Cloud gaming ensaia futuro em que consoles de videogames serão obsoletos

(FOLHAPRESS) – Clicar e jogar. Os dois verbos resumem a próxima fase dos videogames. Agora, parte da indústria quer suprimir o processo de comprar um aparelho, inserir um disco, esperar o carregamento e baixar novas atualizações para começar. Só clicar e jogar.

Trata-se do cloud gaming, ou jogos na nuvem. A tecnologia permite que videogames sejam jogados a distância de um clique, como já funciona com filmes e músicas em serviços de streaming.

Isso significa que os games não requerem mais dispositivos específicos, como os consoles PlayStation, Nintendo e Xbox.

Agora, muitos títulos novos podem ser jogados de forma imediata, na plataforma de preferência, em qualquer lugar. Assim como, hoje, assistir a um filme em alta definição não demanda um aparelho Blu-ray.

Nas plataformas de jogos na nuvem, o usuário pode jogar um título com gráficos de última geração em um dispositivo antigo, através de uma página no navegador ou um aplicativo.

O cloud gaming funciona com servidores remotos, que aproveitam o poder de processamento de uma empresa e transmitem o jogo diretamente para o dispositivo de um usuário -como uma live do Facebook, mas interativa. Esse dispositivo pode ser uma TV, um smartphone, um tablet ou o próprio console de videogame.

O aparelho se conecta pela internet para reproduzir as imagens e enviar os comandos do usuário. Por isso, a exigência de conexão é maior comparada a um conteúdo em vídeo. Segundos de lentidão ou instabilidade já comprometem a experiência do jogador.

Tentativas de criar um cloud gaming ocorrem desde o início da década de 2000, mas só nos últimos anos que serviços do tipo se popularizaram. A tecnologia é atrativa e promissora, mas ainda precisa avançar para virar a principal forma de se jogar videogames.

“Nos últimos dois anos, o cloud gaming se estabeleceu como uma maneira viável de jogar videogames. O número de jogadores cresceu em várias vezes. Ao mesmo tempo, a tecnologia tem melhorado continuamente, oferecendo melhores experiências de jogo. Por exemplo, os requisitos de velocidade da internet se tornaram mais flexíveis, e alguns serviços oferecem experiências equiparadas a hardware de última geração”, disse Guilherme Fernandes, da Newzoo, consultoria com foco na indústria de games.

“O mercado está mais maduro do que há 2 ou 3 anos, com os serviços, usuários e todas as outras partes interessadas tendo expectativas, objetivos e modelos de negócios mais claros”.

Em 2021, o mercado de cloud gaming movimentou US$ 1,5 bilhão (R$ 7,7 bilhões) globalmente, segundo dados da Newzoo. Mas, na América Latina, o valor foi de apenas US$ 47 milhões (R$ 247 milhões), já que a disponibilidade de serviços ainda era escassa.

No Brasil, o principal serviço disponível é o Xbox Cloud Gaming, que integra a plataforma Game Pass. A ferramenta de jogos na nuvem chegou ao país em setembro de 2021 e conta com cerca de cem títulos, entre produções de orçamento milionário, independentes e até brasileiras.

Serviços similares de empresas concorrentes, como o PlayStation Now (reformulado em junho), o Amazon Luna e o Google Stadia, seguem indisponíveis. O GeForce NOW, da NVidia, só oferece o plano básico, que limita as sessões de jogo em 30 minutos.

A assinatura do plano do Xbox Game Pass com o Cloud Gaming, o mais caro, custa R$ 44,99 ao mês. O preço do melhor plano da Netflix, por exemplo, é R$ 55,90. A plataforma de streaming de games conta com mais de 25 milhões de assinaturas no mundo, segundo dados divulgados pela Microsoft em janeiro deste ano.

Como o serviço dá acesso a jogos de plataformas cujos preços vão de R$ 2 mil a R$ 20 mil (no caso de PCs gamers), acaba sendo uma alternativa de baixo custo para um mercado com altas barreiras de entrada. Não é à toa que os celulares representam o principal meio pelo qual os brasileiros jogam videogame.

Teste feito pela Folha de S.Paulo, realizado em um Macbook Air de 2020, mostra que o cloud gaming do Xbox dá um passo em direção a um futuro dos videogames em que os consoles já serão dispensáveis. O serviço não é perfeito, mas funciona como uma alternativa acessível para jogar alguns dos principais games dos últimos anos.

Títulos exclusivos do Xbox como “Forza Horizon 5”, “Halo Infinite” e “Flight Simulator”. Franquias clássicas como “Doom” e “Dragon Quest”. Indies premiados como “Hades”, “Hollow Knight” e “Undertale”. Produções nacionais como “Dodgeball Academia” e “Unsighted”. Todos a um clique de distância e sem custo adicional.

“O áudio e o vídeo já foram revolucionados pelo streaming. Agora é a vez dos jogos. Os jogos em nuvem podem democratizar o acesso aos jogos, liberando os jogadores de caros requisitos de hardware, razão pela qual é tão popular em muitos países, incluindo o Brasil”, diz o analista de mercado da Newzoo.

Contudo, ainda há alguns ruídos que impedem a execução fluida. Por exemplo, a plataforma não permite que se jogue pelo teclado do computador ou pela tela do celular. É necessário um controle, mas ao menos a lista de compatibilidade é abrangente.

Além disso, a resolução nem sempre se adapta às diversas telas existentes no mercado. E jogos online que demandam ação imediata, como “Fortnite”, ainda não são aproveitados ao máximo no cloud gaming, por conta do chamado input lag.

A expressão se refere ao tempo necessário para que um comando gere uma resposta no jogo. Nos consoles, o caminho é menor. Mas pela nuvem, a ação do jogador vai do controle para o dispositivo, e do dispositivo para o servidor onde o jogo está sendo executado, para então retornar à tela.

Por isso, mesmo com a melhor internet disponível, jogar online pela nuvem ainda não é ideal. Esse é um dos principais fatores pelos quais o cloud gaming ainda não é o principal meio para se jogar videogames.

“Os desenvolvimentos nessas áreas serão muito importantes para que os jogos em nuvem atinjam todo o seu potencial do lado da oferta. Do lado da demanda, muitos jogadores ainda preferem jogar em hardware local, como se acostumaram desde que os jogos existiam”, disse Guilherme Fernandes.

O cloud gaming ainda não vai ultrapassar os consoles, e nem pretende fazê-lo no momento, mas abre o caminho para o que os videogames podem se tornar.

Em entrevista ao site GamesIndustry.biz, Pav Bhardwaj, gerente de produto global do Xbox Game Pass, disse que jogar pela nuvem é uma forma de expandir o produto para diferentes mercados, e não necessariamente alterá-los.

“Existem diferentes razões pelas quais as pessoas não compram hardware dedicado: preço acessível, acessibilidade, talvez sejam jogadores inativos ou já possuam dispositivos para outras plataformas. Nós realmente achamos que isso tem a ver com acessibilidade e escolha”, afirmou.

“Eu amo consoles. Cloud gaming é apenas outro caminho, outra opção para abrir os jogos para outras pessoas.”

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