SÃO PAULO, RIO DE JANEIRO E BRASÍLIA, None (FOLHAPRESS) – A primeira edição do CNU (Concurso Nacional Unificado) deixou de saldo a percepção de provas “fáceis”, um índice de abstenção de 52,5% e criatividade para driblar as ondas de calor que atingiram algumas cidades do país neste domingo (18).
Sem relatos de atrasos na aplicação, vazamentos e outros problemas na organização, a realização do concurso, inédito no país pelo modelo e tamanho, foi concluída às 18h e comemorada pelo governo federal.
Entre 9h e 11h30, os concurseiros enfrentaram uma bateria de questões discursivas, específicas para cada um dos oito blocos, e uma prova objetiva de conhecimentos gerais, comum a todos. Na parte da tarde, entre 14h30 e 18h, os candidatos responderam a perguntas específicas de cada bloco.
O gabarito das provas está previsto para ser divulgado na terça-feira (20), e os cadernos de resposta foram liberados às 20h deste domingo.
Em declaração na noite deste domingo, a ministra Esther Dweck (Gestão e da Inovação em Serviços Públicos) afirmou que houve quase 1 milhão de pessoas realizando o CNU. Isso representa menos da metade de pessoas realizando a prova, tendo em vista que foram 2,1 milhões de inscritos.
A ministra afirmou que o índice era esperado e citou como exemplo um concurso do Banco do Brasil, que registrou uma abstenção de 62%.
“O que era esperada é que seria uma abstenção em torno de 40% a 50%, dado o histórico de concurso. Isso é até uma coisa curiosa, as pessoas se inscrevem, pagam a taxa de concurso e acabam não indo realizar a prova porque acham que não estão preparadas o suficiente, mudaram de perspectiva”, afirmou.
O alto índice de abstenção foi percebido durante o dia nos locais de prova. No Rio e em São Paulo, pessoas disseram à reportagem terem feito a prova em salas esvaziadas.
“Quase metade não foi na minha sala”, disse Gabriela Xavier, 29, que busca entrar na vaga de técnica de política social. Ela comenta que havia salas com apenas quatro pessoas no seu local de aplicação, na Universidade Presbiteriana Mackenzie, na região central de São Paulo.
O CNU foi apelidado de “Enem dos Concursos” não só por ser a primeira seleção unificada em nível nacional, mas também por abrir portas no funcionalismo público como fez o Exame Nacional do Ensino Médio para o ensino superior.
Maior concurso da história do país, o CNU teve mais de 2,1 milhões de pessoas inscritas para as 6.640 vagas disponíveis no serviço público, em 21 órgãos ligados ao governo federal. As provas aconteceram em 228 cidades, incluindo todas as capitais, somando 3.647 locais de aplicação e 72.041 salas.
Para alguns candidatos, a percepção foi de uma prova mais fácil do que o habitual para concursos de grande porte, com perguntas interpretativas e ligadas a assuntos do noticiário.
“Dava para fazer mesmo para quem não estudou muito. Algumas questões dava para ir por notícias, assuntos quentes, e outras eram mais específicas sobre legislação”, diz Maria Luisa Rodrigues, 25, formada em jornalismo e inscrita no bloco 7, que reúne as carreiras de gestão governamental e administração pública.
Candidatos também disseram que, em relação a outros concursos, o CNU ficou mais parecido com o Enem, com questões contextualizadas e trazendo pautas sociais.
A Cesgranrio, que formulou a prova aplicada no Concurso Unificado, propôs um tema de questão dissertativa diferente para cada bloco do exame.
Foram cobrados textos sobre questão indígena, sistema carcerário, mudança climática e segurança da mulher no trabalho.
“A Cesgranrio saiu das questões ‘decorebas’. O nível da prova não estava difícil na parte da manhã, com questões de nível fácil a médio de dificuldade”, pontua Bruno Bezerra, professor do Estratégia Concursos.
Na parte da tarde, os candidatos tinham até às 18h para concluir a prova, mas alguns já saíram logo que os portões foram abertos, às 16h30.
À reportagem, muitos concorrentes disseram ter achado a segunda etapa de questões tranquila, o que permitiu terminar a prova bem antes de os portões abrirem. Outros reclamaram que a parte da tarde foi mais cansativa, com enunciados e textos maiores.
Marcos Paulo, 27 anos, estudante de administração de empresas na USP foi o primeiro a sair da prova do CNU na Universidade São Judas Tadeu, na Mooca, zona leste da capital. Ele contou que não teve grandes dificuldades na prova. “Essa parte foi mais de conhecimentos gerais e administração pública, que é o que eles pedem aos candidatos”, diz.
Relato semelhante foi feito por José Victor Valderedo, 33 anos, funcionário público. Segundo ele, a parte da tarde foi tranquila para quem estava preparado, com questões objetivas e sem muitas ‘pegadinhas’.
“Os textos estavam mais concisos, para quem estudou é uma prova que dava para resolver bem. A organização estava muito boa, uma prova muito bem feita”, disse Maurício Palmeira, 34 anos, pesquisador na área farmacêutica.
A nutricionista Débora Modenutte, 37, também não encontrou dificuldades na segunda parte do CNU, mesmo não estudando.
Já a professora Jamile Almeida Santos, 42 anos, prestou o bloco 5 (para carreiras de educação, saúde, desenvolvimento social e direitos Humanos) e disse que achou a prova da tarde mais difícil. “Não tanto pelo conteúdo, mas porque foi mais cansativa. Os enunciados das questões eram longos”.
Aline Menezes, professora do Gran Concursos fez o bloco 5 do CNU. No eixos cinco e quatro da prova da tarde, ela diz que foram cobradas muitas questões sobre avaliação, monitoramento e pesquisa.
Em relação aos outros eixos, ela notou a presença de temas indígenas e de povos originários de forma muito transversal. Violência contra a mulher e questões de gênero também foram assuntos cobrados, assim conhecimentos sobre o SUS (Sistema Único de Saúde), seguridade social, Bolsa Família. “Apareceram vários programas e foi pedido para que se pudesse falar o que eles representavam no aspecto das políticas públicas”, diz
A professora, porém, admite que esperava mais da prova. “Pelo edital tão denso e extenso quanto foi, eu esperava que as questões fossem mais aprofundadas, mas elas foram muito pontuais, muito superficiais.”
Em várias cidades, as provas foram aplicadas sob forte calor. Na capital paulista, os termômetros marcavam 29°C na região da Universidade São Judas Tadeu, na zona leste da capital, e 35ºC na Unip da Água Branca, na zona oeste.
Além do nervosismo, candidatos do CNU precisavam enfrentar o sol na espera pela abertura dos portões e no intervalo entre as provas da manhã e da tarde.
“Pelo edital tão denso e extenso quanto foi, eu esperava que as questões fossem mais aprofundadas, mas elas foram muito pontuais, muito superficiais”, disse a professora do Gran Concursos.
Na parte da manhã, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) visitou a “sala de situação” que monitora a aplicação do exame.
O presidente não respondeu perguntas dos jornalistas, apenas fez uma declaração parabenizando a organização do exame.
Lula celebrou o fato de não ter havido nenhum tipo de vazamento da provas, o que ele considerou uma “demonstração extraordinária que não apenas o governo mas a sociedade brasileira está preparada para tratar com seriedade um concurso”.
Lula ainda ressaltou como um dos pontos positivos do CNU a possibilidade de aumentar a representatividade de outros grupos na administração pública federal.