PATRÍCIA CAMPOS MELLO
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Juízes da Suprema Corte dos Estados Unidos se mostraram céticos em relação a duas leis que restringem a possibilidade das redes sociais de moderar conteúdo, mas criticaram o excesso de poder dessas empresas sobre o debate público.
Nesta segunda-feira (26), no início do julgamento que pode determinar o futuro das redes sociais, os nove juízes da corte -seis conservadores e três progressistas- ouviram as sustentações orais dos representantes do estado do Texas e da Flórida, que defenderam as leis, e da NetChoice, entidade que representa empresas como Google, Facebook, X (antigo Twitter) e Tik Tok.
As ações da NetChoice contestam as leis aprovadas em 2021 por legislaturas estaduais republicanas para combater uma suposta censura das big techs aos conservadores. A lei da Flórida proíbe as redes sociais de banirem candidatos a cargos políticos e de “esconderem” suas publicações. A legislação do Texas veda as empresas de discriminarem usuários por seus “pontos de vista”.
Em jogo está a capacidade das redes sociais de moderarem conteúdo -ou seja, removerem ou reduzirem a visibilidade de publicações e banirem usuários que violam as regras de uso de cada empresa.
As leis estão bloqueadas em instâncias inferiores. Os juízes da Suprema Corte não pareceram propensos a deixar que as legislações entrassem em vigor. A tendência, segundo observadores, é que os magistrados devolvam os casos a tribunais inferiores. A decisão pode sair até junho.
As big techs argumentam que as leis ferem a liberdade de expressão das empresas de decidir o que pode, ou não, ser disseminado nas plataformas. Elas defendem que devem ser reguladas como jornais, que não podem ter sua liberdade editorial restrita. Os estados afirmam que as plataformas são empresas de utilidade pública semelhante a ferrovias e companhias de telefonia e portanto não podem discriminar usuários.
Durante quase quatro horas de sustentações orais, os juízes manifestaram preocupações a respeito da possibilidade de as leis restringirem a capacidade das plataformas de moderar conteúdo tóxico e exercer decisões editoriais.
O presidente da corte, o conservador John Roberts, indagou Henry Whitaker, procurador-geral da Flórida, sobre o risco de, com a lei, “o estado passar a regulamentar o que chamamos de praça pública moderna”. Whitaker argumentou que os direitos garantidos pela Primeira Emenda, que protege a liberdade de expressão, não seriam violados porque a legislação aplica-se à conduta, não ao discurso ou expressão.
Uma questão nevrálgica para a corte, segundo Roberts, é determinar se o governo ou as plataformas de internet têm o poder de decidir quais vozes são ouvidas. Roberts disse que a Primeira Emenda proíbe o governo -e não entidades privadas- de censurar o discurso.
O juiz Samuel Alito pediu à NetChoice para definir o termo “moderação de conteúdo”, perguntando se não era “um eufemismo para censura”. “Se o governo estiver fazendo [moderação de conteúdo], então ela pode ser um eufemismo para censura”, disse Paul Clement, advogado da NetChoice. “Se uma entidade privada estiver fazendo isso, a moderação de conteúdo é um eufemismo para a discricionariedade editorial.”
As plataformas afirmaram que sem essa discricionariedade, as redes serão inundadas por spam, discurso de ódio e extremismo.
Críticos, no entanto, argumentam que invalidar essas leis poderia impossibilitar regulamentações para, por exemplo, garantir a segurança das crianças online.
Alguns ponderaram que a tese do Texas e da Flórida, da não-discriminação, poderia se aplicar a outros serviços como Gmail e Uber. A ideia é preservar a capacidade de plataformas como Facebook e YouTube de remover conteúdo nocivo de usuários, sem dar às empresas carta-branca para censurar comunicações pessoais. O governo Biden se posicionou contra a lei. Mas sua representante, a procuradora-geral dos EUA Elizabeth Prelogar, sugeriu que havia uma distinção legítima entre redes sociais focadas em discurso e expressão, e outros serviços.
A legislação da Flórida, sancionada em maio de 2021, foi uma resposta direta à suspensão do ex-presidente Donald Trump do então Twitter e do Facebook. Trump foi banido das redes por veicular conteúdo de incitação à violência que teria colaborado para os ataques ao Capitólio em 6 de janeiro de 2021, em que seus apoiadores tentaram reverter o resultado da eleição presidencial de 2020, que deu vitória ao presidente Joe Biden. A conta de Trump foi posteriormente restabelecida por Elon Musk, depois que ele comprou a empresa e mudou o nome para X.
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