WASHINGTON, EUA (FOLHAPRESS) – Após a aprovação do pacote de alívio econômico em meio à pandemia, Joe Biden reorientou esforços para a próxima prioridade legislativa de seu governo: mudanças na infraestrutura dos EUA como forma de pavimentar a sua agenda ambiental.
O democrata promete criar milhões de empregos com um plano trilionário para reformar pontes, estradas, aeroportos e ampliar a rede de banda larga no país, ao mesmo tempo em que tenta cumprir suas ambições para promover energia limpa e equidade racial entre os americanos.
Durante a campanha, Biden apresentou uma proposta no valor de US$ 2 trilhões (R$ 11 trilhões) que seriam destinados à infraestrutura, com a criação de empregos e meios para cumprir a meta de eliminar emissões de carbono do setor elétrico do país até 2035.
Além das reformas em transporte e saneamento, o presidente quer reposicionar a indústria automobilística, com o aumento do número de estações de carregamento de carros elétricos, e pretende expandir as redes de habitação e transporte público sustentáveis, tornando-as mais acessíveis à população.
Auxiliares dizem que o plano do democrata é, em quatro anos, construir uma rede de infraestrutura mais moderna e sustentável, baseada em energia limpa, para que os EUA possam competir globalmente e suportar os impactos das mudanças climáticas.
A infraestrutura americana está bastante defasada, principalmente nas áreas rurais e em regiões que foram mais atingidas pela crise sanitária que já matou mais de 540 mil pessoas e deixou mais de dez milhões de desempregados.
Dados divulgados pelo governo em 2019 mostram que 230 mil pontes precisavam de grandes reparos ou substituição completa nos EUA, o que significa 37% do total de construções desse tipo no país.
Segundo a Associação Americana de Construtores de Estradas e Transportes, que fez o levantamento junto ao governo, o montante necessário para os reparos chegava a US$ 164 bilhões (R$ 900 bi).
Outros estudos mostram que mais de 27 milhões de americanos são servidos por sistemas de água que violam os padrões de saúde estabelecidos por lei. Essas falhas são frequentes em áreas com população mais vulnerável, também vítimas de subinvestimento e subdesenvolvimento.
No fim de fevereiro, a Sociedade Americana de Engenheiros Civis classificou com nota “C menos” a rede de infraestrutura do país, e disse que ao menos US$ 5,9 trilhões (R$ 32,4 trilhões) deveriam ser investidos no setor ao longo da próxima década.
Um plano para transformar a infraestrutura geralmente conta com entusiasmo popular, porque gera emprego e movimenta a economia, mas Biden deve encontrar dificuldade para angariar apoio nos detalhes, que ainda não foram divulgados pela Casa Branca, sobre o tamanho do pacote e como ele será financiado.
A intenção era apresentar o projeto logo após a assinatura do pacote de alívio econômico, que aconteceu na semana passada, mas a falta de consenso entre republicanos e democratas deve fazer com que Biden calibre ou até divida as medidas -que também precisam do aval do Congresso.
Presidente do Comitê de Transporte e Infraestrutura da Câmara, o deputado democrata Peter DeFazio se reuniu com Biden há duas semanas e disse que o presidente queria agir “o mais rápido possível.”
“Biden quer que [o pacote de infraestrutura] seja muito grande e sente que essa é a chave para o plano de recuperação”, afirmou DeFazio.
Político moderado e de perfil conciliador, Biden insiste na ideia de conquistar apoio de parte dos republicanos para seu projeto, sob a tese de que reformar estradas e ampliar a rede de banda larga vai deixar o país mais competitivo, principalmente em relação à China, retórica que tem apelo no partido de Donald Trump.
“Vamos garantir que mais uma vez lideremos o mundo em termos de infraestrutura”, tem repetido Biden. “Isso não só cria empregos, mas nos torna muito mais competitivos em todo o mundo”, afirma.
O democrata acredita que a infraestrutura pode ser a ponte para reconstruir relações com alguns membros da oposição, que não deu um único voto para a aprovação do pacote de alívio econômico -o partido de Biden, porém, tem maioria na Câmara e no Senado e, por isso, conseguiu dar aval ao plano.
Auxiliares da Casa Branca, no entanto, reconhecem que o tamanho do foco nas mudanças climáticas e na agenda ambiental pode ser um entrave político, e que Biden vai ter que decidir até que ponto poderá ir com suas ambições sobre energia limpa para ganhar apoio de republicanos.
DeFazio, por sua vez, já sugeriu que o presidente deve apresentar um pacote ambicioso, sem perder de vista as bases para uma infraestrutura mais sustentável, e que o Congresso pode aprovar o plano por meio de um mecanismo especial conhecido como “conciliação”. O arranjo, utilizado para avançar com o socorro econômico, exige apenas maioria simples dos 100 senadores para medidas que envolvem orçamento, por exemplo, e impede que opositores obstruam a votação.
Para a aprovação de projetos como esses, geralmente são necessário 60 dos 100 senadores, o que significa conquistar ao menos 10 republicanos, que tradicionalmente não costumam apoiar ideias sobre energias renováveis ou mitigação de desigualdades.
Correligionários de Trump já começam a questionar a forma como Biden pretende pagar pelo plano. Durante a campanha eleitoral, o democrata disse que poderia financiá-lo combinando parcerias público-privadas com o aumento de impostos sobre as empresas e sobre os mais ricos, ao que a oposição diz ser terminantemente contra.
Parte do Partido Democrata teme que as desavenças levem à repetição dos fracassos nessa área sofridos pelo governo Barack Obama, de quem Biden era vice. O ex-presidente não conseguiu aprovar uma reforma robusta na infraestrutura do país -o que também não passou nem perto da política de Trump. No caso de Obama, porém, os republicanos eram maioria na Câmara e travavam grande parte das iniciativas de seu governo.
Analistas acreditam que uma das formas de Biden fazer avançar sua agenda é dividir o pacote em vários projetos diferentes, para tentar conquistar apoio bipartidário a conta-gotas, sobre reforma de estradas e ampliação de banda larga, em um primeiro momento, por exemplo.
O temor da ala mais à esquerda do Partido Democrata é que, caso a opção seja essa, medidas mais significativas de energia limpa podem acabar perdendo tração e talvez não sejam contempladas.
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