BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O governo de Jair Bolsonaro vai enviar um avião da FAB (Força Aérea Brasileira) para Guiné-Bissau, de forma a possibilitar a visita oficial ao Brasil do presidente do país.
Umaro Sissoco Embaló, que já foi chamado de “Bolsonaro da África”, é admirador declarado do brasileiro. Ele é acusado de promover uma guinada autoritária na Guiné-Bissau, e opositores o acusam de tentar implementar uma ditadura no país.
Ele deve chegar a Brasília no início desta semana. O uso de aeronave oficial do governo brasileiro para transportá-lo foi confirmado pelo Itamaraty, após questionamento feito pela Folha.
A praxe é que chefes de Estado venham ao país em avião próprio ou arquem com as despesas do voo. De acordo com diplomatas ouvidos pela reportagem, a prática de oferecer voo da FAB para estrangeiros já foi usada, principalmente para países menores e com poucos recursos.
“A exemplo de precedentes de oferecimento de transporte oficial de altas autoridades estrangeiras, o deslocamento do presidente bissau-guineense em aeronave da Força Aérea Brasileira insere-se no quadro dos laços culturais, históricos, linguísticos e de amizade que o Brasil mantém com Guiné Bissau, especialmente no contexto da pandemia, que prejudicou as conexões aéreas internacionais”, disse a pasta.
A provável agenda de Embaló inclui, na terça (24), uma recepção por Bolsonaro no Palácio do Planalto e um almoço em sua homenagem no Itamaraty. No dia seguinte, os dois presidentes devem comparecer a uma cerimônia alusiva ao Dia do Soldado.
Funcionários da embaixada do país africano tentam ainda organizar reuniões de Embaló com os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG). Essas audiências ainda não foram confirmadas, de acordo com interlocutores.
Na Guiné-Bissau, Embaló, 48, é criticado pela indicação de militares a postos-chave da estrutura do Estado, em detrimento de servidores civis, e por ter apoiado a repressão policial contra uma greve de professores e profissionais de saúde.
Ele também tem defendido uma reforma da Constituição local –que, segundo críticos, teria por objetivo concentrar poderes nas mãos do presidente. Militar da reserva, Embaló disse em entrevista recente ver Bolsonaro como uma inspiração.
“O vice-presidente do Brasil [Hamilton Mourão] disse-me durante a cimeira [cúpula] da CPLP [Comunidade dos Países da Língua Portuguesa] que Jair Bolsonaro decidiu candidatar-se à Presidência por entender que o Brasil não podia correr mais riscos. Porque os civis não se entendem”, afirmou Embaló em 20 de julho, segundo a rede alemã Deutsche Welle.
“[Bolsonaro disse:] Vamos concorrer às presidenciais e, se ganharmos, vamos pôr ordem no Brasil.” Embaló, então, afirmou ter feito a mesma coisa em seu país.
Guiné-Bissau é uma ex-colônia portuguesa, que faz parte da CPLP. A cúpula ocorreu em meados de julho, na capital de Angola.
O anúncio da visita de Embaló foi feito pelo próprio Bolsonaro, em conversa com apoiadores no mês passado -na qual ele não se lembrou do nome do líder nem de seu país. “Eu vou receber, [no] final de setembro se eu não me engano. Lá da África, qual o país da África? Eu conversei com ele”, disse. “Ele é conhecido como Bolsonaro da África. Ele por acaso é general de Exército.”
Segundo pessoas com conhecimento do tema, o bissau-guineense deverá ficar cerca de uma semana no Brasil, com passagens também por São Paulo e Rio de Janeiro.
O longo período contrasta com o de outras visitas de chefe de Estado em agendas bilaterais. Normalmente, governantes em missão oficial ficam pouco tempo num mesmo país.
Até aqui, Embaló tem prevista uma reunião com o governador João Doria (PSDB) em São Paulo e uma visita ao recém-reaberto Museu da Língua Portuguesa. Membros da comunidade de imigrantes de Guiné-Bissau na capital paulista planejam atos de protesto contra o presidente.
No Rio de Janeiro, ele deve ter uma reunião com altos funcionários da Marinha.
De acordo com Alexandre dos Santos, professor de África no Instituto de Relações Internacionais da PUC-Rio (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro), Embaló usa a associação com Bolsonaro para defender ações de política interna.
Ele citou o presidente brasileiro para justificar a militarização do governo, ao afirmar que fardados estão preenchendo cargos para lidar com problemas para os quais civis não encontraram solução, como a corrupção. Embaló também adotou a retórica bolsonarista na campanha presidencial, ao se apresentar como um postulante contra a “velha política”.
Na avaliação de Santos, a visita ao Brasil representará um ganho político expressivo para Embaló e deve ser explorada pelo guineense.
“Para Bolsonaro não vai fazer diferença, ele vai receber alguém com quem tem proximidade ideológica. Quem vai ganhar muito é mbaló, que vai usar a viagem para defender suas posições internamente, o que é muito ruim para a democracia de Guiné-Bissau”, diz.
Notícias ao Minuto Brasil – Mundo