Com alta da Selic, renda fixa isenta de IR atrai atenção dos investidores

LUCAS BOMBANA
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A sequência de aumentos na taxa Selic iniciada em março de 2021 pelo BC (Banco Central), da mínima histórica de 2% para os atuais 13,25% ao ano, tem aumentado cada vez mais a atratividade dos títulos de renda fixa sob a ótica dos investidores brasileiros.

Dentro da classe, uma recomendação que tem se destacado nas conversas dos especialistas de investimento com os clientes diz respeito aos títulos isentos de IR (Imposto de Renda) para o investidor pessoa física.

Com a alta da taxa básica de juros, o mercado tem oferecido aos investidores títulos emitidos por grandes empresas, sem cobrança de impostos, com retorno real, ou seja, acima da inflação, em torno de 6% ao ano.

Diretor de investimentos do Santander Private Banking, Christiano Clemente afirma que os papéis de renda fixa que contam com o benefício tributário se dividem em dois grandes grupos.

Um deles é formado pelas letras de crédito emitidas por instituições financeiras -LCIs (Letras de Crédito Imobiliário), LCAs (Letras de Crédito Agrícola) e LIGs (Letras Imobiliárias Garantidas).

Além de contarem com a isenção do IR, as duas primeiras têm ainda a cobertura do FGC (Fundo Garantidor de Créditos), associação que garante o valor aportado pelo investidor até o limite de R$ 250 mil por CPF e conglomerado financeiro, em caso de eventuais problemas que a instituição emissora venha a sofrer no meio do caminho.

Já a LIG não tem a cobertura do FGC, mas conta com uma dupla garantia: da própria instituição financeira que emitiu os títulos e uma carteira de financiamentos imobiliários, que fica separada do patrimônio do banco. Portanto, caso o banco venha à falência, esse conjunto de créditos imobiliários tem como papel honrar o compromisso de pagamento aos investidores.

Clemente acrescenta que, além das letras financeiras, há os títulos isentos de renda fixa de caráter corporativo -CRIs (Certificados de Recebíveis Imobiliários), CRAs (Certificados de Recebíveis do Agronegócio) e debêntures incentivadas de infraestrutura.

Nesses casos, os investimentos não têm a cobertura do FGC ou das instituições financeiras, com o investidor ficando sujeito ao risco de crédito da empresa emissora do título.

Demais aplicações de renda fixa, como CDBs (Certificados de Depósito Bancário), fundos e títulos públicos, têm a incidência do IR pela tabela regressiva, em que as alíquotas de IR diminuem com o tempo -começam em 22,5% e caem até 15%, para prazos que variam de seis meses a dois anos.

Segundo o especialista da área de private banking do Santander, a isenção fiscal, além de beneficiar o investidor de varejo, busca também fomentar setores importantes para a dinâmica econômica do país.
“A isenção de imposto gera um custo menor para as empresas terem acesso aos empréstimos, o que, em tese, faz com que a economia gire de maneira mais fluida”, diz Clemente.

VOLUME DE EMISSÃO NO ANO SUPERA MARCAS DE 2021
Dados da B3 mostram que os investimentos isentos de IR têm atraído o interesse de um público crescente desde dezembro de 2020, acompanhando de perto o processo de alta da taxa Selic.

“Esses títulos realmente chamam bastante a atenção dos investidores pessoa física, justamente por causa da isenção”, afirma Camilla Dolle, chefe de renda fixa da XP.

A especialista da XP diz que o fato de as letras de crédito oferecerem ao investidor o benefício adicional da cobertura pelo FGC acaba pesando para uma demanda maior dos investidores de varejo por esses ativos.

Levantamento da Bolsa brasileira realizado a pedido da Folha indica que o mercado de títulos isentos registrou nos primeiros cinco meses do ano volumes bem acima dos observados em igual período do ano passado.

As LCAs emitidas de janeiro a maio somaram R$ 115,3 bilhões, ante R$ 52,4 bilhões no mesmo intervalo de 2021. Já as LCIs emitidas somaram R$ 70,7 bilhões, ante R$ 33 bilhões no ano passado, enquanto as LIGs somaram R$ 19,8 bilhões, ante R$ 8,2 bilhões em igual período de 2021.
“À medida que os juros sobem, naturalmente a renda fixa fica mais atrativa, e a renda variável, menos”, diz Fabio Zenaro, diretor de produto, balcão e novos negócios da B3.

Ele acrescenta que, dentro do grupo de títulos isentos, aqueles voltados ao agronegócio têm se destacado ainda mais que os pares, em um cenário macroeconômico desafiador, no qual o setor agrícola vem demonstrando resiliência diante da demanda pujante em escala global.

