Feministas apostam no empreendedorismo para incentivar mulheres na Palestina e na Líbia

WASHINGTON, EUA (FOLHAPRESS) – Em julho de 2014, Hala Bugaighis soube que sua prima, Salwa, tinha sido assassinada. A Líbia perdia, assim, uma de suas ativistas de maior renome, uma figura ligada à defesa dos direitos das mulheres. Depois de Salwa, outras ativistas morreram neste país do norte africano. “Houve um retrocesso”, Bugaighis diz, “e temi que tudo o que elas tinham feito pela Líbia iria desaparecer.”

Ela decidiu levar a luta da prima adiante, mas escolheu outro caminho. Salwa militava na política. Bugaighis escolheu a economia. Criou a organização Jusoor – “ponte”, em árabe- para tratar do abismo que enxerga entre os homens e as mulheres no mundo do trabalho e dos negócios.

Bugaighis, 40, falará mais sobre essa experiência nesta segunda-feira (8) durante o evento virtual “mulheres árabes que inspiram”, organizado pela Câmara Árabe. Ao lado dela estará a palestina Maysoun Gangat, criadora da rádio Nisaa FM, uma das poucas dedicadas às mulheres em árabe. A conversa será transmitida a partir das 9h, e o vídeo deve seguir disponível online.

Em comum, Bugaighis e Gangat apostam no papel do empreendedorismo para dar mais poder às mulheres, abrindo caminho para mudanças na sociedade, na contramão do conservadorismo.

O Jusoor, por exemplo, é um centro de pesquisa que conta com uma incubadora de pequenas empresas como um de seus braços. Ali, Bugaighis dá apoio logístico e treinamento para mulheres líbias. O país não contava com um setor privado robusto até os anos 2000 e ainda costuma aparecer nos últimos escalões dos rankings globais de competitividade. Os desafios incluem vencer a burocracia, ter acesso contínuo à eletricidade e conseguir exportar.

Bugaighis diz que, depois da derrocada do ditador Muammar Gaddafi em 2011 e dos subsequentes conflitos civis, a situação passou a melhorar para as empresárias líbias. “Os homens precisaram contar com as mulheres para reconstruir o país e elas aproveitaram essa oportunidade para começar a mudar a sociedade”, afirma. “Deixaram de ser vistas como um estorvo para as famílias e passaram a ser uma fonte de renda. Ficaram mais visíveis.”

A situação piorou com a chegada da pandemia da Covid-19 em 2020, que forçou muitas delas a abandonar suas empreitadas e se voltar à família. Mas Bugaighis mantêm o otimismo. Mesmo durante os piores conflitos civis, afinal, mulheres líbias tinham continuado a visitar sua incubadora de empresas -às vezes sob forte bombardeio. “Elas não deixaram de sonhar com um futuro alternativo.”

A palestina Gangat, 55, também insiste na importância de fomentar a ambição de empresárias na região. Há dez anos, ela criou a rádio Nisaa, voltada ao público feminino. Além de empregar jovens jornalistas em um setor que costuma contar com mais homens, Gangat quer usar a plataforma para inspirar e conectar empreendedoras nos territórios palestinos da Cisjordânia e de Gaza.

Criar redes de contato é essencial no contexto palestino. Com a ocupação israelense da Cisjordânia e os bloqueios em torno da faixa de Gaza, é impossível se deslocar entre os lugares.

A rádio Nisaa treina pequenas empreendedoras e dá espaço para que falem, no ar, sobre seus negócios. As empresárias também têm acesso a tempo de anúncio gratuito.

O que costuma acontecer, Gangat diz, é que as empreendedoras falam sobre as suas dificuldades na rádio e, depois, recebem ofertas de ajuda por parte da audiência. Ela conta, por exemplo, a história de uma mulher que estava penando para conseguir uma licença para operar. O ministério responsável entrou em contato com ela depois de sua participação em um programa da Nisaa.

Gangat acredita que o crescimento deste setor privado liderado por mulheres pode ser traduzido em mais independência dentro de casa e, em um passo seguinte, em mais participação política.

Não são poucos os desafios, em seu contexto. Há o conflito com Israel, sim, mas pesam também as atitudes de uma sociedade conservadora na Palestina. Por isso, a Nisaa FM e outras ONGs têm pressionado as autoridades palestinas a rever suas leis no que diz respeito à família e ao lugar das mulheres – entre elas, as normas que regulam casamento, divórcio e direitos financeiros.

“Feminismo, para mim, não é uma teoria. Não é algo que eu quero seguir, não são regras rígidas”, Gangat afirma. “Eu acredito que toda mulher palestina é uma feminista, quer ela esteja em casa ou trabalhando fora. Acredito na igualdade, na habilidade de a mulher fazer o que quer fazer.”

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