A Justiça de São Paulo decretou a falência da rede de livrarias Saraiva. O pedido foi feito pela própria empresa, que já teve a maior rede de livrarias do país, em meio ao processo de recuperação judicial, por causa de uma dívida de R$ 675 milhões.
A Saraiva decretou autofalência, e foi atendida nesta sexta-feira, 6, pela 2ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais da Capital.
Na decisão, o juiz Paulo Furtado de Oliveira Filho indicou que foi descumprido o plano de recuperação judicial e determinou a suspensão de ações e execuções contra a empresa, além da apresentação da relação de credores.
“Embora formulado o pedido de autofalência, com a alegada presentação de documentos exigidos pelo artigo 105, da Lei 11.101/2005 e o cumprimento dos demais requisitos legais, nos autos já há notícia de descumprimento do plano, o que determina, independentemente da vontade das devedoras, por força do artigo 73, IV, a convolação da recuperação em falência”, decidiu o juiz.
Fechamento das últimas lojas em novembro
A Livraria Saraiva já havia fechado as últimas lojas demitido seus funcionários no dia 20 de novembro. A rede, que já foi a maior do Brasil, com cerca de 100 livrarias, está em recuperação judicial e ainda tinha cinco livrarias físicas. Eram quatro lojas no estado de São Paulo – na Praça da Sé, a segunda inaugurada pela empresa, ainda nos anos 1970, e também no Shopping Aricanduva, no Jundiaí Shopping e no Novo Shopping (Ribeirão Preto) – e uma em Campo Grande (MS), no Shopping Boque dos Ipês.
Em 2018, a Saraiva fez seu primeiro movimento de fechamento de lojas. Foram 20 num mesmo dia, em outubro. Naquela ocasião, a rede ficou com 84 unidades e com o site. Um mês depois, ela entrou com pedido de recuperação judicial. A dívida revelada naquele momento era de R$ 674 milhões (veja aqui quais eram as 30 editoras para quem a Saraiva devia mais dinheiro). Ao longo dos últimos anos, sem conseguir se reerguer, a Saraiva foi fechando mais lojas.
A história da Saraiva remete a 1914, quando o imigrante português Joaquim Ignácio da Fonseca Saraiva abriu uma pequena livraria de livros usados no Largo do Ouvidor, em São Paulo, perto da Faculdade de Direito do Largo São Francisco.
Era a Livraria Acadêmica, que acabou se especializando em obras jurídicas. Ainda naquela década, ele editou um primeiro livro, Casamento Civil. Pelos 30 anos seguintes, a livraria seguiu com foco no direito, mas a editora passou a lançar também didáticos e obras gerais.
Em 1947, a empresa se transformou em sociedade anônima e passou a se chamar Saraiva S.A. – Livreiros Editores. Em 1972, a Saraiva virou uma companhia aberta.
Nos anos 1970, foi inaugurada a segunda livraria da empresa, na Praça da Sé – que resistiu até este último momento. Nos anos 1980, ela investiu em distribuição de livros e em 1983 iniciou o processo de expansão de sua rede de livrarias, com aberturas especialmente em shoppings. Vieram as primeiras megastores e, em 1998, ela inaugurou seu e-commerce.
Ao longo de sua história, ela comprou a Editora Atual, no fim dos anos 1990, e o Pigmento Editorial S.A., responsável pela comercialização do Ético Sistema de Ensino, em 2007.
O crescimento mais expressivo em número de livrarias ocorreu a partir da aquisição de 100% do controle acionário do Grupo Siciliano, em 2008. Foi quando a rede passou a ter mais de 100 lojas espalhadas pelo Brasil.
Com a chegada da Siciliano, vieram também os selos Arx e Caramelo. Dois anos depois, a empresa lançou o sistema de ensino Agora, para a educação pública, e criou o selo Benvirá, para obras de ficção.
A Saraiva entrou no mercado de e-books em 2010, com o lançamento de uma plataforma para venda de livro digital. Depois, em 2014, ela criaria a LEV, seu e-reader. Ainda em 2010, ela comemorou o fato de a LG ter criado uma linha de produtos com opção de acesso à internet que levava o usuário à plataforma de comercialização de filmes digitais da Saraiva. E ela inaugurou ainda a primeira loja iTown – exclusiva para venda de produtos da Apple.
Em 2012, ela lançou o selo SaraivaTec e, com a Hoper Educação, o Saraiva Solução de Aprendizagem, para ensino de Direito e Administração de Empresas. No ano seguinte, entrou no mercado de autopublicação, com a plataforma Publique-se!.
A Saraiva compraria ainda a editora Érica, para entrar no mercado de ensino técnico profissionalizante. Também em 2013, ela abriu sua primeira loja em aeroporto – em Cumbica.
Em 2015, a Saraiva vendeu todos os seus ativos editoriais e ficou apenas no varejo de livros. Naquele ano, o mercado editorial já dava indícios de que caminhava para uma recessão.
Os dois anos seguintes foram de ajustes operacionais. A empresa diminuiu. Em 2018, como consequência da crise macroeconômica, da crise do mercado editorial, mas, sobretudo, de suas escolhas próprias, a Saraiva começou a enfrentar problemas.
Foi quando ela iniciou o fechamento de suas lojas e tirou o foco da venda de eletrônicos. Em 2018, ela fechou 22 lojas e, seguindo os passos da Livraria Cultura, pediu recuperação judicial. Veio a pandemia. Em 2021, ela entrou com o pedido do 1°Aditivo ao Plano de Recuperação Judicial, homologado em março, e depois com o segundo pedido, homologado em abril de 2022.
Em julho, ela fechou mais sete lojas: Shopping Osasco (SP), Shopping Vila Velha (ES), Shopping Belém (PA), Shopping ABC Plaza (SP), Shopping Norte (RJ), Shopping Juiz de Fora (MG) e Shopping Passeio das Águas (GO).
Com a notícia da demissão dos funcionários e fechamento das últimas cinco lojas físicas da Saraiva, uma parte importante da história desta que já foi a principal rede de livrarias do Brasil se encerrou. A ver se a trajetória iniciada em 1914, com aquela primeira livraria especializada, ganha uma sobrevida online.