as obras de construção nos primeiros 100 dias. Esse é o desafio que vamos enfrentar.
O sr. vai rever o novo marco legal de ferrovias?
Ele carece de algumas regulamentações. Nós vamos “revisitá-lo” para organizar a sua devida aplicação. Ele já trouxe grandes benefícios com as autorizações, mas precisamos vê-las saírem do papel. Avançar em concessões é uma agenda prioritária.
Qual vai ser o papel da iniciativa privada?
No cenário de restrição de recursos, a iniciativa privada entra como parceira, muitas vezes com mais agilidade e com interesse em determinado projeto para que ele seja concluído rápido.
Em Alagoas, como o senhor conseguiu recursos para investimentos?
Fazendo o dever de casa: gastando menos em custeio, arrecadando mais e ampliando a capacidade de investimento do Estado. Alagoas hoje é o Estados que mais tem capacidade de investimento com seus próprios recursos.
Qual a influência do seu pai?
Ele ajuda toda hora. O presidente o consultou para a formação do ministério. Lula tem uma relação boa comigo e acha, por conhecer o que fiz, pelos resultados que apresentei em Alagoas, que eu era uma pessoa que podia trazer uma boa capacidade de gestão para o País.
O sr. vai ter de enfrentar reclamações dos caminhoneiros em relação aos preços dos combustíveis.
A questão de caminhoneiros é multidisciplinar porque questões tributárias se relacionam com a Fazenda, crise mesmo quem toma conta é a Casa Civil e o Ministério dos Transportes tem ANTT, que regula a atividade, e o ministério cuida das estradas. Então, o Tarcísio (Freitas, ex-ministro de Infraestrutura do governo Bolsonaro e hoje governador de São Paulo) conversava com os caminhoneiros, mas a parte dele mesmo, que era ajeitar as estradas, ele entregou pior do que recebeu.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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