(FOLHAPRESS) – Apesar das críticas de advogados e de empresários sobre o julgamento que quebrou decisões definitivas em temas tributários, ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) têm sustentado que a decisão da corte não criou insegurança jurídica e assegurou isonomia entre contribuintes.
Em público e nos bastidores, integrantes da corte têm apontado que não houve surpresa no entendimento firmado pelo Supremo no último dia 8.
Na ocasião, os ministros definiram que decisões definitivas (transitadas em julgado) em temas tributários perdem efeito a partir do momento em que há julgamento diferente pelo STF.
Na prática, isso significa que um contribuinte que tenha obtido uma decisão tributária favorável no passado, numa causa que posteriormente tenha decisão diferente pelo Supremo, pode ser acionado pela Receita Federal sem necessidade de uma ação rescisória.
O entendimento foi unânime entre os 11 ministros e houve divergências apenas a respeito de quando a cobrança dos tributos que não foram recolhidos deveria passar a ser feita: se a partir da decisão deste mês –o que criaria um “marco temporal”– ou a partir de julgamentos passados, nas ocasiões em que o STF aplicou novo entendimento a respeito de um determinado tributo.
Prevaleceu o último entendimento, em votação apertada, por seis a cinco. A corrente majoritária foi composta pelos ministros Luís Roberto Barroso, Gilmar Mendes, André Mendonça, Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia e Rosa Weber.
Entre as empresas afetadas com o julgamento, estão as que conseguem desde a década de 1990 decisões para deixar de recolher a CSLL (Contribuição Social sobre Lucro Líquido). Em 2007, o Supremo decidiu que esse tributo era constitucional, ao julgar uma ADI (ação direta de inconstitucionalidade).
Os ministros do STF têm apontado que as empresas que tinham decisões definitivas teriam que iniciar o recolhimento da CSLL a partir da decisão de 2007, que reconheceu a validade do tributo -e que empresários que atuaram de forma responsável, na visão deles, assim o fizeram.
A Braskem, uma das empresas que tinham obtido vantagem em não recolher a CSLL, por exemplo, recorria ao STF para manter essa situação. Porém, após a decisão de 2007, preveniu-se e não deixou de recolher o tributo, mesmo com a possibilidade de ganhar a causa na Justiça.
“Desde 2007, ano em que o STF restabeleceu a possibilidade de cobrança dessa contribuição, vem recolhendo regularmente a ‘CSLL’, não possuindo valores em aberto a recolher”, disse a Braskem em nota após o julgamento. Segundo a empresa, a decisão não implica qualquer impacto para a companhia.
Uma parte do Supremo aponta que as decisões transitadas em julgado que permitiram que contribuintes não recolhessem tributos durante anos criaram uma “casta privilegiada” e que a decisão do último dia 8 corrige essa distorção.
Também apontam que o entendimento do STF deve ser seguido pelo Fisco quando um determinado tributo é invalidado pela corte. Ou seja, vale para os dois lados.
Após o julgamento do dia 8 e das críticas dos advogados e empresários, o ministro Luís Roberto Barroso decidiu ir a público para afirmar que não houve insegurança jurídica criada pela decisão do STF. Ele foi o relator de uma das ações que levaram o STF a firmar uma tese sobre o tema.
“A insegurança jurídica foi criada pela decisão de, mesmo depois da orientação do Supremo de que o tributo era devido, continuar a não pagá-lo ou a não provisionar”, afirmou Barroso.
“A partir do momento em que o Supremo diz que o tributo é devido, quem não pagou ou provisionou fez uma aposta”, disse o ministro.
Barroso destacou a importância de que um determinado tributo incida sobre todos os atores do mercado, porque, se não fosse assim, quem tiver obtido uma coisa julgada antiga teria uma vantagem competitiva em relação aos concorrentes.
No Congresso, parte dos deputados que criticaram a decisão do Supremo apresentou propostas com intenção de reverter ou amenizar os efeitos do que foi decidido pela corte.
O assunto, inclusive, foi abordado pelo próprio presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), no último dia 15.
Lira defendeu que questões como essas deveriam ter maioria absoluta no Supremo e afirmou que já tem em seu radar “umas duas PECs [Proposta de Emenda à Constituição] e uns seis projetos de lei” para discutir a decisão.
“Essas questões, quando mexem numa amplitude do aspecto do investidor, das empresas, da vida financeira do país, por 6 a 5 fragiliza a decisão. No meu ponto de vista deveriam, por obrigação, ter um quórum mínimo de três quintos, uma maioria superabsoluta do Supremo Tribunal Federal com uma tese pacificada a respeito de um assunto tão delicado”, afirmou Lira.
O primeiro parlamentar a tratar do tema foi o deputado federal Pedro Paulo (PSD-RJ). Ele apresentou um projeto de lei e um projeto de lei complementar.
O primeiro, nas palavras do parlamentar, é para “reestabelecer a coisa julgada”. O texto propõe uma modulação ao criar um marco temporal que delimita o período sobre o qual a decisão terá efeito.
O parlamentar justifica o PL afirmando que a decisão da corte é “cenário nefasto para a segurança jurídica” e cita que é preciso “resguardar a confiança e previsibilidade”. “Não é conveniente se instaurar a maior surpresa fiscal da década aos contribuintes.”
“As consequências práticas da decisão, sem modulação de efeitos, deveriam ter sido consideradas pelos eminentes ministros, haja vista que se deve sempre primar pela estabilidade, confiabilidade e previsibilidade das ações do Poder Público, sendo esta revelação máxima do princípio do Estado de Direito”, diz o texto.
Já no projeto de lei complementar, que o parlamentar afirma ser uma espécie de “plano B” caso não seja possível reverter a decisão do STF –embora seja uma proposta mais possível de ser aprovada–, Pedro Paulo propõe o parcelamento dos valores.
Nesse caso, o devedor que aderir à transação terá até 84 meses (sete anos) para quitar o saldo com desconto de 100% em juros e multas, preservada a correção monetária.
Caso o contribuinte elimine o passivo em 12 meses, além dos juros e multas, ele também ficará livre da correção monetária.
Os três deputados federais da bancada do Novo, por sua vez, apresentaram dois projetos de lei. Um deles também trata da possibilidade de parcelar a dívida do contribuinte que for afetado pela decisão da corte.
Outro PL tem por objetivo fazer com que a Receita Federal tenha de acionar o contribuinte que já tenha uma decisão concluída por meio de uma ação rescisória. Dessa forma, o efeito da decisão do STF não será automático.
Ainda nessa frente, o deputado Fábio Garcia (União Brasil-MT) sugeriu uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que, segundo ele, é para “garantir a segurança jurídica no país”. São necessárias 171 assinaturas para a proposta tramitar na Câmara.
O texto propõe que mudanças de jurisprudência do STF e do STJ (Superior Tribunal de Justiça) deverão ser aprovadas por dois terços de seus membros e que as decisões somente produzirão efeitos “a fatos ocorridos posteriormente ao seu proferimento”.
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