Governo paga maior taxa de rendimento do ano em emissão de dívida

(FOLHAPRESS) – As incertezas em relação aos juros nos EUA e ao cumprimento das metas fiscais e de inflação no Brasil se refletiram nos leilões de títulos públicos realizados pelo Tesouro Vernáculo nesta terça-feira (15). Foram registradas as maiores taxas do ano para os três papéis indexados à inflação ofertados ao mercado.

 

O governo conseguiu vender integralmente os lotes com vencimento em prazos menores (2029 e 2035), mas unicamente 25% do título com vencimento em 2060. Também houve grande demanda por papéis indexados à taxa básica (Selic).

Com juros mais atrativos para os investidores, o valor totalidade da emissão dos títulos indexados à inflação ficou supra da média do ano. Ou seja, o governo captou mais recursos, mas com prazo menor de vencimento e pagando mais custoso.

Os números mostram também uma inversão da curva de juros, com as taxas de prazo mais limitado ficando mais altas que as de vencimentos mais distantes. O mais geral é o contrário, pois, quanto menor o prazo, menor o risco. O leilão teve rendimento real (descontada a inflação) de 6,69% ao ano para o título NTN-B 2029 e de 6,539% para a NTN-B 2060.

No início de setembro, o Tesouro Vernáculo já havia antecipado esse cenário ao fazer a revisão do seu Projecto Anual de Financiamento da dívida pública federalista, prevendo aumento na proporção de títulos indexados à Selic e redução na participação dos prefixados e corrigidos pela inflação.

Segundo a instituição, nos oito primeiros meses do ano, o gosto pelas LFTs, títulos corrigidos pela taxa básica, aumentou devido às incertezas sobre a política monetária nos EUA.

“Tais incertezas afetaram os mercados emergentes, pressionando as taxas de câmbio e aumentando a aversão ao risco. Esses fatores impactaram a curva de juros e a demanda pelos títulos do Tesouro Vernáculo, com investidores buscando ativos de menor risco”, informou na era a instituição, que disse estar atuando “com mais cautela”.

No mês pretérito, o Fed, banco médio dos Estados Unidos, começou a trinchar juros, com uma redução de 0,5 ponto percentual na taxa. A expectativa é a de que novos cortes sejam feitos em novembro e dezembro. Enquanto isso, no Brasil, o Copom (Comitê de Política Monetária) elevou a taxa básica de 10,5% para 10,75% ao ano, e iniciou novo ciclo de subida.

O Tesouro também disse que estava ampliando a emissão de títulos indexados à Selic e que isso contribui para manter um “colchão de liquidez” supra do nível prudencial, com um caixa superior a R$ 1 trilhão.

Daniel Xavier Francisco, economista do Banco ABC Brasil, afirma que não é verosímil falar em dificuldade para rolagem da dívida pública neste momento e que os leilões de LFT e NTN-B têm se encaixado na estratégia do Tesouro.

“Somente os fatores de ensejo de mercado têm atuado no sentido de mudar o perfil das emissões. São fatores de limitado prazo, pois os juros básicos tornaram a subir. Por isso, o Tesouro alterou os limites do PAF [Plano Anual de Financiamento] recentes, de modo a acomodar esta preferência dos investidores por pós-fixados.”

Victor Furtado, head de alocação da gestora W1 Capital, afirma que a expectativa de cortes de juros mais agressivos na economia dos EUA parece ter minguado, depois dados mais fortes de trabalho e de inflação, o que atrasa um aumento mais possante do diferencial de juros entre as duas economias.

Isso se soma a um cenário interno de dificuldade para os cumprimentos das metas fiscais e de inflação e um dólar muito valorizado frente ao real. O dólar disparou 1,41% nesta terça-feira e fechou cotado a R$ 5,660.

Furtado destaca a emissão de títulos supra da média do ano, diante de taxas mais elevadas, mas com uma demanda menor pelo título para 2060. “Mesmo com grandes rendimentos, o mercado não quer se encompridar tanto devido ao risco.”

Marcos Moreira, sócio da WMS Capital, afirma que a diferença entre as taxas dos títulos corrigidos pelo IPCA de prazos mais curtos e longos não justifica o risco de comprar um título com vencimento mais distante. Para ele, porquê o Banco Médio está subindo os juros, quanto mais rápida for essa subida, mais rápido a inflação deve desabar. “As expectativas de inflação devem voltar a ancorar [dentro da meta], e isso gera um consolação na ponta longa da curva de juros, fazendo com os esses prêmios se reduzam.”

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