SÃO PAULO, SP, BELHO HORIZONTE, MG (FOLHAPRESS) – Neste último ano pandêmico, uma premiação se manteve de cabeça erguida. Enquanto Emmy, Oscar, Grammy e Globo de Ouro mudaram completamente seus planos e recorreram a edições meio capengas, o Pinto Awards permaneceu firme e forte.
A premiação que elege as melhores fotos e vídeos de pênis no Twitter saiu ilesa do caos e, ao mesmo tempo, fez uma campanha de conscientização sobre o isolamento.
Sua quinta edição, ocorrida há quase um ano, chegou até a incluir categorias que defendem recomendações da OMS, a Organização Mundial da Saúde, como a de melhor pinto de máscara.
Melhor pinto veiudo, melhor pinto pingando, melhor pinto cabisbaixo, melhor pinto com representatividade e muitas outras categorias são a razão pelo sucesso do prêmio, que embora não dê nenhum troféu aos donos dos pênis mais bem votados pelos tuiteiros, tem muitos participantes.
As inscrições, que ocorrem com assinaturas de consenso e documentos que comprovem maioridade, sempre são anunciadas de maneira relâmpago. Nunca dá para saber quando é a próxima edição.
Agora, prestes a completar um ano de seu último evento, o Pinto Awards pode acontecer a qualquer momento e, desta vez, acompanhado dos mais variados sentimentos gerados pelos muitos meses de isolamento.
Diana Spechler, colunista do New York Times, afirma que o nude se tornou, na pandemia, além de arte, uma “recusa a deixar que o distanciamento social nos tornasse assexuais”, quase um ato político.
“Há uma virtualização maior das relações [na pandemia]. As pessoas usaram e usam muito mais de recursos e aplicativos para encontros, para conhecer, conversar”, diz a psicóloga Fernanda Nicaretta, que estudou as dinâmicas do nude na internet.
Segundo ela, “não há repressão quanto à produção do nu”, desde que ele seja produzido dentro de um contexto bem específico. O problema é quando essa foto ou vídeo vai parar em destinatários não desejados. Não é para menos, já que “historicamente há uma repressão e construção de pudores em torno do corpo”.
Daí um importante paradoxo do nude -é um libertido repleto de pudor. Não é por acaso que uma das principais regras tácitas da selfie safada é não mostrar o rosto.
A universitária Barbara Teisseire, de 22 anos, tem o hábito de tirar fotos seminua para seduzir pessoas e, principalmente, agradar a si mesma.
“Não é só a autoestima de se sentir gostosa, é muito mais do que isso”, explica ela, que usa um tripé para se fotografar e, assim, melhorar o ângulo e a iluminação das imagens.
Faz tempo, no entanto, que ela não sente vontade de trocar nudes. A pandemia fez ela perder confiança no próprio corpo e se sentir abalada emocionalmente. Ter engordado e passado a ficar isolada em casa foram os motivos de ela não se sentir desejada.
“Eu comecei a me sentir feia, desajeitada e a última coisa que quero é me ver sem roupa”, diz ela.
Segundo a psicóloga Fernanda Nicaretta, botar o corpo nu pra circular através de dispositivos como o smartphone traz uma série de discursos sobre o que é um corpo que deve ou não ser exposto ao público, quem pode e quem não pode mandar um nude.
A democratização dos smartphones fez com que mais tipos de corpos circulassem na internet. Mas nem por isso os padrões de beleza e proporção mudaram.
Com isso, vem mais um paradoxo. A maior variedade de corpos exibidos vem também com um uso massivo de filtros e outras modificações gráficas -os corpos de pessoas reais nem sempre são tão reais assim.
Afinar o rosto, camuflar marcas, melhorar o bronzeado -se usado em excesso, pode beirar o patológico, diz a psicóloga. Ao mesmo tempo, os filtros podem ser usados como humor. Para Nicaretta, essa pode ser uma forma saudável de contestar padrões, só que com leveza.
“Eu não faço nudes, faço ensaios de nu artístico”, garante Daniel Kripka, modelo e ator de 24 anos.
Ele posta fotos sem roupa no OnlyFans, plataforma famosa pelo conteúdo adulto pago que tem ganhado aderência entre celebridades.
“Meu propósito não é ser pornô, quero só ganhar um pouco mais [de dinheiro] com os ensaios que já faço”, diz o ruivo barbudo Kripka.
A maioria dos usuários do OnlyFans, no entanto, não está interessada em nu artístico e quer conteúdos explicitamente eróticos, segundo Kripka. “Quem faz sextape tem muito mais assinantes do que quem faz nu artístico”, diz o modelo. “Até coloquei um preço mais baixo para me ajudar.”
“O nu que tomou esse nome de ‘nu artístico’ como uma categoria de arte está na história da arte desde o início. O primeiro povo que fez um trabalho significativo foram os gregos, que criaram um padrão -durante séculos e séculos se seguiu os padrões gregos”, diz a crítica de arte Denise Mattar.
Na arte contemporânea, o nu é representado muito mais sob a ótica da crítica e da contestação do que como uma busca pura do belo e proporcional.
Mas esses padrões clássicos migraram para a publicidade, lembra Mattar. E diferente do mundinho da arte, a propaganda chega aos olhos de todo mundo -e portanto tem um potencial de influenciar pessoas muito maior.
Logo, os padrões de beleza continuam, ainda que atualizados para a nossa época, latitude e capitalismo tardio. Daí surgem fenômenos como Anitta, por exemplo, uma vênus bronzeada que rebola e que é, acima de tudo, lucrativa. A mesma funkeira que aparece na capa da Forbes também publica vídeos em que tem sua tatuagem anal retocada, no OnlyFans, claro.
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