SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A droga nirsevimabe é segura e ofereceu alta proteção contra o vírus sincicial respiratório (VSR) em bebês saudáveis com três meses ou mais de idade durante a primeira estação do vírus vivenciada por essas crianças e por toda a duração do período sazonal.
A proteção para qualquer atendimento médico por doença respiratória nas crianças que receberam o tratamento foi de 74,5%. Para a hospitalização, a taxa de eficácia foi de 62,1%, em comparação com o grupo controle.
Essa é a principal descoberta de um estudo com 1.490 crianças para avaliar a ação do fármaco contra este que é o principal agente causador de infecções respiratórias infantis.
Os bebês foram divididos em três grupos para receber uma injeção única do medicamento com 50 mg ou 100 mg, de acordo com o peso da criança, ou placebo (substância inócua para o organismo). A avaliação de segurança e eficácia do tratamento ocorreu por um período de até 361 dias.
Os resultados do ensaio clínico de fase 3 controlado, randomizado e quádruplo-cedo (nem os pesquisadores, participantes, profissionais de saúde e comitê de assessoramento tinham conhecimento de quem recebeu qual substância) foram publicados na última quarta (2) na revista científica The New England Journal of Medicine (Nejm).
O vírus sincicial respiratório é o principal agente causador de bronquiolite e pneumonia em crianças menores de um ano de idade. Ele é altamente contagioso e pode provocar epidemias sazonais de doenças respiratórias em crianças.
O nirsevimabe é um anticorpo monoclonal que impede a penetração do vírus nas céulas. A droga foi desenvolvida em parceria pelas farmacêuticas AstraZeneca e Sanofi.
Até o momento, o único remédio disponível contra o vírus era o palivizumabe, produzido pela farmacêutica AstraZeneca, indicado somente para quadros graves de infecções respiratórias, com alto risco de hospitalização.
Os dados do ensaio com o nirsevimabe, assim, são promissores, uma vez que o fármaco apresentou alta eficácia em crianças saudáveis, não só naquelas com risco elevado, e para todas as idades.
Os pesquisadores avaliaram a eficácia do medicamento por faixa etária, com idade menor ou igual a três meses, de três a seis meses e de mais de seis meses.
Para as crianças que receberam o nirsevimabe, 12 de 994 (1,2%) tiveram infecção respiratória por VSR, contra 25 de 496 (5%) daquelas que receberam o placebo.
Ao longo do tempo, o risco de necessitar de atendimento médico por infecção respiratória foi cerca de 77% menor nos bebês tratados com a droga. Isso significa que 8 em cada 10 crianças com infecção pelo vírus tratados com a droga não precisaram de um atendimento médico.
Em relação a uma hospitalização de qualquer causa associada por infecção com VSR, a eficácia do medicamento foi de 59%. A análise por idade, porém, mostrou uma eficácia menor em crianças com menos de três meses, mas esse dado pode ter sido enviesado pelo número relativamente pequeno de bebês nessa faixa etária ou pelo baixo peso deles, que receberam a dose menor.
Quanto ao perfil de segurança, os efeitos colaterais mais comuns foram leves, e não houve a ocorrência de nenhum evento adverso grave.
Diferentemente das vacinas, os anticorpos monoclonais servem para tratamento após uma infecção –eles não são utilizados para preveni-la ou induzir resposta imune.
Ao contrário da droga palivizumabe, porém, o nirsevimabe manteve elevados os níveis de anticorpos no sangue mesmo 150 dias após o uso.
O pesquisador principal do estudo e professor de pediatria da Escola de Medicina da Universidade do Noroeste de Feinberg, William Muller, disse que os novos achados se somam aos resultados de estudos iniciais do grupo, incluindo um estudo de fase 2 com bebês que nasceram prematuramente, cuja eficácia calculada de prevenção de doença por VSR foi de 70,1%.
“Em conjunto, os novos dados e os dados disponíveis até o momento sustentam o uso de nirsevimabe para a prevenção de VSR em todos os bebês, daqueles com maior risco para doença grave -como os nascidos prematuramente ou com problemas cardíacos congênitos– e aqueles saudáveis”, explicou.
O estudo possui algumas limitações. Uma delas é que o ensaio, conduzido simultaneamente em diversos países incluindo Estados Unidos, França, Argentina e África do Sul, foi afetado amplamente pela pandemia da Covid-19. Com o regime de lockdown adotado por alguns países em 2020, a pesquisa precisou ser pausada.
Além disso, as medidas de proteção para conter a disseminação do coronavírus, como uso de máscaras e distanciamento físico, também impactaram a circulação de outros vírus respiratórios, incluindo o VSR.
Muller, no entanto, disse acreditar que isso não deve influenciar a eficácia da droga. “Não há razão para achar que a eficácia encontrada irá mudar nas diferentes partes do mundo”, afirmou.
Quanto à busca por um imunizante capaz de prevenir a infecção por VSR, e não apenas tratá-la, o pediatra diz que há esperanças.
“Não há uma resposta simples, mas no momento há vários esforços de pesquisa em todo o mundo para desenvolver vacinas contra o vírus sincicial respiratório capazes de prevenir infecção ou pela imunização da mãe, passando os anticorpos pela placenta, ou pela injeção dos bebês diretamente”, contou.
O médico espera que o fármaco seja desenvolvido de maneira ampla e acessível para as populações de todo o mundo.
A pesquisa foi coordenada por médicos do Instituto de Pesquisa em Pediatria Stanley Manne, do Hospital Pediátrico Ann e Robert Lurie, em Chicago (EUA), e tem colaboração de pesquisadores da AstraZeneca e da Universidade da Cidade do Cabo, na África do Sul.
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