(FOLHAPRESS) – Localizada no litoral do Espírito Santo, na região metropolitana de Vitória, a cidade de Vila Velha conta com duas grandes atrações turísticas: o Convento da Penha, fundado pelo frei Pedro Palácios, em 1558, e a fábrica da Garoto, criada em 1929 pelo imigrante alemão Heinrich Meyerfreund, com a lojinha de chocolates aberta ao público.
Controlada pela Nestlé, a fábrica de Vila Velha se tornou uma das cinco maiores da multinacional suíça no mundo. Ao todo, a Nestlé é dona de 344 plantas, 17 delas no Brasil. “Em âmbito global, envolvendo todos os fabricantes, a fábrica de Vila Velha é uma das 10 maiores de chocolate do mundo”, afirmou à Folha o vice-presidente jurídico e de assuntos públicos da Nestlé Brasil, Gustavo Bastos.
A planta, que hoje ocupa uma área de 130 mil metros quadrados no bairro da Glória, zona norte de Vila Velha, emprega cerca de 1.500 funcionários diretos e é responsável por boa parte da economia da cidade, de 509 mil habitantes.
Dona de marcas populares como Serenata de Amor, Baton e Talento, a Garoto ganhou os holofotes nesta quarta-feira (7) depois que o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) aprovou finalmente a sua compra pela Nestlé, um imbróglio que se arrastava desde 2004.
A aquisição, anunciada em fevereiro de 2002 por R$ 1 bilhão, chegou a ser reprovada pela autarquia em 2004 (naquela época, as empresas podiam se unir primeiro e o Cade avaliava depois).
Enquanto a briga com o Cade continuava na Justiça, a Nestlé seguiu investindo na Garoto, que transformou na sua “joia da coroa”. O aporte mais recente, da ordem de R$ 430 milhões para o biênio 2023-2024, foi anunciado em maio. O objetivo é expandir a produção em 10%, adaptando o perfil da planta para o conceito de indústria 4.0, com maior automação e robotização para ganhar em eficiência.
No biênio anterior (2021-2022), os aportes somaram R$ 270 milhões.
Segundo fontes que têm relações comerciais com a Nestlé, os aportes significativos feitos ao longo dos anos na única fábrica da Garoto serviram para reforçar, perante a sociedade e o poder público, o direito da multinacional suíça ao negócio. De acordo com esses interlocutores, quanto mais investimentos na fábrica, mais difícil seria desvencilhar a Nestlé da Garoto.
Nestes 21 anos desde a aquisição, no entanto, muita coisa mudou. A negativa do Cade em 2004 se deu pela concentração de mercado: Garoto e Nestlé juntas somavam quase 58% das vendas de chocolates no Brasil, em valor. Mas hoje as empresas têm bem menos: 32%, segundo a própria Nestlé.
“Nós perdemos participação de mercado, mas ainda assim o negócio continua valendo muito a pena”, disse Bastos, que entrou na Nestlé em 2000 e acompanhou toda a “saga” da companhia junto ao Cade. “A Garoto representa a conexão da Nestlé com o Brasil.”
Segundo ele, o mercado de chocolates mudou muito nos últimos anos, com a entrada de novas marcas, mudança de formatos no varejo -com os atacarejos ganhando espaço- e novos formatos de consumo, com o chocolate presenteável, por exemplo. “A perda [de participação] é uma consequência da dinâmica do setor, fizemos escolhas sobre onde investir.”
O segmento de cobertura de chocolate, no qual Nestlé e Garoto tinham 80% de participação, deixou de ser uma prioridade para a multinacional suíça, diz. “A Nestlé o avaliou como pouco rentável”, afirmou Bastos. A empresa, porém, ainda soma cerca de 40% de participação neste segmento.
Quando comprou a Garoto, em 2002, a marca era mais popular que a da Nestlé, com preços entre 10% e 15% inferiores aos da multinacional suíça. Mas isso deixou de existir desde a fusão: os preços praticados pelas duas marcas foram se tornando semelhantes e quem perdeu foi o consumidor, que deixou de ter uma opção mais barata.
“Dizer que a Nestlé perdeu participação porque aumentou o preço é uma leitura simplista”, disse Bastos. “A competição aumentou demais, em alguns momentos fomos bem, em outros, nem tanto.”
De acordo com dados da consultoria Euromonitor, o consumo de chocolates no Brasil atingiu R$ 22 bilhões em 2022, alta de 18% sobre o ano anterior (valores nominais), com a venda de 336 mil toneladas (crescimento de 7%).
A marca Garoto é a principal da Nestlé no Nordeste e também no Sul do país. “Hoje, diferenciamos a Garoto como uma marca para quem gosta de cacau. Aliás, 100% do cacau usado pela marca é nacional”, diz Bastos. “Já a Nestlé, mais forte no Sudeste, é uma marca para quem prefere a cremosidade do leite.”
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