HASSLOCH, ALEMANHA (FOLHAPRESS) – Ao final da eleição mais disputada e imprevisível da história alemã no pós-guerra, o número de assentos do Bundestag (equivalente à Câmara dos Deputados) chegou a um número recorde: 735 representantes devem compor o Parlamento, segundo boletim oficial.
É um aumento de 3,7% sobre a legislatura anterior e um Parlamento 23% maior que as 598 vagas previstas. Isso acontece por causa do sistema eleitoral alemão, que une dois tipos de representação –um por distrito e outro proporcional.
O problema do inchaço é que ele torna o trabalho parlamentar menos eficiente, com comissões muito grandes e mais ruído nas negociações. Assessores legislativos que estudaram o funcionamento parlamentar recomendaram que o número de cadeiras fosse de no máximo 600.
No ano passado, uma reforma para restringir o inchaço não foi adiante no Bundestag. O número desta eleição, contudo, ainda ficou abaixo de previsões de especialistas, como a do professor de matemática da Universidade de Stuttgart Christian Hesse, que chegou a prever 860 cadeiras, com base nas pesquisas de intenção de voto.
O Partido Social Democrata, de centro-esquerda, elegeu o maior número de deputados: 206, um crescimento de 35% sobre a legislatura anterior e dez assentos a mais que os de sua principal concorrente, a União (CDU/CSU), de centro-direita.
A conservadora União, partido da primeira-ministra Angela Merkel, perdeu 24% de seus assentos, obtendo a menor representação desde o pós-guerra.
Como nenhum partido sozinho chegou aos 368 deputados necessários para garantir a maioria, as siglas tentarão na próxima semana fechar coalizões que lhe garantam governar. Tanto Scholz quanto o candidato da União, Armin Laschet, podem terminar escolhidos como o sucessor de Merkel, que fica no cargo até que o plenário aprove um novo nome.
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Entenda os próximos passos da formação do governo alemão.
Que candidato ganhou a eleição na Alemanha?
Nenhum. Os eleitores alemães não votam em candidatos a primeiro-ministro, mas em deputados, que vão depois eleger o chefe de governo.
Por que então os partidos lançam candidatos?
Para que os eleitores saibam, quando decidem votar em determinado partido, quem será o primeiro-ministro caso essa sigla tenha sucesso em montar um governo.
O primeiro-ministro é o candidato do partido mais votado?
Não necessariamente, embora o partido mais votado tenha cacife político para atrair partidos para uma coalizão.
Já houve primeiro-ministros que não eram do partido mais votado?
Sim. Na eleição de 1976, a União obteve Em 1976, por exemplo, a União obteve quase 49% dos votos, mais de 5 pontos percentuais à frente do SPD, mas o primeiro-ministro social-democrata Helmut Schmidt continuou no cargo após renovar a coligação com o FDP e somar 253 deputados, 5 além da metade dos assentos.
Qualquer candidato pode tentar formar uma coligação?
Sim, não há nenhuma regra que impeça isso. Nesta eleição, ainda que a União tenha ficado 1,6 ponto percentual atrás do SPD, seu candidato, Armin Laschet, anunciou no domingo (26) que tentará formar um governo.
Tanto Laschet quanto Scholz podem iniciar negociações com outros partidos simultaneamente. Eles podem inclusive decidir refazer a coalizão entre suas siglas, que sustentava o governo Merkel.
Quais as coligações possíveis?
Há pelo menos cinco combinações de partidos que chegam excedem os 368 deputados necessários para obter maioria –quatro delas teriam à frente o SPD e uma, a União.
As coligações possíveis são Semáforo (SPD, FDP e Verdes), com 416 assentos, Quênia (SPD, União e Verdes), com 520 assentos, Mickey Mouse (SPD, União e FDP), com 494 assentos, GroKo (SPD e União), com 402 assentos, e Jamaica (União, Verdes e FDP), com 406 assentos.
Cogitada durante a campanha, uma coligação entre SPD, Verdes e Esquerda fica 5 assentos atrás do mínimo necessário, ou seja, é inviável.
Os Verdes vão fazer parte do próximo governo?
Não obrigatoriamente, embora o crescimento do partido entre as duas legislaturas dê aos Verdes prestígio político para reivindicar participação na próxima gestão.
Numericamente, há ao menos duas coligações possíveis sem os verdes: a GroKo (grande coalizão), que reúne apenas SPD e União e era a que dava apoio a Merkel em seu último mandato, e a Mickey Mouse, na qual entram também os liberais do FDP.
Os Verdes poderiam formar um governo com a direita?
Sim, e sua liderança já anunciou que nos próximos dias vai se reunir com os liberais do FDP para discutir quais os compromissos possíveis entre as plataformas bem diferentes dos dois partidos, principalmente em relação a aumento ou corte de impostos e aos limites de dívida pública.
Se fizerem um acordo, as duas siglas ganham poder nas negociações futuras tanto com o SPD como com a União.
Uma aproximação dos Verdes com os sociais-democratas já ficou evidente durante a campanha eleitoral e, após os resultados, a candidata ambientalista, Annalena Baerbock, disse que prefere uma coligação com o SPD, embora não descarte governar com a União;
A Esquerda e a AfD não podem participar das coligações?
Em tese, podem. Mas nenhum dos partidos aceita se ligar à ultradireitista AfD, cuja plataforma é xenófoba e que já abrigou em seus quadros grupos de extrema direita.
Em relação aos socialistas da Esquerda, eles foram descartados pela União durante a campanha, mas não pelo SPD e pelos Verdes. No entanto, como algumas de suas propostas são muito conflitantes com as dos outros partidos e seu número de assuntos não tem peso suficiente, é difícil que ela seja incluída em algum dos grupos.
Quando os deputados elegem o novo primeiro-ministro?
Não há data limite. Quando um partido obtiver um acordo de coalizão que lhe dê maioria, ele leva o nome de seu candidato a primeiro-ministro para aprovação pelos deputados.
Quem governa a Alemanha até que haja um primeiro-ministro?
Angela Merkel continua no cargo, mesmo com um novo Parlamento eleito. Se a decisão sobre o novo governante se estender até depois de 19 de dezembro, ela baterá o recorde alemão de dias como primeira-ministra, que hoje é de seu mentor, Helmut Kohl.
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