SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – No processo de morte e vida celular, a coordenação é feita por diversos sinais que avisam os responsáveis no nosso corpo pela absorção e eliminação das células mortas -a chamada apoptose ou necroptose.
Em geral, as células responsáveis por fazer isso são os macrófagos, assim chamadas por praticarem a “fagia” -literalmente, comer- das células danificadas.
Só que o que acontece quando esse processo não ocorre corretamente?
Cientistas do Centro Médico de Irving, da Universidade Columbia (Nova York), do Instituto de Pesquisa Biomédica da Novartis e do Hospital Policlínico de Milão (Itália) descobriram que a doença da gordura no fígado não alcoólica está relacionada a uma sinalização molecular que impede a absorção das células danificadas do fígado pelos macrófagos.
Como consequência, os moduladores de inflamação continuam a ser liberados, provocando ainda mais inflamação nas células ao redor, o que pode acelerar o processo de fibrose em camundongos.
Os achados foram publicados na edição desta quarta (23) da revista científica Science Translational Medicine.
A gordura no fígado (NAFLD, na sigla em inglês) é uma condição que atinge de 25% a 30% da população. Em alguns locais, como nos EUA, essa proporção pode chegar a 40%.
Ela é caracterizada pelo acúmulo de gordura no fígado sem associação com o consumo de bebida (cirrose alcoólica). Estimativas globais indicam que de 20% a 30% dos casos de gordura no fígado podem evoluir para esteatose hepática (também chamada esteatohepatite, ou NASH, na sigla em inglês).
Há evidência que a necroptose celular está envolvida em diversas condições de saúde, incluindo a NASH, onde o acúmulo de células mortas no fígado é um dos fatores que pode levar à fibrose. No estudo, os pesquisadores buscaram entender como esse processo ocorre.
O que eles observaram é que os macrófagos de indivíduos com NASH não fazem corretamente o papel de morte celular porque as próprias células (hepatócitos) emitem um sinal negativo (uma molécula conhecida como CD47) ao organismo -como se dissesse “não me coma”.
Testando um anticorpo conhecido como anti-CD47, capaz de bloquear esse sinal, os cientistas conseguiram pausar e até reverter o processo de esteatose hepática nos camundongos.
Um efeito colateral, porém, foi que alguns dos animais estudados apresentaram anemia.
Um segundo bloqueador molecular, atualmente testado para linfoma não-Hodgkin, também impediu esse sinal e estimulou a necroptose das células do fígado, sem o efeito anêmico nos animais.
Para Ira Tabas, autor sênior da pesquisa e professor de patologia e biologia celular no Centro Médico Irving, a pesquisa é inédita por conseguir demonstrar como o processo de bloqueio da necroptose está associado ao maior risco de fibrose hepática.
“Ficamos surpresos que ninguém nunca tinha estudado isso, porque o papel desse mecanismo em outras doenças é bem demonstrado, só nunca tinha sido testado para esteatose hepática”, diz.
De acordo com ele, a equipe está em contato com farmacêuticas interessadas em desenvolver drogas usando esse mecanismo.
“As evidências de ensaios em animais são bastante sólidas, e a análise de amostra de fígados de indivíduos com NASH também reforça o início de estudos clínicos e desenvolvimento de terapêuticas.”
“Existe evidência que a terapia com anti-SIRPa pode também ajudar a prevenir a aterosclerose, que é uma doença cardiovascular com lesão do tecido. Essa é uma perspectiva interessante, uma vez que doença cardiovascular é a principal causa de morte em indivíduos com NASH. Então, estaríamos testando uma droga eficaz para duas condições, ou mais, de saúde”, completa.
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