SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A Superliga de vôlei chegou ao final do primeiro turno com dezenas de atletas infectados pelo coronavírus, confrontos adiados e o protocolo estabelecido para mitigar o contágio da doença sob desconfiança de jogadores, técnicos e infectologistas.
A Confederação Brasileira de Voleibol (CBV) não pretende rever o regulamento da competição e mantém a exigência que os atletas façam exames a cada 15 dias, mas afirma que qualquer time poderá fazer avaliações em um período menor de tempo, se assim quiser.
Renato D’Avila, superintendente da CBV, diz que antes do início da temporada a entidade propôs testagem semanal. A maioria dos clubes não concordou e o Sesc RJ/Flamengo chegou a sugerir a cada 10 dias.
“O grande problema que enfrentamos é o custo. Como em todas as decisões que envolvem a Superliga, venceu democraticamente a proposta de fazer os testes a cada duas semanas”, afirmou D’Avila em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo por email, na última quarta-feira (23).
A Superliga masculina teve início no dia 31 de outubro, e a feminina, em 9 de novembro. Desde então, 83 atletas a doença (55 mulheres e 28 homens) e 30 partidas precisaram ser adiadas -20 delas pela competição feminina- , segundo levantamento da CBV.
Os infectados precisam cumprir quarentena por dez dias. Com o calendário mais curto em razão da pandemia, os times fazem até cinco partidas entre um teste e outro. Para o segundo turno, a partir de janeiro, não estão previstas mudanças.
“A questão é financeira. Se houver a vontade da maioria para mudar esse protocolo previamente aprovado, mudaremos”, diz o superintendente da CBV.
O exame para cada atleta custa ao clube R$ 75. O serviço é tabelado e oferecido por um laboratório parceiro da CBV. O regulamento do torneio determina que o jogo será adiado se dois levantadores ou quatro atletas em geral receberem o diagnóstico positivo para Covid-19.
Entre os que contraíram o vírus, o técnico Rubinho, 51, do Sesi-Bauru, chegou a ficar oito dias em uma UTI (Unidade de Terapia Intensiva) e precisou de aparelhos de ventilação mecânica para poder respirar. Ele teve alta médica no dia 10 deste mês, tem ido à quadra, mas fica na arquibancada enquanto tenta recuperar o vigor físico para voltar a comandar as atletas do time paulista.
“Eu perdi seis quilos e sinto-me enfraquecido, com muita canseira”, conta o treinador. Ele é um dos que pedem uma revisão dos protocolos da CBV.
Um surto da doença após o duelo contra o São José dos Pinhais-PR pela sexta rodada, no dia 27 de novembro, afetou dez jogadoras do Bauru e seis membros da comissão técnica.
“Fizemos cinco jogos fora de casa [entre 9 e 27 de novembro]. Quanto mais viagens, mais exposição ao risco de contaminação. São quatro jogos a cada duas semanas, ou seja, quatro possibilidades de infecção”, afirma Rubinho. “Esse protocolo foi determinado pela CBV em conjunto com os clubes. Temos que avaliar o cenário, porque a contaminação está em alta, e adotar mudanças, como, por exemplo, o modelo de bolha.”
De acordo com os médicos Sandra de Oliveira Campos, professora de infectologia da Unifesp, e Estêvão Urbano, da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), a testagem deveria ocorrer, pelo menos, nas últimas 72 horas que antecedem cada partida.
“Não existe um prazo perfeito, mas a cada 15 dias não é um bom esquema. Um paciente infectado transmite a doença com dois dias de antecedência de sentir os primeiros sintomas”, diz Campos.
Urbano relata que, a cada 100 casos de infecção, 85 pacientes estão assintomáticos ou apresentam sintomas leves. “Os atletas são jovens e tem imunidade boa, raramente terão sintomas severos, mas podem transmitir para todos ao redor, como a comissão técnica e os funcionários da equipe que compõem um grupo de risco”, declara o diretor da SBI.
No dia 2 deste mês, Bia, Karine, Kika e Roberta, do Osasco, receberam o diagnóstico de infecção pelo coronavírus menos de 24 horas depois de enfrentarem o Sesc-RJ/Flamengo.
“Comecei a ficar preocupada se havia passado o vírus para alguém e como estavam as meninas do time. Tive sintomas mais leves, com muita dor de cabeça, e deixei de sentir cheiro das coisas”, afirma a levantadora Roberta, que faz uma boa temporada e busca uma vaga entre as convocadas para os Jogos de Tóquio. “Sobre o protocolo, não tenho o que opinar. Temos que nos cuidar e esperar que a vacina saia logo.”
Em meio a escalada de casos, os atletas estão cada vez mais optando por utilizar máscaras em treinos e jogos da competição. O central Lucão, do Taubaté, um dos percursores do equipamento de proteção desde o Campeonato Paulista, conta que teme contrair o vírus e transmitir ao filho, de 4 anos.
“O voleibol é mais de explosão, não tem essa sensação de falta de ar, como poderia acontecer num esporte onde é preciso correr continuamente. Quando acontecia um rali, eu me afastava ao máximo do pessoal e levantava a máscara para respirar”, afirma.
Depois dele, nomes como Jaqueline, do Osasco, Drussyla e Lorenne, ambas do Sesc-RJ/Flamengo, e Maurício Borges, companheiro de Lucão no Taubaté, também tem ido às quadras de máscaras.
“A máscara não alterou meu desempenho em quadra. Acho que nós temos que fazer esse esforço para nos proteger, mas definitivamente não me atrapalha”, diz o ponteiro Maurício Borges.
A diretoria do Taubaté, segundo a assessoria de imprensa da equipe, não autorizou Lucão e Maurício Borges a comentarem o protocolo da Superliga.
Com o final do primeiro turno, no último dia 23, o torneio entrou em pausa até a primeira semana de janeiro. No feminino, as 11 rodadas do primeiro turno ainda não foram concluídas.
Apesar dos problemas em relação ao alto contágio pela doença, D’Avila faz uma avaliação positiva da competição: “Tecnicamente, temos muito a elogiar. As equipes se apresentaram com uma performance muito acima do esperado depois da pausa por conta da pandemia”.
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