Depois de ser devastada por uma praga chamada bicudo, a produção de algodão no Brasil passou por grandes transformações nos últimos anos. Até os anos 1980, por exemplo, o Brasil era exportador de algodão. A fibra era produzida em São Paulo e no Paraná em pequenas propriedades e colhida manualmente.
Na época, a praga acabou com a produção e o País passou a ser importador de algodão nos anos 1990, conta Miguel Faus, presidente da Associação Nacional dos Exportadores de Algodão (Anea). A volta às exportações ocorreu com o cultivo do algodão no Centro-Oeste, em grandes propriedades, com colheita mecanizada.
A partir dos anos 2000, os agricultores do Centro-Oeste começaram a plantar algodão como segunda safra, em rotação com o milho. “No Mato Grosso, que é o maior produtor, 80% do algodão hoje é plantado em segunda safra”, diz o presidente da Anea.
Na produção, o Brasil vai passar os EUA no ano safra 2023/2024, segundo o departamento de agricultura dos Estados Unidos (USDA). A produtividade do algodão brasileiro é hoje de 1.900 quilos por hectare, mais que o dobro da dos Estados Unidos (900 quilos por hectare). “Na próxima safra, deveremos ter incremento de área de algodão, pois os preços estão bons, a produtividade é excelente e o milho está hoje com margem negativa”, observa Faus.
Consumo interno
No entanto, ultrapassar os Estados Unidos nas exportações e se tornar líder nas vendas externas é uma possibilidade, se, de fato, a quebra da safra no Estado americano do Texas for maior do que o esperado, diz o presidente da Anea. Um obstáculo para romper essa barreira é que o consumo interno de algodão no Brasil é grande (cerca de 700 mil toneladas) e supera o dos EUA, que é de 468 mil toneladas. “O excedente exportável lá é maior do que aqui”, frisa.
De toda forma, além dos ganhos de produtividade, o setor tem investido em qualidade e na sustentabilidade da fibra, uma das exigências dos compradores internacionais.
Faz três anos que a Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa) e a Anea iniciaram um programa chamado Cotton Brazil para promover o produto brasileiro no exterior. O programa tem um escritório em Cingapura e foram realizadas sete missões internacionais, que trouxeram representantes de 150 indústrias para conhecer como o algodão brasileiro é produzido, isto é, seguindo os critérios de sustentabilidade e qualidade.
Faus diz que o algodão brasileiro está trabalhando em silêncio. Na sua opinião, a commodity já está repetindo o efeito que a soja provocou no agronegócio brasileiro. “Passar os Estados Unidos é um detalhe para nós.”
Não tem para ninguém
No caso do milho, as perspectivas também são promissoras. “No médio prazo não tem para ninguém, só nós, mesmos”, diz o diretor executivo da Associação Brasileira dos Produtores de Milho (Abramilho), Glauber Silveira. Segundo ele, até 2050, o Brasil poderá produzir 400 milhões de toneladas de milho por ano, impulsionado pelo aumento de área e ganhos de produtividade.
Os EUA podem ganhar em produtividade no curto prazo, mas o aumento de área será mais restrito. Isso porque, se ampliarem a área com milho, terão de reduzir a de soja. “Área e produtividade no Brasil não têm limites e, se o preço melhorar, muitos produtores que não estão plantando milho na segunda safra vão começar a plantar.”
No entanto, no curto prazo, o Brasil poderá perder a liderança na próxima safra. Ele afirma que, por causa da grande safra atual, o preço do grão está em baixa. E isso desestimula o plantio dos produtores brasileiros. Mas ele acredita que esse retrocesso seja transitório. Nos próximos anos, Silveira diz que o País vai se consolidar na liderança mundial das exportações de milho.
Apesar das perspectivas favoráveis a médio prazo, o diretor da Abramilho destaca que a falta de armazéns para estocagem tem sido um problema para o setor. “Não adianta crescer demais a produção e não ter onde armazenar: o preço cai demais e o produtor é obrigado a vender a qualquer preço.”