RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – Em 12 meses desde o início da pandemia do novo coronavírus, o preço dos alimentos subiu 15% no país, quase três vezes a taxa oficial de inflação do período, que ficou em 5,20%, informou nesta quinta (10) o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Foi a primeira divulgação do IPCA compreendendo 12 meses sob influência da pandemia, decretada pela OMS (Organização Mundial de Saúde) no dia 11 de março de 2020.
Com forte pressão dos reajustes da gasolina, o índice voltou a acelerar em fevereiro, fechando o mês em 0,86%, ante 0,25% no mês anterior. Segundo o IBGE, foi a maior alta para fevereiro desde 2016.
Com a alta dos alimentos, a taxa acumulada em 12 meses chegou a 5,2%, a maior desde janeiro de 2017 e próximo do teto de 5,25% estabelecido pelo Banco Central.
A escalada dos preços dos alimentos atingiu em cheio o consumidor já no início da pandemia, tornando ainda mais difícil a travessia dos meses de isolamento social e perda de renda provocada pelo fechamento de negócios e aumento do desemprego.
Nestes 12 meses de pandemia, o preço do óleo de soja subiu 87,89%, o arroz ficou 69,80% mais caro e a batata está custando 47,84% a mais. O preço do leite longa vida, outro produto sob grande pressão, subiu 20,52%.
Entre os grupos de alimentos pesquisados pelo IBGE, as maiores altas ocorreram em cereais, leguminosas e oleaginosas (57,83%), óleos e gorduras (55,98%), tubérculos, raízes e legumes (31,62%), carnes (29,51%) e frutas 27,09%.
Em 2020 governo chegou a anunciar medidas para tentar conter a escalada, como a isenção de impostos para a importação de arroz, soja e milho, mas os impactos foram pequenos. Nas últimas semanas, alta do custo de vida é tema de campanhas contra o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) nas redes sociais.
A alta é explicada pelo mercado como um efeito combinado do maior número de refeições em casa após o início da pandemia, aumento da demanda internacional por commodities agrícolas e desvalorização cambial, que impacta o preço dos produtos cobrados em dólar.
Pelo lado da demanda interna, os efeitos do desemprego foram parcialmente compensados pela distribuição do auxílio emergencial pelo governo. A suspensão do benefício, em dezembro, já vem tendo efeitos nas gôndolas: com menor procura, a inflação dos alimentos desacelera desde o fim de 2020.
Em fevereiro, o segundo o IBGE, o grupo alimentos e bebidas teve inflação de 0,27%, menos do que os 1,02% registrados em janeiro, quedas nos preços de produtos como batata-inglesa (-14,70%), tomate (-8,55%), leite longa vida (-3,30%) e óleo de soja (-3,15%).
Nesta quinta, a Apas (Associação Paulista de Supermercados) informou que o setor voltou a registrar deflação depois de um ano, com queda de 0,5% no preço dos produtos vendidos. Os pincipais motivos, diz, foram “a ausência do Carnaval e a espera do consumidor por novos auxílios”.
O gerente da pesquisa do IBGE, Pedro Kislanov, avalia que ainda é difícil prever o comportamento do preço dos alimentos nos próximos meses. “No caso da soja, por exemplo, tem expectativa de safra recorde, que pode baixar o preço, mas também tem a questão do dólar que pode ter impacto para cima”, comentou.
Além dos alimentos, a pandemia inflacionou preços de eletroeletrônicos, materiais de construção e produtos químicos e têxteis. As altas refletem desde a mudança de perfil do consumidor durante o isolamento a fatores externos, como taxa de câmbio depreciada e elevada demanda global.
Com alta procura após a adoção de home office, por exemplo, equipamentos de TV, som e informática tiveram alta de 18,62% nos 12 meses após o início da pandemia. Produtos de cama, mesa e banho ficaram 14,92% mais caros e chuveiros elétricos subiram 10,13%.
Na outra ponta, serviços que perderam demanda estão entre as maiores baixas, como passagens aéreas (-25,95%), transporte por aplicativo (-15,2%) e ônibus interestadual (-10,21%).
Para os próximos meses, apesar da desaceleração dos alimentos, a expectativa é de pressões inflacionárias vindas do preço da gasolina, item com maior peso na composição do IPCA, que já foi reajustada nas refinarias seis vezes desde janeiro.
Com aumento de 7,11% em fevereiro, a gasolina teve o principal impacto na aceleração da inflação no mês, empurrando o grupo transportes para uma alta de 2,28%. Segundo o IBGE, o indicador capta apenas os reajustes feitos pela Petrobras em janeiro e fevereiro. Outros dois foram anunciados em março.
Com alta de 2,48%, o custo da educação também teve contribuição importante para elevar a inflação no mês. O maior impacto veio dos cursos regulares (3,08%), que já costumam ter impacto inflacionário nesta época do ano, diante dos reajustes anuais.
“Em fevereiro, nós captamos os reajustes das mensalidades cobradas pelas instituições de ensino. E além disso, verificamos que em alguns casos houve retirada de descontos aplicados ao longo do ano passado no contexto de suspensão das aulas presenciais por conta da pandemia”, disse o gerente do IBGE.
Juntos, transportes e educação representaram 70% do IPCA de fevereiro. Já no campo negativo, o maior impacto na inflação de fevereiro veio da energia elétrica (-0,71%), com a manutenção da bandeira amarela na conta de luz.
Para março, a expectativa é de inflação ainda alta, puxada pela gasolina. A Guide Investimentos, por exemplo, fala em 0,8%, com “pressão derivada dos combustíveis e da alta na energia elétrica devido a reajustes tarifários em importantes unidades da federação e alta dos impostos federais”.
Kislanov avalia que não há pressão de demanda que justifique a manutenção da pressão inflacionária. A principal contribuição do mês, argumentou, veio de preços administrados, com a gasolina. Na inflação de serviços, foi o reajuste dos cursos regulares.
“Estamos em um período de muitas incertezas”, frisou, citando o aumento do número de mortes, o aumento das restrições à circulação e a possibilidade de volta do auxílio emergencial como fatores que também ajudarão a definir a evolução do IPCA.
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