TOULOUSE, FRANÇA (FOLHAPRESS) – O governo da França aprovou um decreto no último dia 7 de abril que estabelece uma taxa de três euros (R$ 16) para a entrega no país de livros encomendados pela internet, no capítulo final de uma guerra contra a dominação dos gigantes digitais no mercado livreiro francês.
A medida pretende apoiar livrarias locais, incentivando leitores a se deslocarem até a livraria mais próxima em vez de realizar a mesma compra em um par de cliques. A tarifa também quer promover uma concorrência menos desigual entre empresas francesas de menor porte e gigantes do varejo online, como Amazon e Fnac.
Beneficiadas por uma lei de 2014, as grandes empresas do comércio digital podem fazer entregas praticamente gratuitas, a 0,01 euro (R$ 0,05), enquanto livrarias independentes precisam arcar com o custo de cerca de seis euros (R$ 33) por remessa. Esse contexto, segundo o governo francês, promovia uma “competição distorcida” no setor.
A medida foi anunciada em setembro do ano passado, e prevê uma tarifa de três euros para entregas de compras de livros de até 35 euros (R$ 190). Encomendas online acima deste valor, no entanto, seguem a regra de 2014: 0,01 euro por entrega. A nova medida não se aplica a site de venda de livros de segunda mão.
Por seu ineditismo, a tarifa precisou da aprovação da Comissão Europeia para ser implementada, o que ocorreu em fevereiro. Assinado pela ministra da Cultura, Rima Abdul-Malak, e pelo ministro da Economia, Bruno Le Maire, na semana passada, o decreto entra em vigor só em 7 de outubro, mas já provocou reações.
A Amazon, líder do mercado, se opôs à medida. Em nota enviada ao site Actu.fr, o gigante varejista disse estar preocupado que o aumento tenha impacto significativo “na leitura e nos leitores, especialmente aqueles que vivem em áreas rurais e pequenas cidades”.
Segundo a companhia, 46% dos livros vendidos em sua plataforma são entregues em áreas sem livrarias e “uma taxa mínima de três euros aumentará o preço de um livro de bolso vendido por 7,50 euros (R$ 41) em 40%”. A nota afirma que os leitores franceses serão levados a desistir de algumas de suas compras de livros e, portanto, ler menos.
De acordo com uma pesquisa do Ifop (Instituto Francês de Opinião Pública) de 2021, 45% dos franceses que compram livros online o fazem por causa da distância dos pontos de venda físicos. Este número sobe para 81% nas áreas rurais.
Segundo o governo francês, existem 3.500 livrarias na França, ou cerca de uma livraria para cada 20 mil habitantes. Computadas lojas que também vendem livros, mas não exclusivamente eles, o que engloba supermercados e até comércios de beira de estrada, esse número sobe para cerca de 25 mil estabelecimentos.
Para efeito de comparação, estima-se que o Brasil tenha cerca de 2.200 livrarias, ou uma para cada 97 mil pessoas, em média.
Guillaume Husson, delegado-geral do Sindicado das Livrarias Francesas, afirma que todos os estudos mostram que a maioria dos compradores online são urbanos.
Para ele, a nova tarifa é um primeiro passo significativo. Isso porque, ao longo dos debates sobre essa nova política francesa, o sindicato do setor defendeu que a tarifa fosse de 4,50 euros (R$ 24), enquanto representantes do gigante francês Fnac recomendavam que a taxa ficasse limitada a dois euros (R$ 11).
Já a Amazon defendeu que a taxa postal fosse tão baixa quanto possível, de modo a limitar os efeitos inflacionários da medida.
Segundo o jornal econômico francês Les Echos, o Executivo federal justificou a escolha de um caminho do meio, levando em conta a inflação já alta na França e o medo de que uma taxa mais alta fosse rejeitada pelo Conselho de Estado por minar a liberdade do mercado à luz das restrições europeias.
O mercado de livros é considerado o maior setor da indústria cultural do país. O governo considera que a produção de títulos, por meio de quase quatro mil editoras, e a densidade da rede de livrarias independentes do país são fenômenos diretamente relacionados.
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