Um estudo coordenado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) em parceria com outras instituições de pesquisa constatou uma transmissão mais frequente da covid-19 de adultos para crianças do que de crianças para adultos, em um grupo de voluntários de uma comunidade do Rio de Janeiro.
Parte das conclusões foram divulgadas hoje (10) pela Agência Fiocruz de Notícias, mas o trabalho será publicado no artigo “A dinâmica da infecção de Sars-CoV-2 em crianças e contatos domiciliares em uma comunidade pobre do Rio de Janeiro”, na revista científica Pediatrics, Official Journal of the American Academy of Pediatrics.
O estudo foi realizado entre maio e setembro do ano passado e contou com um grupo de 667 participantes que viviam em 259 domicílios de uma comunidade pobre do Rio de Janeiro. Entre as pessoas observadas pelos pesquisadores, havia 323 crianças, 54 adolescentes e 290 adultos. Os autores destacam que os resultados referem-se ao local e período específico que foram estudados e também não consideram as novas variantes do SARS-CoV-2 que circulam no país.
Testes PCR e de sorologia (IgG) realizados detectaram que 45 crianças com menos de 14 anos foram infectadas pelo novo coronavírus (covid-19), sendo que 26 delas tiveram contato com um adulto também positivo e 19 com adultos sintomáticos que não consentiram em fazer o teste. A pesquisa observou também uma proporção maior de crianças com menos de um ano infectadas, em comparação com grupos pediátricos de outras idades.
O estudo revela que cerca de um terço do grupo pesquisado havia tido contato com o coronavírus em agosto, enquanto o percentual geral da cidade no mesmo período era de 7,5%.
A hipótese dos pesquisadores era de que, se a transmissão ocorre principalmente de adultos e adolescentes para crianças, eles teriam um pico de prevalência de anticorpos IgG antes das crianças, o que foi confirmado na análise.
“A menos que essas crianças fossem portadoras do Sars-CoV-2 por um longo período, nossos resultados são compatíveis com a hipótese de que elas se infectam por contatos domiciliares, principalmente com seus pais”, diz um trecho do artigo publicado pela Agência Fiocruz de Notícias. “As crianças incluídas no estudo não parecem ser a fonte da infecção de Sars-CoV-2 e mais frequentemente adquiriram o vírus de adultos”.
Os pesquisadores ponderam, entretanto, que os testes foram realizados em um período em que as escolas estavam fechadas no Rio de Janeiro. Desse modo, os adultos podem ter tido um papel de propagador mais importante porque continuaram expostos ao vírus ao sair para trabalhar fora de casa.
O artigo sugere que, em um cenário semelhante ao estudado, “escolas e creches poderiam potencialmente reabrir se medidas de segurança contra a covid-19 fossem tomadas e os profissionais adequadamente imunizados”.
Os cientistas defendem que compreender o papel das crianças na dinâmica de transmissão é de importância fundamental para diversas estratégias de enfrentamento da pandemia, como a reabertura segura das escolas. Além disso, eles alertam que é necessário incluir as crianças nos estudos clínicos de vacinação.
“Se os adultos forem imunizados e as crianças não, elas podem continuar a perpetuar a epidemia. Se no mínimo 85% dos indivíduos suscetíveis precisam ser imunizados para conter a pandemia da covid-19 em países de alta incidência, esse nível de proteção só pode ser alcançado com a inclusão de crianças em programas de imunização, principalmente no Brasil, onde 25% da população têm menos de 18 anos”, diz o artigo.
O estudo foi coordenado pela chefe do Laboratório de Pesquisa Clínica em Doenças Febris Agudas do Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI/Fiocruz), Patrícia Brasil. Além de outros pesquisadores da Fiocruz, participaram do trabalho cientistas da Universidade da Califórnia (UCLA) e da London School of Hygiene and Tropical Medicine (LSHTM).
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