IGOR GIELOW (FOLHAPRESS) – Após meses de impasse em torno da estratégica cidade de Bakhmut, em Donetsk (leste da Ucrânia), forças russas mudaram sua tática e conseguiram avançar para uma posição que pode lhes permitir romper as defesas ucranianas na região.
Segundo blogueiros militares russos e avaliação do Ministério da Defesa do Reino Unido, tropas do grupo mercenário russo Wagner controlam quase toda Soledar, uma cidadezinha de 10 mil habitantes famosa por sua mina de sal, que fica 15 km a nordeste de Bakhmut.
Desde outubro, russos e ucranianos transformam a região numa terra arrasada, um moedor de carne humana na definição das Forças Armadas de Kiev. Bakhmut em si hoje é mais uma ruína, ao estilo do que ocorreu em Mariupol (sul), tomada pelos russos no mais sangrento cerco da guerra iniciada em fevereiro do ano passado.
As linhas de suprimento para as forças da Ucrânia em Bakhmut foram interrompidas. Na segunda (9), o presidente Volodimir Zelenski disse que “graças à resistência em Soledar, nós ganhamos tempo”, sem especificar para quê.
Donetsk é, das quatro regiões anexadas por Vladimir Putin em setembro, a menos controlada pelos russos –talvez algo mais do que 50% dela esteja em mãos de Moscou. Há ações ofensivas também em Liman, cidade de onde os russos se retiraram em outubro, e Adviika.
A situação difícil consolida o fim da onda de otimismo exagerado acerca do momento pró-Kiev da guerra, que se mostrava evidente pela sequência de boas notícias para Zelenski: a retomada de territórios em Kharkiv (nordeste) e a retirada de forças russas da margem oeste do rio Dnieper em Kherson, abandonando a capital regional homômina, maior cidade que haviam conquistado.
Houve lances mais simbólicos, como os ataques com drones a bases aéreas no interior da Rússia e um ataque mortífero contra uma base com recrutas em Donetsk, mas o fato é que do fim do ano para cá o impasse voltou a dominar a cena -com um viés favorável aos russos, que têm tido tempo para se reorganizar e empregar os 320 mil reservistas que mobilizaram para os moedores de carne a oeste.
“Os soldados são feridos e morrem ou de frio ou de perda de sangue, sem que ninguém os colete”, afirmou o analista militar ucraniano Oleh Jdanov no Youtube, pintando naturalmente um quadro mais cruel do lado do adversário.
No sul do país, os ucranianos não conseguiram avançar além das linhas defensivas mais elaboradas dos russos na margem leste do Dnieper, e Moscou segue impondo uma campanha punitiva contra civis, mirando com mísseis e drones suicidas a infraestrutura energética do país em pleno inverno.
Na semana passada, após grande protelação, países ocidentais anunciaram o envio de blindados para a Ucrânia, exatamente o tipo de armamento necessário para a campanha no leste -que pressupõe seu emprego para romper linhas, no que de resto é uma grande batalha de artilharia.
Os números, contudo, ainda são modestos, e não há sinais de tanques de guerra, uma demanda de Kiev. Os EUA enviarão 50 blindados de combate de infantaria Bradley, a Alemanha, 40 similares Marder e a França, um número incerto de tanques leves AMX.
Se ficar nisso, não deve ser suficiente para mudar o rumo da guerra, assim como as complexas baterias antiaéreas Patriot americanas, que serão cedidas por países da Otan (aliança militar liderada pelos EUA), como a Alemanha. Se o influxo aumentar, como no caso do lançadores de foguetes Himars, o impacto pode ser significativo.
Zelenski quer pelo menos 300 novos tanques ocidentais. Da sua frota de 987 veículos pré-guerra, acrescida de 230 modelos soviéticos T-72 da Polônia, ao menos 444 foram destruídos segundo o site de monitoramento militar holandês Oryx.
O Reino Unido, segundo a imprensa local, estuda enviar alguns modelos pesados Challenger-2, buscando assim incentivar a Alemanha a fazer o mesmo com seus modernos Leopard-2. Um ex-comandante da Otan, o general britânico Richard Shirreff, disse à rádio londrina LBC que “o Ocidente deveria ter enviado tanques muito antes”.
Putin já sinalizou que, ao menos neste momento, estaria satisfeito em negociar uma paz que o deixasse com os nacos que anexou da Ucrânia, cerca de 20% dos território do país incluindo a Crimeia, que absorveu em 2014. Kiev não aceita, por óbvio, tal posição.
No Ocidente, o momento russo não passou despercebido. Após semanas falando sobre o que considerava derrota certa de Moscou, o secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg, afirmou nesta terça (10) que “não se deve subestimar a Rússia”.
Com isso, além de fazer um “hedge” acerca da situação em campo, abre espaço para o aumento no envio de armas para Kiev, algo que tem sido ajustado ao longo do conflito pelo temor de que os russos considerassem o fornecimento por exemplo de caças como um envolvimento direto demais da aliança no conflito -arriscando uma Terceira Guerra Mundial.
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