Para evitar derrota maior, governo é forçado a desidratar PEC Emergencial

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Sob risco iminente de que a estrutura principal da PEC Emergencial fosse derrubada, o governo foi forçado nesta quarta-feira (10) a fazer uma desidratação parcial do texto. Em votação na Câmara dos Deputados, articuladores do Planalto aceitaram abrir mão de medidas de ajuste fiscal defendidas pelo Ministério da Economia.

O texto-base da PEC foi aprovado na madrugada desta quarta em primeiro turno na Câmara. A proposição recebeu 341 votos favoráveis e 121 contrários -eram necessários pelo menos 308 votos.
Ainda é preciso votar outros destaques. Em seguida, a PEC será votada em segundo turno, e precisa receber ao menos 308 votos favoráveis para ser aprovada. Se não houver mudanças, segue para promulgação pelo Congresso, uma vez que já foi passou pelo Senado.

Pela negociação na Câmara, serão retirados do texto dispositivos que impediriam progressões e promoções de carreira de servidores e agentes públicos. Com a medida, mesmo em casos de emergência fiscal ou calamidade pública todos os servidores seguirão com o direito a avançar nas carreiras, aumentando assim seus salários.

Até as 19h30, os deputados analisavam destaques que poderiam alterar o teor do texto. Após a conclusão, a expectativa era que o texto fosse votado em segundo turno ainda nesta quarta para posteriormente seguir para promulgação.

Destaque apresentado pelo PT tinha como objetivo retirar o artigo da PEC que estabelece gatilhos de ajuste fiscal nos estados e municípios quando a despesa corrente ultrapassar 95% da receita corrente.

Pelo artigo, nesses casos, podem ser adotados mecanismos para reduzir o endividamento, com a proibição de concessão de aumentos a servidores, realização de concursos públicos ou criação de despesas obrigatórias.

Na prática, porém, a retirada desse dispositivo não inviabilizaria apenas o ajuste dos governos regionais, mas também da União. Ainda tornaria sem efeito o ajuste fiscal proposto em caso de decretação de calamidade, enterrando o protocolo de crise elaborado pelo Ministério da Economia.

Esse efeito em cascata ocorreria porque nos casos de calamidade ou de crise fiscal na União, a PEC afirma que serão adotados os ajustes previstos no artigo que trata de estados e municípios -e que quase foi descartado pelos deputados.

Esses mecanismos são o pilar da proposta defendida pela equipe econômica. O ministro Paulo Guedes (Economia) chegou a dizer a interlocutores que poderia deixar o cargo se o Congresso não aprovasse as medidas de ajuste como contrapartida à liberação da nova rodada do auxílio emergencial.

Para evitar a aprovação do dispositivo, o acordo construído, formalizado pelo líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), inclui a apresentação, no segundo turno, de um destaque para suprimir da PEC todos os dispositivos que impedem progressão e promoção de agentes públicos. Esteves Colnago, assessor especial de Guedes, esteve no plenário para ajudar a costurar o pacto.

De acordo com interlocutores de Guedes, o ministro deu aval ao acordo para liberar as progressões. A estratégia adotada foi a de abrir mão de um ponto considerado menor para salvar todo o resto da proposta. A avaliação é que a eliminação dos gatilhos de ajuste fiscal teria sido uma das maiores derrotas deste governo no Congresso.

Levantamento preliminar do Ministério da Economia indica que o impacto da liberação das promoções e progressões é de aproximadamente R$ 1,5 bilhão em um ano para o governo federal.

O custo total da medida será mais alto porque também se estende a servidores estaduais e municipais.

O relator do texto, Daniel Freitas (PSL-SC), manteve o texto como veio do Senado. No entanto, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e deputados ligados à segurança pública tentaram excluir do ajuste fiscal promovido pela PEC categorias como policiais e militares.

Esse grupo foi decisivo na pressão pela derrubada das medidas, o que acabou levando o governo a abrir mão de parte do ajuste para não perder todo o texto.

Líderes de partidos de centro e o próprio presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), porém, se alinharam à equipe de Guedes e ao presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, para evitar uma desidratação maior do texto, o que não conseguiram.

“Que fique muito claro, não se trata de uma exclusividade para a questão da segurança. Estamos permitindo, com essas supressões, as progressões e promoções a todas as categorias. Que a gente possa fazer o mínimo possível de estrago”, disse o relator.

Depois de quase duas horas de votação aberta e com o acordo formalizado, o texto da PEC foi mantido por 319 votos a 181.

Mais cedo, na votação de um destaque do PDT sobre desvinculação de receitas de fundos e órgãos, o governo foi derrotado por seis votos.

Com isso, o governo não poderá remanejar recursos de fundos como o de meio ambiente, cultura, aviação civil, saúde e social. Também será obrigado a manter os repasses à Receita Federal.

