O Ibovespa caminha para terminar janeiro com queda em torno de 4,00%, o que seria o pior desempenho para o mês desde 2016, quando perdeu 6,79%. Naquela ocasião, o índice refletiu cautela diante da pressão política pela queda da Selic, além de incertezas com a China. Já neste mês a deterioração decorre, principalmente, das dúvidas sobre o início do ciclo de redução dos juros nos Estados Unidos.
A perda na B3 em janeiro é acompanhada das de pares emergentes. Neste mês até o momento, as bolsas de México e Chile acumulam baixas de cerca de 3,5%, ambas. As bolsas de Nova York, no entanto, sustentam ganhos, com foco na desinflação americana, que deve garantir um corte de juros ao longo do ano, e na percepção de um pouso suave da economia do país. Há ainda um otimismo com o setor de tecnologia.
“A queda dos ativos de risco não foi exclusiva do Brasil. Economias emergentes sofrem um pouco mais com a reprecificação da expectativa sobre juros dos EUA, que é o fator principal para a retirada do fluxo externo em janeiro e, consequentemente, baixa do Ibovespa”, afirma Rafael Passos, sócio e analista da Ajax Asset. Segundo ele, o investidor estrangeiro corresponde a aproximadamente 50% do volume de negociação da Bolsa local.
A reprecificação para os juros americanos ocorreu após dados econômicos mais firmes, a exemplo do payroll, do CPI e das vendas do varejo, além de pronunciamentos mais hawkish de autoridades do Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano). O capital externo estava positivo até 16 de janeiro, mas inverteu o sinal e o último dado disponível, 22 de janeiro, mostra que o estrangeiro retirou R$ 4,953 bilhões no acumulado do mês, resultado de compras de R$ 186,443 bilhões e vendas de R$ 191,396 bilhões.
“Boa parte do humor global com ativos de risco, especialmente de mercados emergentes – que são mais voláteis – diz respeito a o quão veloz vai ser a queda na curva de juros americanas. Se estiver mais volátil, como em janeiro, o mercado tende a ficar mais nervoso para aportar em emergentes”, afirma Lucas Monteiro, trader de Multimercados da Quantitas. “O dado sugere que janeiro é uma correção normal da alta expressiva dos dois meses anteriores, porque o Brasil, em relação a outros emergentes, segue muito bem posicionado”, pondera.
Fernando Ferrer, analista da Empiricus Research, também vê com naturalidade o movimento recente do Índice Bovespa, após ganhos acumulados em 2023, sobretudo na reta final do ano. “Fechou com alta de quase 23%, 19% praticamente dos dois últimos meses”, diz. Agora, a volatilidade preocupa, pois afasta o investidor, principalmente o estrangeiro. “O volume financeiro baixo [no início do ano] não ajuda”, comenta.
Para a economista-chefe da CM Capital, Carla Argenta, a queda da Bolsa em janeiro não é ruim, mas uma correção. “O mercado está caindo em si. Houve um otimismo exacerbado nos dois últimos meses do ano passado. Não é mais o céu de brigadeiro que se projetou lá atrás”, diz.
Argenta pondera que o mercado doméstico sempre chama a atenção dos estrangeiros. “Há algumas características que saltam aos olhos do gringo, como o tamanho do mercado, os juros brasileiros, o mercado de títulos. E há uma visão de que o País está em uma situação relativamente positiva em termos de evolução da atividade, das reformas estruturais. São componentes que fazem com que o Brasil seja um grande receptor.”
Se os últimos dados dos EUA tivessem sustentado expectativas de redução dos juros já em março, o Ibovespa estaria com bom desempenho, por isso, o comportamento dependerá dos próximos indicadores, segundo Max Bohm, estrategista de ações da Nomos. “Caso o payroll de fevereiro mostre geração de empregos acima do esperado, descarta a possibilidade de queda em março e a precificação de corte começa a ir mais para maio ou segundo semestre. Acredito que será no segundo semestre. Março está descartado”, afirma.
Para Bohm, a falta de indicação clara sobre a política monetária dos EUA deve continuar a pesar no fluxo externo para a B3. “Isso mexe com o Ibovespa, que pode ficar acomodado entre os 125 mil e os 130 mil pontos. Só vai se movimentar mesmo se os estrangeiros entrarem. São eles que fazem a Bolsa andar.”
Em relação à questão fiscal do Brasil, tema de grande atenção dos investidores, o sócio e analista da Ajax Asset afirma que “os ruídos não ajudam a compensar o exterior um pouco mais negativo, mas o fator mais forte para a retirada de recurso estrangeiro da Bolsa brasileira ainda é o aumento da taxa dos Treasuries”.
“O Ibovespa não tem trabalhado tanto em cima de noticias domésticas, mas muito mais àquelas relacionadas aos EUA, principalmente no que se refere aos juros dos Treasuries”, reforça o estrategista de ações da Nomos.
Na segunda-feira, porém, incertezas geradas pelo lançamento da nova política industrial do governo baseada no BNDES penalizaram os negócios.
Leia Também: Oposição se mobiliza por PEC que dificulta buscas da PF no Congresso