RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – No age dos seus 70 anos, Vera Fischer tem se popularizado no mundo digital. Demitida da Globo em junho de 2020, a atriz investiu em streaming, redes sociais e, agora, está envolvida cada vez mais com o mundo dos NFTs para comercializar suas pinturas.
Mas o que são esses tokens não-fungíveis que movimentam milhões de criptomoedas e são febre no mercado artístico?
Com a popularização das transações digitais durante a pandemia, passaram a ser recorrentes nas redes termos como “blockchain”, “criptomoedas” e “NFT”. E este chama a atenção pelas grandes quantidades de dinheiro gastas por celebridades para adquiri-los.
Em janeiro deste ano, o jogador Neymar desembolsou cerca de R$ 6 milhões na compra de dois exemplares da famosa coleção Bored Ape Yacht Club (Iate Clube do Macaco Entediado, em tradução livre).
O jornal Folha de S.Paulo ouviu especialistas e preparou um guia para explicar do que se trata este universo e quais os são benefícios e riscos relacionados às criptoartes.
O que é e como funciona?
NFT é uma sigla, em inglês, para “token não fungível”.
Na computação, os tokens, também conhecidos como fichas digitais ou criptoativos, são como se fossem uma ficha em uma festa junina. Você troca seu dinheiro (o ativo, algo que tem valor) por uma ficha, que te permite fazer atividades naquele ambiente.
O local da festa seria a blockchain, a rede onde as criptomoedas funcionam e que registra as transações dos usuários com moedas digitais. A blockchain é uma representação digital e não interage com o mundo físico.
Por se tratar de algo relativamente novo e abstrato, Igor Machado, 33, doutor e professor em Computação pela UFF (Universidade Federal Fluminense), explica que para entender a exclusividade dos NFTs é necessário compará-los com a algo fungível. Neste caso, pense naquilo que você já conhece e lida todos os dias: o dinheiro.
Um token fungível diz respeito a algo que pode ser unido a outro, visto que não há diferença entre eles. As cédulas de dinheiro são fungíveis, afinal, não importa a diferença entre elas, se unidas, permanecerão tendo valor final. E, assim como as notas, você pode passar um desses tokens para outra pessoa.
Esse tipo de criptoativo teve bastante popularidade em 2016 e 2017 e, nesse período, muitos surgiram e acabaram rapidamente.
Por existir a necessidade de representar ativos do mundo real, como imóveis, foi preciso criar um certificado digital que não fosse passível de ser fracionado. E é nesse contexto que surgem os NFTs.
“Esse tipo de padrão já existe desde 2018, mas apenas 2021 foi decretado o ano das NFTs”, diz Igor Machado.
Por meio desses tokens é possível representar arte, música, memes, figuras etc. Porém, quando se cria um NFT de algum elemento do mundo físico, é preciso ter por trás alguma entidade que dê respaldo para isso.
É seguro?
Na maioria das vezes, sim. Quando uma transação em criptomoeda é feita, é possível seguir todo seu caminho no grande banco de dados que é a blockchain.
Por exemplo, se você comprar um cafezinho e pagar com bitcoin –criptomoeda amplamente conhecida avaliada em cerca de R$ 197 mil–, é possível rastrear todo o trajeto desse ativo. Por mais que as pessoas que fazem transações na rede sejam anônimas, todas as operações ficam registradas.
Apesar dessa transparência fornecida pela tecnologia, recentemente, há acusações de que os NFTs podem ser usados para encobrir origem de dinheiro ilegal, prática conhecida como lavagem de dinheiro.
No início de fevereiro, o Departamento do Tesouro dos Estados Unidos emitiu um alerta de que o mercado emergente de arte digital pode apresentar novos riscos, como é o caso das NFTs.
Segundo um relatório do Elliptic, provedor de análises de criptoeconomia no Reino Unido, as enormes quantidades de dinheiro envolvidas nessas transações são atraentes para cibercriminosos. A empresa afirma que, até o momento, não foram relatados publicamente movimentações envolvendo lavagem de dinheiro e NFTs. Porém, espera que neste ano surjam os primeiros grandes casos.
