Sem opção militar clara, Biden arrisca imagem dos EUA na crise da Ucrânia

IGOR GIELOW
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A crescente crise entre a Rússia e o Ocidente em torno das fronteiras conflituosas da Ucrânia, apenas uma opção militar clara poderá fazer Joe Biden tomar a dianteira que Vladimir Putin conquistou desde a saída.

O problema é mais ou menos óbvio: escalar um conflito que era intramuros ucranianos e agora envolve toda a Europa para aquilo que o americano chamou de risco de uma guerra mundial.

É um nó tático. Nesse conflito em formação, ou um dos lados está mentindo ou está profundamente errado acerca das intenções do adversário. Este talvez seja o maior risco que a dita paz mundial corre: algo pode sair do show de luzes e fumaça ora em curso.

Certamente é péssimo ver um presidente americano balbuciar palavras acerca de enfrentar a outra potência nuclear dominante no mundo.

Mas é ainda pior se você for ucraniano, é evidente. Biden está despedaçando a já má reputação do país como local de negócios ao repetir todos os dias que uma invasão é iminente por parte de Moscou.
Ela é? Tecnicamente, o que Putin fez nos últimos três meses foi mostrar para o mundo que ele pode agir de forma bastante danosa para fazer valer seus interesses.

Ninguém está na cabeça do presidente para saber, mas haveria pouca lógica em agir. Um dos elementos centrais de qualquer operação, o movimento de blindados e tanques, seria foco inicial de perigos para as intenções russas.

Os ucranianos estão equipados com mísseis antitanque americanos, e poderiam dar trabalho nessa área.

Mais importante, não há clareza acerca dos EUA. Sanções duras, incapacitantes, são uma constante na vida russa desde a Crimeia.

Atrapalharam, mas não mataram o país. A única linguagem que seria ouvida é a militar: invada e daremos suporte aéreo, ou lançaremos barragens de mísseis, para apoiar os ucranianos.

Biden não fará isso. O eleitor médio americano, e as “midterms” funestas para os democratas estão aí, não apoiaria o risco de uma guerra mundial por pessoas indistinguíveis a seus olhos dos russos.
Isso é bom, claro, ninguém quer ver mais um cavalo do Apocalipse solto por aí. Mas também prolonga a situação, com o Ocidente gritando que Putin vai invadir e o russo, cada vez mais agressivo, negando a intenção enquanto monta uma formidável força.

E a situação prolongada pode sempre degenerar em erros que levem a acidentes, que por si evoluam para escaladas. Basta ler a história da Primeira Guerra Mundial, com toda diferença de contexto que há.
Como tática para deter Putin, anunciar a cada dia uma invasão que não vem ou uma operação de “bandeira falsa” que não se sabe quem concebeu, parece ser um foco de desgaste bastante considerável para o presidente dos EUA.

O maior risco, e temor consequente, para os russos nessa crise é se os EUA e a Otan tiverem um plano efetivo de contra-ataque em caso de as coisas saírem do controle.

O máximo de sinalização que Washington dá é por ora simbólica, com alguns B-52 baixando no Reino Unido, outras tropas mandadas à Polônia. Perto da movimentação russa, ainda é pálido.

Novamente: basta um entrechoque para tudo mudar. Isso pode acontecer numa manobra no mar Negro, na Belarus.

Mas por ora o que se tem é um domínio de situação por parte de Putin. Por isso a hipótese de que ele estenda ao máximo a dinâmica da crise, acabando o dia com razão por não ter afinal invadido o vizinho, é bastante factível –embora haja um risco de corrosão de credibilidade óbvia, caso siga sem concessões.

Já a armadilha autoimposta por Biden parece mais severa. Se mantiver a arma no coldre e falando grosso, passa por fraco. Sua fala dizendo que não irá buscar americanos na Ucrânia em caso de guerra, um tipo de reação tardia ao desastre afegão, mostra o grau de confusão do americano. Se decidir fazer algo de fato, arrisca mais do que a reputação de seu país.

Pode caber à escanteada Europa tentar retomar protagonismos, até aqui com a anemia de Emmanuel Macron e a balbúrdia de Boris Johnson. Segue a crise.

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