Jovem cadeirante de 19 anos é aprovada em medicina na UFJF: ‘Muitos diziam pra eu desistir’

“Muitos me diziam para eu desistir de fazer medicina […] Mas o meu maior sonho é me formar e me tornar uma grande médica, para ajudar aqueles que precisam“, resume a estudante Ana Paula de Souza, 19, que foi aprovada em Medicina na Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF).

Ana nasceu em Visconde do Rio Branco, no sudeste mineiro, e tem deficiência física motora dos membros inferiores, devido a um quadro de paralisia cerebral.

A estudante conta que o caminho até a aprovação foi desafiador, uma vez que a família é muito humilde e não tinha condições de pagar um cursinho pré-vestibular. Ana sempre estudou na rede pública e se virou como podia para se preparar rumo ao ensino superior.

“Como não tinha condições de pagar um cursinho, comecei a estudar em casa, com livros que eu já tinha, que eram bem poucos. Às vezes, eu achava alguns no lixo e aproveitava o que dava. Minha amiga Fernanda, que teve a oportunidade de fazer cursinho também me ajudou muito. Ela me passava algumas coisas e foi uma das únicas pessoas que, de fato, me ajudaram”, relembrou.

A jovem quase desistiu de fazer a prova do Pism ainda no primeiro ano porque não tinha condições de ir para Juiz de Fora fazer a prova.

“Estudar foi algo muito difícil pra mim. Muitas escolas não me aceitavam porque tinham medo de eu atrasar os outros alunos, mas a minha mãe sempre correu atrás e conseguiu fazer minha matrícula em uma escola aqui de Visconde do Rio Branco. Quando eu fui fazer o Pism, eu quase não consegui ir, mas a Prefeitura disponibilizou um carro pra mim e os próximos anos de prova foram mais tranquilos quanto ao transporte”.

Representatividade importa, sim

Ana Paula afirma que ser médica é um sonho que paira sobre sua mente desde que ela era pequenininha.

“Eu faço tratamento em um hospital de Belo Horizonte e sempre convivi com muitos médicos e pensei que talvez isso daria para mim, só que nunca havia visto um médico com alguma deficiência”, explicou.

Esse sonho foi impulsionado quando Ana viu um profissional cadeirante no estacionamento do hospital. Segundo ela, inicialmente pensou que fosse um paciente, mas depois descobriu que ele era médico.

“Achava que, pelo fato de ser cadeirante, me formar médica era algo muito distante da minha realidade, até conhecê-lo. Infelizmente não tive a chance de me consultar com ele, mas ali eu tive certeza que eu também poderia tentar”, completou.

Ela garantiu que “não medirá esforços” para ser uma médica exemplar e uma referência para seus pacientes que, assim como ela, possam ser desestimulados quanto ao próprio potencial.

“Muitos me diziam para eu desistir de fazer medicina porque era muito concorrido e só passava quem fizesse cursinho. Falavam pra eu tentar um curso mais leve, mas eu persisti e consegui alcançar meu objetivo. O meu maior sonho é me formar e me tornar uma grande médica, para ajudar aqueles que precisam”, afirmou.

Ingresso na faculdade

Ana Paula iniciará o curso de Medicina em 2022, agora que foi oficialmente aprovada via Programa de Ingresso Seletivo Misto, da Universidade Federal de Juiz de Fora.

“Estudar Medicina em uma universidade pública significa muito para minha família e meus pais estão muito orgulhosos. Quando vi meu nome na lista de aprovados, foi um momento muito gratificante”, afirmou.

Ela deve se mudar para Juiz de Fora até o início do próximo ano. Por enquanto, conversa com a equipe de assistência social da UFJF para saber quais auxílios poderá receber.

“Um alojamento estudantil acredito que ficaria complicado para mim, porque eu iria precisar da ajuda da minha mãe para algumas atividades. Estamos pensando na possibilidade de alugar um apartamento em Juiz de Fora, ou eu morar com alguém”, explicou.

Para a UFJF, a aprovação de Ana Paula é simbólica e de grande importância para garantir o acesso à educação e a permanência no ensino superior para esse grupo. “Ela [Ana Paula] conta com apoio tanto institucional, quanto da comunidade acadêmica para cursar a faculdade com a assistência necessária”, citou a universidade em nota.

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Fonte: Deficiente Ciente
Fotos: Ana Paula / Arquivo pessoal

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