Entre os títulos corporativos, a tendência se repete -a emissão de CRAs atingiu R$ 11,7 bilhões, de janeiro a maio, ante R$ 8,5 bilhões no mesmo intervalo do ano anterior. No caso dos CRIs, o volume foi de R$ 11,5 bilhões, ante R$ 11,3 bilhões em igual período de 2021.

Os dados da B3 indicam ainda que, entre as debêntures incentivadas de infraestrutura, o estoque total, que era de R$ 136,4 bilhões em maio de 2021, saltou para R$ 192,5 bilhões, em maio deste ano.

Estrategista de investimentos do Itaú Unibanco responsável por crédito privado, Vanessa Müller afirma que, pelo fato de as letras de crédito contarem com a garantia do FGC, e, em média, terem prazos de vencimento mais curto, entre um e dois anos, tendo como indexador na maioria dos casos o CDI, elas acabam entrando mais no radar do investidor pessoa física de varejo.

Entre as operações de letras de crédito em CDI, diz a especialista, é comum que as emissões saiam em um percentual em torno de 90% a 95% do CDI, que, com a isenção do IR, corresponde ao equivalente a algo como 110% a 115% do benchmark, considerados investimentos com a taxação tributária.

No caso dos certificados e das debêntures, em que não há a proteção pelo fundo garantidor, e em que os prazos costumam ser mais extensos, com indexação majoritariamente ao IPCA, os investidores pessoa física com maior volume financeiro, dos segmentos de alta renda e private, tendem a ser mais presentes nas ofertas, diz a especialista.

Retornos de IPCA mais 6% ao ano Executivo responsável pela área de mercado de capitais do UBS BB, Samy Podlubny diz que operações recentemente estruturadas pela casa de empresas de grande porte, como um CRA da Raizen e um CRI da CSN Cimentos, saíram com taxas de retorno ao redor de IPCA mais 6% ao ano.

“Na minha visão, emprestar dinheiro para empresas desse porte e ganhar uma taxa real de 6% livre de IR é um ótimo investimento”, diz Podlubny, acrescentando que o instrumento, por si só, não é o que define o nível de retorno que o investidor vai obter com o negócio, sendo preciso levar em conta principalmente o risco de crédito da empresa que está fazendo a emissão do instrumento.

O executivo do UBS BB assinala que, para empresas de menor porte e não tão conhecidas pelo público geral, a taxa real de retorno pode beirar a marca dos 10% nos títulos corporativos com isenção fiscal. Nesse caso, contudo, se faz necessária uma análise mais minuciosa a respeito da saúde financeira das operações antes de realizar o aporte, afirma.

“Para o investidor menos sofisticado, o ideal é que ele se atenha aos nomes mais conhecidos, das maiores empresas”, diz o especialista. Ele lembra que as emissões contam com ratings atribuídos pelas agências de classificação de risco, sendo essa uma boa métrica de avaliação para o investidor mensurar o nível de risco que deseja assumir.

Podlubny afirma que, além do risco de crédito, o investidor também precisa estar atento ao prazo de vencimento das operações. Segundo ele, as emissões dos títulos, via de regra, têm um horizonte de médio e longo prazo, com prazos que podem variar de dois a cinco anos, mas que, em alguns casos, podem ser ainda mais extensos, chegando aos dez anos até o vencimento final.

Caso queira sair antes, é possível vender os papéis no chamado mercado secundário, em que os detentores dos papéis conseguem se desfazer dos títulos, com a negociação para outros agentes de mercado.

Nesse caso, no entanto, o rendimento contratado no momento da aquisição não é garantido, com a possibilidade de a venda ser feita com algum ganho, ou prejuízo, em relação ao inicialmente previsto, a depender das condições de mercado no momento da venda.

Aportes a partir de R$ 1.000 Para investir nos títulos isentos, é preciso ter conta em banco ou em corretoras, sendo possível aplicar diretamente por meio da seção de renda fixa dos aplicativos, ou com o assessoramento de especialistas de investimento e gerentes bancários.

Confira aqui o passo a passo para abrir uma conta digital nas principais instituições financeiras do mercado.

Os valores mínimos de aporte variam de acordo com a instituição financeira. No caso da Órama, Ricardo Teófilo, chefe de renda fixa da plataforma, diz que os investimentos nos títulos isentos começam a partir de R$ 1.000. Na XP e no Itaú, os aportes mínimos também são de R$ 1.000.

“Os títulos de renda fixa isentos de IR têm apresentado retornos bem interessantes, e entendemos que seja um bom momento para investir neles”, diz o chefe de renda fixa da Órama, acrescentando que os papéis disponibilizados na plataforma passam por uma curadoria prévia dos especialistas da casa.

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