WASHINGTON, EUA (FOLHAPRESS) – Depois de quatro dias e 15 votações, em um impasse que não era visto há 164 anos, a Câmara dos Representantes dos Estados Unidos finalmente elegeu na noite deste sábado (7) seu novo presidente.
O deputado republicano da Califórnia Kevin McCarthy, 57, comandará a Casa pelos próximos dois anos. Sua gestão deve abrir investigações sobre diferentes aspectos do governo do presidente Joe Biden e complicar a agenda do governo federal no Legislativo -ainda que os democratas tenham controle do Senado. Deve ainda abrir um espaço generoso à ala ultradireitista do Partido Republicano.
A legenda, que alcançou maioria na Câmara após as eleições legislativas de novembro, vivia um racha que travou a Casa desde terça-feira (3), quando deveria ter começado a nova legislatura. Das 434 cadeiras hoje ocupadas (de um total de 435), os republicanos têm 222. Em tese, como ocorre na política americana, deveriam conseguir eleger sem sustos o nome que substitui a democrata Nancy Pelosi na presidência. O candidato natural para isso era McCarthy, líder da legenda na Câmara.
Mas o deputado enfrentou forte oposição do Freedom Caucus (bancada da liberdade), grupo republicano ultraconservador, e, se podia ter apenas 4 dissidências para alcançar a barreira dos 218 votos e ser eleito, viu 20 colegas votarem contra ele na maior parte das 11 sessões de humilhação pública a que foi exposto até quinta-feira (5).
Foi o pior cenário em eleições à presidência da Casa desde 1859, quando a conclusão demandou dois meses e 44 votações -deputados precisam votar quantas vezes for necessário até um vencedor obter maioria.
Resoluto, porém, McCarthy cedeu o que tinha e o que não tinha à bancada radical, irritando republicanos moderados. Com as concessões, chegou a esta sexta virando até 15 votos a seu favor nas rodadas realizadas à tarde e ficou próximo de ser eleito.
Ele ainda sofreu mais uma derrota em uma sessão marcada para as 22h (0h em Brasília), que teve momentos tensos após o deputado Matt Gaetz decidir se abster, e McCarthy brigar para tentar fazê-lo mudar de ideia dentro do plenário.
Após a confusão, a Câmara chegou a votar para adiar a eleição para presidente para segunda-feira (9), sem sucesso. Em seguida iniciou a 15ª rodada, na qual chegou-se ao resultado. A contagem final de votos foi de 216 para McCarthy e 212 para o líder democrata, Hakeem Jeffries, além de 6 abstenções.
A vitória, porém, custou caro a McCarthy, que deve assumir como um líder enfraquecido. A imprensa política americana dá conta das promessas que ele teria feito aos republicanos radicais que eram resistentes ao seu nome. Segundo a CNN, ele teria prometido que qualquer parlamentar possa propor uma moção para destituir o presidente da Câmara; que seu grupo político não vai disputar as primárias pela candidatura republicana em distritos seguros para os conservadores; que vai pautar projetos sobre segurança nas fronteiras e de limitação ao número de mandatos de um deputado; mudar o teto de gastos da Casa; ampliar a participação do Freedom Caucus em comitês, inclusive o que regula o regimento; e aumentar o número de emendas possíveis a projetos de lei -entre outros pontos.
Pouco após a votação, o presidente Joe Biden divulgou nota parabenizando McCarthy. “Estou preparado para trabalhar com os republicanos quando puder, e os eleitores deixaram claro que esperam que os republicanos também estejam preparados para trabalhar comigo. Agora que a liderança da Câmara dos Representantes foi decidida, é hora de esse processo começar”, disse.
Depois da eleição, finalmente os deputados eleitos tomaram posse.
McCarthy foi eleito pela primeira vez para a Câmara em 2006 e rapidamente galgou espaço na política interna da legenda. No começo da carreira era tido como representante da ala jovem moderada, os “young guns” (armas jovens), e chegou a lançar um livro com esse título clamando por mais consenso bipartidário para avançar pautas importantes para o país.
No governo Trump, porém, foi se aproximando da agenda conservadora e se transformou em forte aliado do presidente. Dias após a eleição de 2020, ainda durante a apuração, chegou a dizer à Fox News que o republicano havia vencido, antes de o resultado oficial apontar Biden como vencedor.
A maré virou na sequência da invasão do Capitólio, quando uma multidão insuflada por Trump tentou impedir à força a confirmação da vitória de Biden. McCarthy se voltou contra o então presidente, chegou a pedir sua renúncia e fez um discurso duro no púlpito da Câmara em que afirmou que Trump era responsável pelo ataque -que, nesta sexta, completou dois anos, em data que passou quase despercebida no Congresso devido justamente ao racha republicano.
Habilidoso politicamente, porém, o líder soube ler o cenário e se reaproximou do ex-presidente, inclusive jogando na fogueira seu antigo braço direito, Liz Cheney -que votou pelo impeachment do republicano e integrava a comissão do Congresso que investigou o 6 de Janeiro.
A gestão McCarthy deve abrir uma série de investigações contra o governo Biden, conforme lista de prioridades que ele divulgou em dezembro. A primeira deve ser contra o secretário de Segurança Interna, Alejandro Mayorkas, mirando a crise de imigração na fronteira com o México.
A lista se estende ainda para a influência da China nos EUA; as origens do coronavírus; a retirada de tropas americanas do Afeganistão; os negócios de um dos filhos do presidente, Hunter Biden; o que ele considera limitação à liberdade de expressão por empresas de tecnologia e o que chama de doutrinação nas escolas.
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