Por que paciente que recebeu córneas em transplante de órgãos com HIV não foi infectado

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O paciente que recebeu córneas de um dos doadores com HIV não foi infectado, de acordo com a SBC (Sociedade Brasileira de Córnea) e o CBO (Conselho Brasileiro de Oftalmologia). Não há relato na literatura médica da transmissão do vírus por meio do transplante de córnea porque o órgão não possui vasos sanguíneos.

 

Seis pacientes que receberam outros órgãos na fila de transplante da Secretaria Estadual de Saúde do Rio de Janeiro receberam testes positivos para o vírus.

“Existe o risco potencial, mas é ínfimo, não temos conhecimento documentado de nenhum caso”, diz o presidente do CBO, José Álvaro.

O órgão é doado para pessoas com cegueira parcial ou total. “Quando a pessoa tem uma doença que altera a córnea, ela tem dificuldade em enxergar. Muitos desses casos precisam ser tratados com a substituição da córnea doente”, explica.

O sistema brasileiro de transplantes, segundo a SBC e o CBO, tem um alto nível de confiabilidade e transparência, sendo o maior sistema público do mundo.

“O que ocorreu no Rio de Janeiro foi um fato isolado, embora gravíssimo, decorrente do erro de exame sorológico realizado por um único laboratório, não correspondendo ao nível de excelência que se tem em toda a rede envolvida no sistema”, dizem as entidades em nota.

O PCS Lab Saleme, laboratório que emitiu supostos laudos falsos que resultaram no transplante de órgãos infectados com HIV, está sob investigação.

O médico ginecologista Walter Vieira, um dos sócios da clínica, foi preso na segunda-feira (14) durante operação da Polícia Civil do Rio de Janeiro. Ivanilson Fernandes dos Santos, responsável técnico pelos laudos, também está detido.

O técnico de laboratório Cleber de Oliveira Santos e a técnica em patologia clínica Jacqueline Iris Bacellar de Assis estão foragidos.

O laboratório PCS Lab Saleme afirmou, em nota, que os resultados preliminares de uma investigação interna indicam que um erro humano levou à infecção com o vírus HIV de seis pessoas que receberam transplantes de órgãos.

Durante o período em que o laboratório prestou serviços para o sistema de saúde estadual do Rio de Janeiro, realizou 286 testes para o sistema de transplantes. Após a divulgação da contaminação dos receptores, a Secretaria de Saúde do estado afirmou que faria o teste das amostras de sangue mais uma vez.

A reportagem confirmou que um dos laudos que atestou negativo para HIV no caso dos pacientes que foram infectados pelo vírus após transplantes no Rio de Janeiro foi assinado por Jacqueline Iris Bacellar de Assis, que é técnica em patologia clínica.

Abaixo do nome de Jacqueline, no entanto, havia o registro profissional de uma biomédica que mora no Recife e está com o registro suspenso. Ela afirmou que nunca trabalhou no Rio de Janeiro e irá fazer um boletim de ocorrência.

O atestado de formação foi apresentado pelo laboratório, que afirma ter recebido o documento de Jacqueline no momento de sua contratação. A técnica, por sua vez, afirma desconhecer o documento.

O PSC Lab Saleme afirmou que a técnica “informou ao laboratório diploma de biomédica e carteira profissional com habilitação em patologia clínica”. A clínica enviou o print de uma conversa com Jaqueline em que ela teria enviado o diploma da Unopar.

Procurada, a instituição negou a formação acadêmica da investigada. “A Unopar não emitiu certificado de conclusão de curso de graduação, de qualquer natureza, para a Jacqueline Iris Bacellar de Assis.”

O advogado de Jacqueline, José Félix, também afirmou que ela “jamais trabalhou como biomédica”, que “não tem capacidade técnica e nunca teve interesse na função” e que não reconhece o diploma citado pelo laboratório, pois a funcionária “jamais cursou ou tem a faculdade de biomedicina”.

O CRF-RJ (Conselho Regional de Farmácia do Rio de Janeiro) afirma que a técnica em laboratório possui inscrição ativa como profissional de nível médio. Para assinar laudos, no entanto, o conselho diz que é preciso ter uma formação acadêmica de nível superior.

Em entrevista antes de estar foragida, a profissional disse que começou a trabalhar no local como supervisora administrativa em outubro de 2023 e que não assinava laudos. Segundo ela, seu nome estaria sendo usado como “laranja”.