Aumenta a busca de coquetel amazônico para emagrecer

DANIELLE CASTRO
RIBEIRÃO PRETO, SP (FOLHAPRESS) – O coquetel amazônico é uma infusão com cinco ervas típicas da região Norte do Brasil e tem tido picos de crescimento nas trends de emagrecimento e nos buscadores como Google. Na internet, há inúmeros anúncios de fórmulas prontas e receitas, mas o composto basicamente é descrito como a mistura de alcachofra, banchá, cáscara-sagrada, centelha-asiática e sene.

Especialistas, entretanto, alertam que 3 dos 5 compostos da mistura são laxativos e que a sensação de emagrecimento é menos real do que parece. “Não é uma combinação de plantas medicinais que contribuirão com o emagrecimento. Elas podem causar uma falsa sensação de perda de peso, pelo aumento no número de evacuações e perda de líquidos, mas não há diminuição de tecido gorduroso, ou seja, não é emagrecedora”, afirma a nutricionista Sula de Camargo, habilitada em fitoterapia e aromaterapia.

Consultora técnica da Associação Brasileira de Nutrição, Camargo reforçou que todas as plantas do coquetel são contraindicadas para gestantes, lactantes e crianças, sendo necessário cautela para o uso em idosos. “Estas plantas medicinais são úteis em outros contextos de saúde, em outras doses e formas de preparo. Quanto às interações, não temos estudos com estas plantas associadas”, diz a nutricionista.
A nutricionista Vanessa Losano, supervisora de saúde na rede Vitat, que divulga a receita em seu site, diz que o coquetel amazônico surgiu em uma instituição do Norte do país como um tratamento para obesidade baseado em propriedades emagrecedoras de plantas nativas da flora da região, sendo parte de um tratamento mais amplo.
“A procura por ele é alta, pois, além do nome remeter a coisas naturais, acredita-se de fato que ele auxilia no emagrecimento, e sabemos que hoje o sobrepeso e a obesidade crescem nas mais diversas faixas de renda”, afirma Losano.

Pelo forte caráter laxativo, a supervisora indica o coquetel amazônico apenas como um auxílio para aqueles que têm prisão de ventre e sempre com acompanhamento profissional. “O emagrecimento varia muito de pessoa para pessoa, de como é a rotina no restante do dia. Nenhum chá, coquetel ou alimento sozinho emagrece. O coquetel é apenas mais um auxiliar no processo”, diz a nutricionista da rede.

Outro alerta é para o equívoco comum de achar que, por ser natural, pode-se fazer o uso à vontade e indiscriminado do coquetel amazônico. “Devido à combinação de ervas e ao alto poder laxativo, o ideal é consumir uma xícara ao dia (50 ml) e se hidratar bastante ao longo do dia. E quem tem problemas nos rins e fígado, por exemplo, não deve consumir”, destaca a supervisora.

Maria Edna de Melo, presidente do Departamento de Obesidade da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologiada (SBEM) lembra ainda que nem sempre as fórmulas prontas contêm de fato o que está descrito na embalagem ou apenas isso. “Esse tipo de produto, diferentemente dos medicamentos, não tem controle de qualidade. Não se sabe se outras substâncias foram colocadas. Se toma o produto e fica sem apetite, por exemplo, vai ter um inibidor, nenhuma dessas ervas leva a isso”, diz a médica.

Melo afirma que o efeito deriva mesmo da inserção de algum medicamento e que estas soluções não levam à perda de peso, muito menos com segurança. Mesmo as ervas “in natura”, se mal identificadas ou manipuladas em dosagens aleatórias, podem causar mais dano que benefício. “Fitoterápicos de efeito laxativo provocam aumento do número de evacuações e até diarreia, podem precipitar desidratação e problemas renais ou hepáticos”, conta a endocrinologista.

Desse modo, fórmulas mágicas nunca devem ser a referência para quem quer emagrecer. “A SBEM vê com muita preocupação [o uso destes chás da moda], visto os casos de insuficiência hepática que acompanhamos no começo do ano, nos quais foram precisos transplantes. Uma profissional de saúde morreu com o chá de 50 ervas”, lembra a médica.

Um levantamento conduzido em 2022 pela SBEM com 3.621 pessoas, sendo 89% delas mulheres, revelou que 93,6% dos entrevistados já tinham tentado perder peso. Destas, 31% admitiram ter tentado por conta própria, 55,7% recorreram a serviços privados e apenas 12,9% usaram o SUS. Entre as técnicas utilizadas para emagrecer, a mais comum foi dieta mais exercícios (65%), seguida de apenas dieta (15%). Outros 10% usaram medicamentos e, ao todo, cerca de 9% recorreram a chás, shakes, fitoterápicos e internet.

“Obesidade é uma doença e atinge níveis populacionais epidêmicos. As pessoas tentam emagrecer por meio de dieta e atividade física, que é o que todo mundo diz para fazer, mas não é tão fácil”, afirma a médica. Para ela, a maioria buscou ajuda no setor privado porque, apesar da obesidade impactar muito no serviço público, não há estrutura hoje para atender a demanda.
Outro fator que se reflete no mau hábito de buscar na internet receitas milagrosas para emagrecer é a pressão da sociedade. “Não é só a gordofobia com a obesidade, tem uma estigmatização até de quem está normal, mas ganhou algum peso. Existe tratamento ético, com medicação, orientação nutricional, mudança de estilo de vida específica, mas o preconceito faz com que as pessoas busquem resolver sozinhas, escondidas”, lamenta a especialista.

Os anúncios ativados por voz e preferências de pesquisa ampliam a bolha e o risco, enviando sugestão de emagrecedores de todo tipo. “A recomendação é conversar com seu médico mais próximo, alguém que te trate de forma respeitosa, e que, diante da dificuldade de perder peso, encaminhe para outro profissional com maior capacidade de atendimento”, indica Melo.

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