Nas redes sociais, internautas compartilham memes e emitem opiniões sobre as criptoartes serem envolvidas em ilegalidades.
Rodrigo Monteiro, 45, diretor-executivo da ABCripto, explica que “a lavagem de dinheiro no mundo é feita 92% por dinheiro. E os outros 8% são feitos com artes, negócios de fachada, cripto e produtos financeiros”. Ele diz que, como na blockchain tudo fica registrado, é possível rastrear toda a movimentação que é feita.
“Não é prático, não é inteligente e não faz sentido que alguém queira fazer lavagem de dinheiro usando cripto. Mas existe, sim, um pequeno percentual de pessoas que vão tentar.”
Afeta o meio ambiente?
Sim. Há críticas, principalmente disseminadas nas redes sociais, sobre o impacto das NFTs ao meio ambiente. Isso ocorre porque, para serem comercializadas, é preciso usar criptomoedas, principalmente o ether, avaliado em cerca de R$ 13 mil, e o bitcoin.
Um estudo da Universidade de Cambridge estima que as transações em bitcoin usam mais energia por ano –125.1 TWh (terawatts-hora)– do que a Ucrânia (124.5 TWh) e a Noruega (124.3 TWh). A pesquisa também diz que a quantidade de energia gasta nesse período pela criptomoeda é suficiente para ferver a água das chaleiras dos britânicos por 28 anos.
Para Rodrigo Monteiro, o nível de consumo energético da humanidade cresceu muito, mais do que o planeta pode suportar, e com a blockchain não seria diferente.
Para que a rede seja tão segura, é preciso de muita energia para executar as operações e isso contribui para a intensificação das mudanças climáticas.
“A questão da tecnologia do blockchain e do NFT é uma gota nesse oceano.”
No entanto, já existe a consciência entre artistas e compradores sobre a necessidade de se proteger o meio ambiente, como é o caso da iniciativa Green NFTs. Esta consiste em um sistema de recompensas para pessoas que tentam melhorar a eficiência energética desse tipo de criptoeconomia.
Vale a pena comprar?
Depende. A vantagem de se adquirir um NFT é obter a propriedade digital de uma obra única, tendo sua autenticidade garantida. Não há uma cópia idêntica daquilo, o que o torna algo raro.
Pense na “Mona Lisa”, diz Bruno Perini, 33, especialista em finanças e sócio do Grupo Primo. Você pode ir ao Museu do Louvre, em Paris, e tirar fotos do quadro, mas não terá a posse da obra. O mesmo acontece com as imagens dos NFTs que foram adquiridos por Neymar.
O empreendedor explica que a prática de internautas de fazer capturas de tela de um NFT e sugerirem que também compraram, o que não ocorreu, só leva à valorização ainda maior.
É importante entender que os NFTs não representam um investimento como os títulos públicos ou ações, por exemplo.
Eles podem ser valorizados mediante aos fatores externos como a popularidade, escassez e demanda, mas a tendência é que, com o aumento da oferta, a maioria dos preços abaixe no futuro.
Outra questão a se levar em conta é a custódia dos tokens. Quando se compra um, ele fica guardado dentro de uma carteira digital. Caso você não anote a senha, não será mais possível acessá-lo.
Portanto, se você tem interesse em colecionar uma obra de arte única e autêntica, é mais provável que comprar um NFT seja para você. Se pensa em lucrar, talvez seja melhor procurar outras formas de investimento.
Como eu faço para comprar?
Caso tenha se decidido a adquirir, segue abaixo um passo a passo de como fazê-lo:
1- É preciso do ativo usado nas transações. O mais comum é o ether, da rede ethereum. Para isso, é preciso ter uma conta em uma corretora, ter comprado essa moeda ou alguém ter feito a transferência;
2- Baixe uma carteira digital –a Meta Mask é a mais utilizada. Você consegue baixá-la como aplicativo para o celular ou como extensão no navegador;
3- Após configurar sua carteira, transfira os ethers para lá;
4- Faça login em um marketplace –onde são negociados NFTs. No OpenSea é onde acontece boa parte das negociações;
5- Escolha sua coleção, assim como você faz suas compras online.
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