MANAUS, AM (FOLHAPRESS) – O aumento acelerado de hospitalizações nas duas últimas semanas levou os hospitais particulares de Manaus ao esgotamento de leitos exclusivos para Covid-19 e aumentou ainda mais a pressão sobre a rede pública, agravando o cenário de caos dentro dos hospitais públicos da capital do Amazonas.
Nos últimos 14 dias, o número de internações por Covid-19 nos hospitais da rede privada em Manaus aumentou 163%, fazendo com que 100% dos leitos fossem ocupados. No mesmo período, a demanda cresceu 94% na rede pública, em parte impulsionada pelos pacientes da rede particular que não conseguiram atendimento.
“A rede privada de hospitais está com 100% de lotação. Todas as unidades privadas estão com seus leitos clínicos e de UTI ocupados. Isso provoca uma pressão adicional sobre o sistema público, uma vez que esses pacientes que não têm acesso em hospitais particulares vão para os públicos”, explica Rosemary Pinto, diretora-presidente da FVS-AM (Fundação de Vigilância Sanitária do Amazonas).
De 21 de dezembro a 3 de janeiro foram 1.172 novas hospitalizações de pacientes com Covid-19 em Manaus, segundo o último boletim epidemiológico da FVS-AM, de domingo (3).
A taxa de ocupação dos leitos de terapia intensiva na rede pública chegou a 92% nesta segunda (4).
O aumento do número de pacientes com Covid-19 resultou em um cenário de superlotação, falta de leitos, macas nos corredores, falta de distanciamento dentro das unidades, área de descanso de profissionais de saúde indo parar dentro do banheiro e o refeitório, para dentro da enfermaria, ao lado dos pacientes internados e sem nenhuma segurança sanitária.
Esses são apenas algumas das cenas gravadas e relatadas por pacientes e profissionais de saúde que atuam nos principais hospitais públicos de Manaus referência para a doença e que estão recebendo a demanda da rede privada.
No HPS (Hospital e Pronto Socorro) Platão Araújo, na zona leste, onde profissionais de saúde divulgaram um vídeo no domingo (3) denunciando as condições inadequadas de descanso e alimentação, uma enfermeira contou que o cenário atual é ainda pior que o da primeira onda, em maio.
“Tem momentos que é desesperador. Estamos virando dia e noite pra tentar dar conta, mas é muita gente chegando de todos os lugares: de casa, dos SPAs, de outros hospitais públicos e agora também dos particulares, que não estão recebendo mais ninguém.”
No HPS 28 de Agosto, outra unidade de referência para a Covid-19 que não suspendeu as cirurgias eletivas, a atendente Andreia Barros, 46, usou as redes sociais para denunciar a superlotação da unidade e o medo de que a mãe, internada para uma cirurgia em uma maca no corredor, ao lado de uma máquina de ponto eletrônico, fosse contaminada.
“Um monte de gente doente, aglomeração na fila e minha mãe, de idade, correndo o risco de ser contaminada. Tiraram eles da sala para jogar nesse corredor”, reclamou Andreia.
Do lado de fora da unidade, motoristas do Samu afirmam que não conseguem atender a demanda por transferências. Não por falta de veículos, mas de leitos nas unidades de saúde.
“Já está acontecendo o que acontecia no pico da pandemia, em abril e maio, quando a gente tinha que ficar rodando de hospital em hospital com o paciente na ambulância em busca de vaga. Algumas unidades já não têm nenhum leito disponível, e enquanto não acharmos uma unidade que receba o paciente, a ambulância fica ‘presa’ para novas remoções”, explicou.
O médico intensivista Paulo Eugênio Tavares, que é coordenador da UTI para Covid do hospital particular Rio Negro, conta que, nas últimas semanas, o hospital aumentou em 300% o número de leitos para o coronavírus, mas que a demanda continua crescendo.
“Estamos vendo cenários caóticos iguais ao do primeiro pico da pandemia. É algo realmente muito preocupante porque a saúde do estado do Amazonas já está colapsada. Não há mais leitos de internação nem nos hospitais privados nem nos hospitais públicos. Os hospitais estão, todos eles, sobrecarregados, as equipes estão cansadas. É muito angustiante ver esse cenário se repetir.”
A superlotação dos hospitais de Manaus já está obrigando médicos a solicitarem transferência de pacientes até para hospitais de outros estados. É o caso de três militares que pediram transferência para o HFA (Hospital das Forças Armadas), em Brasília, contou a médica Bianca Rocha, que trabalha na unidade.
“São pacientes jovens, sem comorbidades, mas estão no corredor do pronto socorro, entubados”, desabafa a profissional de saúde.
A SES-AM (Secretaria de Saúde do Amazonas) informou que uma vistoria foi realizada na manhã desta segunda (4) no HPS Platão Araújo para adequar condições de higiene, fluxo de atendimentos e espaços destinados aos profissionais de saúde, para que eles realizem as refeições dentro dos protocolos de biossegurança.
Sobre o HPS 28 de Agosto, a secretaria informou que os pacientes estavam no corredor apenas durante a reorganização dos espaços para abertura de novos leitos e que já foram reordenados.
A secretaria informou ainda que “não tem medido esforços para a ampliação de leitos” e que, nos últimos dez dias, foram abertos 400 novos leitos para Covid-19, 90 deles de UTI.
De acordo com a diretora-presidente da FVS-AM, o número de casos novos de Covid-19 aumentou 120% em Manaus nos meses de novembro e dezembro, enquanto a média móvel de óbitos aumentou 66% nos últimos 14 dias.
Os números colocaram Manaus na classificação de risco “muito alto” de contaminação, com a bandeira roxa. A situação levou o governo do estado a reeditar o decreto que retoma a suspensão de atividades não essenciais.
O decreto, que havia sido revogado ainda no fim de dezembro, atende a uma decisão judicial do Tribunal de Justiça do Amazonas do último sábado (2), que determinou a suspensão das atividades não essenciais em Manaus pelo período de 15 dias.
As ruas do centro comercial de Manaus foram fechadas com gradis e tiveram o policiamento reforçado para evitar que o comércio não essencial abrisse e provocasse aglomerações. No entanto, boa parte dos lojistas burlou a fiscalização.
A Prefeitura de Manaus anunciou a prorrogação do fechamento da praia da Ponta Negra até 31 de janeiro. Principal balneário público de Manaus e palco de aglomerações em plena pandemia, a praia está fechada desde setembro.
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