Além de representantes da Economia, o ministro Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) também esteve no plenário para ajudar a costurar o acordo. Ele, porém, minimizou as derrotas sofridas. “A democracia impõe o debate e o voto. Se o voto de quem queria manter os votos ganhou, cabe ao governo ou quem está disputando respeitar o resultado”, disse.

“A democracia impõe a naturalmente a divergência de opiniões. Isso aí é previsto. Eu sempre digo sem querer ofender ninguém: na Coreia do Norte deve ser mais fácil. Não deve ter essa pluralidade.”

A PEC foi aprovada no Senado na última quinta-feira (4). A tramitação acelerada tem como objetivo destravar o pagamento do auxílio emergencial em março. Segundo Guedes, as parcelas da nova rodada do benefício irão variar de R$ 175 a R$ 375. O valor médio será de R$ 250.

A PEC autoriza o uso do saldo financeiro dos fundos públicos para compensar a dívida pública. A medida é uma forma de balancear o endividamento a ser realizado para pagar o novo auxílio emergencial e outras consequências da crise do coronavírus.

Proposta que chegou a fazer parte da medida, a extinção dos mínimos constitucionais para gastos com saúde e educação saíram do texto durante a tramitação no Senado.
Também foi retirado o corte nos repasses do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador) para o BNDES.
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O QUE PREVÊ A PROPOSTA?

AUXÍLIO EMERGENCIAL

  • Permite nova rodada da assistência em 2021, com custo de até R$ 44 bilhões.
    – Novo auxílio fica fora do teto de gastos.
    – Texto não detalha público e valor do auxílio. Governo editará MP para efetivar o programa, que deve ter parcela padrão de R$ 250 por quatro meses (mulher chefe de família receberá valor mais alto, e pagamento será menor para pessoas que vivem sozinhas).

MEDIDAS DE AJUSTE FISCAL

DECRETO DE CALAMIDADE PÚBLICA NACIONAL
– Pode ser acionado em situação de crise aguda e generalizada no país, como por exemplo em uma pandemia. Neste ano, o governo não pretende decretar nova calamidade.
– Cria dispositivos para enfrentamento dessas crises, como a flexibilização de limites de gastos e afrouxamento de regras para compra de insumos e contratação de pessoal.
– Durante a vigência da calamidade, gatilhos de controle de despesa também são acionados. Objetivo é compensar o endividamento provocado pelo aumento de gastos.
– Entre os gatilhos, estão a suspensão de reajustes de servidores, de criação de cargos e concursos públicos, além de vedação de aumento de auxílios e criação de despesas obrigatórias ou incentivos tributários.
Fica autorizado o uso do saldo financeiro dos fundos públicos para abater a dívida pública.

EMERGÊNCIA FISCAL
– Para a União, cria gatilhos a serem acionados temporariamente em caso de aperto nas contas públicas, quando a despesa obrigatória primária passar de 95% – da despesa total. Para estados e municípios, o ajuste é facultativo, quando a despesa corrente ultrapassar 95% da receita corrente.
– Objetivo é limitar o crescimento das despesas da União e assegurar que estados e municípios poupem.
– Medidas de ajuste fiscal são as mesmas previstas para a calamidade.

OUTRAS MEDIDAS
– Prevê que uma lei complementar traga regras e medidas visando a sustentabilidade da dívida pública.
– Determina um prazo de seis meses para que o governo apresente um plano para redução gradual dos benefícios tributários. Proposta terá que estabelecer corte de benefícios em 10% ao ano, levando o montante a até 2% do PIB em oito anos (hoje está acima de 4% do PIB).
– Prorroga de 2024 para 2029 o prazo para que estados e municípios paguem precatórios.
– Acaba com a obrigatoriedade de que União crie financiamentos para ajudar no pagamento desses precatórios.

O QUE SAIU DA PEC NA CÂMARA
– Proibição de promoções e progressões de carreira para servidores públicos em momentos de emergência fiscal ou calamidade pública. Esse benefício é mantido.
– Desvinculação de receitas tributárias a fundos, despesas e órgãos específicos. Governo não poderá remanejar recursos que alimentam fundos como os de meio ambiente, cultura, aviação civil, saúde e social. Também será obrigado a manter os repasses à Receita Federal.

O QUE SAIU DA PEC NO SENADO
– Extinção do gasto mínimo para saúde e educação
– Gatilhos mais rígidos, como corte de jornada e salário de servidores públicos em até 25%, além de redução de pelo menos 20% dos cargos de confiança
– Fim das transferências de recursos do FAT ao BNDES
– Fim da obrigatoriedade de reajuste anual dos servidores
– Limite à correção de valores das emendas parlamentares
– Extinção de municípios pequenos que não tenham recurso para se sustentar
– Criação do Conselho Fiscal da República
– Definição do TCU (Tribunal de Contas da União) como instância superior aos tribunais de contas estaduais e municipais, padronizando entendimentos na área fiscal
– Fim de vinculações de receita
– Extinção dos fundos públicos
– Necessidade de dotação orçamentária para o cumprimento de determinação judicial ou de lei que implique aumento de despesa

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