(FOLHAPRESS) – A Meta recebeu pagamentos para impulsionar a divulgação de anúncios fraudulentos que mencionavam a falsa “taxação do Pix” e o sistema Valores a Receber, do Banco Central, mostra estudo da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).

 

As publicações tiveram seu alcance ampliado pela ferramenta de anúncios do conglomerado de redes sociais, que controla Facebook, Instagram, Threads e WhatsApp. O conteúdo citava políticas públicas e se apropriou de imagens do governo e de empresas públicas, como a Caixa, para obter informações sensíveis e dinheiro de vítimas, em meio à onda de desinformação levantada por um vídeo falso feito por inteligência artificial do ministro Fernando Haddad (Fazenda) afirmando que taxaria o Pix.

O estopim da crise de imagem do governo foi um vídeo, visualizado mais de 300 milhões de vezes, do deputado Nikolas Ferreira comentando uma norma da Receita Federal para fiscalizar transações via Pix acima de R$ 5.000 em fintechs. Ferreira também teve sua identidade usada na aplicação de golpes virtuais, em conteúdos gerados por IA.

Foram 1.770 anúncios fraudulentos impulsionados em Facebook, Instagram, Threads e Whatsapp, entre os dias 10 e 21 de janeiro, segundo nota técnica do NetLab. “É possível que os estelionatários tenham se aproveitado de medo, dúvida e desconfiança causada na população devido à enxurrada de desinformação para atrair vítimas a clicarem em seus anúncios”, afirma a professora da UFRJ Marie Santini, que coordenou o estudo.

Em nota, a Meta afirma que não permite “atividades que tenham como objetivo enganar, fraudar ou explorar terceiros”. “Estamos sempre aprimorando a nossa tecnologia para combater atividades suspeitas”, acrescenta.

O conglomerado não respondeu qual o destino do dinheiro recebido pelos anúncios fraudulentos.

A Meta permite que usuários paguem a partir de US$ 5 por semana para impulsionar seus posts, como foi visto no caso dos anúncios fraudulentos. Quanto mais o usuário pagar, mais pessoas visualizarão a peça golpista. Parlamentares de oposição, por exemplo, gastaram R$ 18 mil em anúncios contra o monitoramento do Pix, mostrou a BBC.

A empresa tampouco colabora com bancos e o governo brasileiros, para localizar as contas, pessoas e empresas envolvidas em fraudes. A big tech tem um programa piloto no Reino Unido de compartilhamento de dados com instituições financeiras para o combate de crimes, iniciado após bancos britânicos pressionarem o gigante das redes com boicotes e críticas públicas.

Os anúncios fraudulentos identificados pelo NetLab atraíam as pessoas com ameaças de multas ou com promessas de benefícios. Páginas que usavam a identidade visual do Governo Federal sem permissão, o que configura crime de acordo com o Código Penal, fizeram 40,5% das propaganda fraudulenta.

Nos anúncios, os criminosos citaram outras marcas ou instituições. Também usaram imagens de famosos, como Nikolas Ferreira, Eduardo Bolsonaro (PL-SP), o presidente Lula (PT) e o jornalista William Bonner.

Essas pessoas tinham a imagem associada a formulários que pediam transferências via Pix e dados sensíveis como o CPF -essa informação pode basear futuras tentativas de estelionato via email, WhatsApp ou telefone.

Cerca de 70% dos vídeos foram manipulados com inteligência artificial, conforme o levantamento do NetLab, e não indicavam origem sintética, como exige as regras da Meta. Também não apareciam como propaganda política, apesar de usar imagens de políticos eleitos e tratarem de políticas públicas -os anúncios sob essa categoria precisam exibir dados de alcance e ser armazenados por mais tempo, para estarem de acordo com as normas eleitorais brasileiras.

Ainda segundo o relatório, os estelionatários usaram ferramentas de segmentação para priorizar os perfis mais suscetíveis, atrapalhando a comunicação governamental oficial no esclarecimento sobre as normas de políticas públicas de inclusão financeira.

O estudo mostra que o número de anúncios fraudulentos cresceu, após o governo revogar a instrução normativa da receita e intensificar a divulgação de material sobre o Pix para reverter a crise de imagem.

Em nota, a Secom afirma que atua constantemente na identificação de perfis fraudulentos para, conforme a especificidade de cada caso, encaminhá-los à atuação judicial via Advocacia-Geral da União ou Polícia Federal.

Em audiências públicas, advogados e entidades ligados às big techs argumentam que as plataformas não podem ser responsabilizadas pelos crimes cometidos pelos anunciantes. Segundo o artigo 19 do Marco Civil da Internet, as empresas passam a ser responsáveis legalmente pelo conteúdos dos posts se desobedecerem ordem judicial de remoção.

Por outro lado, existe um debate recente nos tribunais sobre se, ao auferir receitas para impulsionar um anúncio, a plataforma realizaria uma curadoria para ampliar seu alcance. “Quem responde que sim alega ser plausível a aplicação do Código de Defesa do Consumidor (CDC) na hipótese, que responsabiliza objetivamente fornecedores de serviços”, diz a professora de direito da Uerj Chiara Teffe.

Na avaliação de Santini, as plataformas violam as próprias regras ao falhar na proteção da comunidade.

A Meta recomenda que “as pessoas denunciem quaisquer conteúdos que acreditem ir contra as diretrizes da comunidade de suas plataformas ou os padrões de publicidade da empresa”.
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SOFRI UM GOLPE. O QUE FAZER?

– Documente a interação com o golpista com prints, gravações de voz e tela, além de endereços e datas
– Procure o banco para pedir o estorno. Quanto mais bem documentada estiver a descrição do caso, maiores as chances de devolução do dinheiro
– Registre boletim de ocorrência na delegacia virtual da Polícia Civil do seu estado

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