Com a proximidade do fim do veto a reajustes salariais de servidores, imposto pelo socorro federal concedido durante a pandemia, ao menos 14 governadores projetam recomposições inflacionárias ou aumentos reais para 2022, ano eleitoral. Parte deles já aprovou projetos que miram determinadas categorias, com destaque para professores e policiais.
No ano que vem, 17 governadores poderão tentar a reeleição. Dois deles ao menos já declararam não ter interesse – os tucanos João Doria (SP) e Eduardo Leite (RS), que disputam entre si a vaga de presidenciável do PSDB. Ambos não preveem aumentos. Entre os demais, nove já anunciaram planos ou debatem a possibilidade, como Wilson Lima (PSC), do Amazonas, que planeja fazer o anúncio no Dia do Servidor, celebrado em 28 de outubro.
“Estamos finalizando os estudos para definirmos os porcentuais do reajuste, que será concedido para todas as categorias. Ao menos a correção inflacionária vamos dar, é inevitável. Em ano eleitoral, as pressões pelo aumento vêm de todos os lados. Mas estamos preparados e com as contas em dia para fazermos isso com responsabilidade”, disse Lima, que afirmou ser candidato à reeleição.
Mesmo sem assumir publicamente a decisão de concorrer novamente, e depois de resistir a dois processos de impeachment, Carlos Moisés (PSL) se movimenta em busca de mais quatro anos à frente do governo de Santa Catarina. Enquanto negocia uma troca de sigla, Moisés enviou dois projetos para apreciação dos deputados com a finalidade de ampliar a remuneração de militares – ele próprio é bombeiro – e professores em ações de impacto bilionário para os cofres públicos. A estimativa é que o custo alcance cerca de R$ 1,2 bilhão ao ano.
Mas quando se trata de impacto financeiro, o Rio até agora é líder do ranking. Com o caixa reforçado após a venda da Companhia Estadual de Águas e Esgotos (Cedae), o governador Cláudio Castro (PSC), que assumiu o cargo após o impeachment de Wilson Witzel (PSC), vai ampliar o gasto com o funcionalismo público em R$ 6 bilhões pelos próximos três anos.
A Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) já aprovou um projeto, com o apoio do Executivo, que autoriza valorização de 22% para os 432 mil servidores, sem recomposição desde 2014.
Um dos autores da proposta, o deputado Luiz Paulo (Cidadania), considera a medida apenas uma forma de mitigar as perdas somadas ao longo dos anos. “E é evidente que existe um conteúdo político eleitoral atrás de tudo. Já viu algum governador que é candidato à reeleição que não tenha um conteúdo neste sentido?”, questionou.
Mato Grosso também já aprovou a recomposição salarial de
todos os servidores, em 6%. A ação foi assegurada na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2022 ao custo estimado de R$ 550 milhões. O secretário da Fazenda, Rogério Gallo, afirmou que as contas suportam a medida que, segundo ele, não tem motivação eleitoral.
“O Estado recuperou a sua capacidade financeira e de pagamento, e também reduziu abaixo de 49% os gastos de pessoal em relação à receita corrente líquida. Foram estes dois movimentos que permitiram, para o próximo ano, a concessão desses
6,05% e não um movimento político”, disse.
Cautela.
Em Minas, a secretária de Planejamento e Gestão, Luísa Barreto, afirmou que qualquer decisão do governo Romeu Zema (Novo) neste sentido vai depender de duas outras medidas: a aprovação pela Assembleia Legislativa do projeto de adesão ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF), enviado à Casa em 2019 e agora tramitando em regime de urgência, e a manutenção da suspensão do pagamento da dívida do Estado com a União.
“Nossa situação fiscal é muito complexa. Só agora estamos conseguindo pagar os salários em dia. Sabemos, no entanto, que a inflação reduziu muito o poder de compra dos funcionários e, por isso, analisamos com cautela a possibilidade de correção pela inflação. Mas só vamos resolver isso ano que vem, depois de sabermos se seguimos com a liminar que suspende a nossa dívida”, disse.
Roraima segue a mesma linha. O secretário da Fazenda do Estado, Marcos Jorge, afirmou que a gestão Antonio Denarium (PP) vai aguardar o primeiro trimestre de 2022 para avaliar a possibilidade de conceder reajuste ao funcionalismo.
“O Estado sofreu intervenção federal em 2018 porque não conseguia pagar os servidores. De lá pra cá temos feito um trabalho forte para colocar as contas no azul e melhorar o ambiente de negócios. Já até liberamos a progressão vertical de cargos, com aval do Judiciário, mas a posição é mesmo de cautela.”
Reeleito em 2018, o governador do Piauí, Wellington Dias (PT), afirmou ao Estadão que ainda está estudando a demanda e que deve considerar sim a recomposição da inflação a partir de 2022. Presidente do Consórcio Nordeste, o petista afirmou que levará o tema aos demais governadores da região.
Já São Paulo, que atualmente comemora uma projeção de crescimento de até 7,6% do PIB paulista em 2021, não iniciou debate a respeito de reajuste ou aumento real ao funcionalismo. De acordo com a Secretaria de Governo, a ordem é acompanhar a evolução da economia e da arrecadação no próximo ano para então definir a adoção de políticas salariais e gratificações aos servidores públicos.
É difícil separar uso político de justiça, afirma analista
Com a volta da inflação na casa dos dois dígitos fica difícil separar a necessidade do reajuste salarial dos servidores públicos com o uso político da ação, afirma o presidente da comissão de direito administrativo da OAB-SP, Adib Kassouf Sad.
“O que nós percebemos é a necessidade e a obrigatoriedade de reposição, no mínimo, da inflação, por força, principalmente, da perda do poder aquisitivo”, disse. “De outro lado, no entanto, há inequivocamente um interesse político de alguns Estados. Então, é difícil separar esses dois aspectos, especialmente quando se trata de ano eleitoral.”
O especialista destaca, no entanto, que alguns setores da administração pública, seja ela municipal, estadual ou federal, passam por um processo de desvalorização financeira histórico. Ele cita, por exemplo, os diversos cargos nas áreas da Educação, Segurança Púbica e Saúde. “Esta, especificamente, tem, muitas vezes, remunerações absolutamente sucateadas.”
No levantamento feito pelo Estadão, os governos tendem a priorizar projetos que oferecem aumento ou recomposição salarial especialmente para professores e agentes das forças de segurança, como policiais militares.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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