BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Motor da abertura prometida pelo ministro Paulo Guedes (Economia), a Camex (Câmara de Comércio Exterior) conduz uma política protecionista. Na América Latina, só a Venezuela supera o Brasil em tarifas médias de importação.
O Brasil tem tarifas mais elevadas do que países como China, Cuba, Argentina e Bolívia.
De acordo com o Banco Mundial, 12 países são mais fechados do que o Brasil. São eles: Chade, Camarões, Etiópia, Nepal, Bangladesh, Paquistão, Benin, Venezuela, Togo, Senegal, Quênia e Congo.
Os dados mais recentes da OMC (Organização Mundial do Comércio) mostram que a média da tarifa de importação do Brasil foi de 10,2%, em 2019, contra 13,2% da Venezuela.
O país vizinho liderado pelo ditador Nicolás Maduro é usado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e Guedes como exemplo de tudo o que dá errado. A tarifa média de Cuba, regime comunista, foi de 7,2%, em 2019, e a da China, 3,5%.
“Será que alguém vai dizer que os irmãos Castro [Fidel Castro comandou Cuba por décadas e foi sucedido por Raúl], o kirchnerismo [Nestor e Cristina Kirchner, ambos peronistas, presidiram a Argentina] e o bolivarianismo [doutrina política dos presidentes da Venezuela] são regimes ultraliberais e entreguistas, ou que nossas empresas enfrentam agruras maiores que as enfrentadas por empresas argentinas ou bolivarianas?”, questionou Roberto Ellery, economista da UnB (Universidade de Brasília), em artigo publicado recentemente sobre o assunto.
Com base nos dados do Banco Mundial, Ellery selecionou tarifas médias de países da América Latina e do Caribe com população maior que 5 milhões de habitantes. Depois, comparou com todos os países.
“É isso mesmo. Temos a maior tarifa média do grupo. Argentina, Venezuela, Bolívia e mesmo Cuba praticam tarifas menores do que as nossas”, escreveu.
Guedes assumiu o cargo há dois anos prometendo implementar o ajuste fiscal com reformas estruturantes, privatizações, cortes de subsídios e a abertura comercial –pilares do modelo liberal que levou o empresariado a encampar a candidatura do então presidenciável Jair Bolsonaro.
Até o momento, o governo pouco avançou nessa política e a expectativa era que pelo menos a Camex fosse cumprir a promessa de redução de tarifas de importação. Ela é presidida por Guedes e a maioria de seus integrantes é da equipe econômica.
Isso tornaria insumos para a indústria mais baratos, melhorando até as exportações de médias empresas que hoje são forçadas a comprar de fornecedores nacionais com preços mais elevados e qualidade inferior.
Apesar do discurso em defesa da livre concorrência, a Camex cedeu à pressão política do governo e da indústria, além de acirrar a política antidumping, elevando tarifas de quase 60 categorias de produtos acima da TEC (Tarifa Externa Comum) cujo teto é 35% do valor de uma mercadoria.
No início de dezembro de 2020, a Camex decidiu, por pedido de Bolsonaro, zerar o imposto de importação de armas de fogo. A alíquota era de 20% para revólveres e pistolas.
Bolsonaro e seus filhos defendem a flexibilização do porte de armas. O presidente chegou a comparecer à reunião da Camex, feito inédito na história do órgão.
Seu filho, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) chegou a postar em suas redes sociais foto com representante da alemã SIG Sauer, uma das fabricantes que tenta convencer o governo a abrir o mercado para estrangeiros.
Guedes defendeu a isenção do imposto dizendo que se trata de um passo rumo a abertura comercial.
A medida, a única genuinamente liberal da Camex por ameaçar o monopólio da brasileira Taurus, acabou sendo suspensa pelo ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Edson Fachin no final do ano passado.
Naquele momento, tubos de oxigênio hospitalar, fundamentais no tratamento da Covid-19, passaram a ser taxados em 14%. Antes eram isentos.
No final de novembro de 2019, a gigante americana de brinquedos Hasbro enviou uma carta para Guedes pedindo que a Camex reduzisse o imposto de importação de seus produtos.
A Hasbro vende brinquedos das marcas Transformers, Power Rangers, Princesas Disney, Star Wars, Marvel, Beyblade, Trolls, dentre outras.
Em novembro de 2020, a Camex aprovou uma redução em três fases dos atuais 35% para 20%. O corte na tarifa será de 5 pontos percentuais a cada seis meses até o segundo semestre deste ano. Hoje a tarifa está em 30%, ainda comparável a de países como Afeganistão e Zimbábue.
Desde o início do governo Bolsonaro, setores da indústria que dependem de máquinas pesadas e equipamentos (os chamados bens de capital) e o segmento de tecnologia, que utilizam bens de informática, pleiteiam a abertura total desse segmento.
A proposta inicial em discussão na Camex, no entanto, era baixar para 4% ao longo de 15 anos. Hoje, bens de capital são taxados em 14% e os de informática, em 16%.
Os grandes fabricantes locais passaram a pressionar o governo para que essa medida não ocorresse ou fosse feita de forma mais suave para barrar os produtos da China. O assunto não prosperou até hoje.
A Camex baixou alíquotas de diversos outros produtos manufaturados, mas, segundo técnicos envolvidos nos estudos e que pediram anonimato, elas ainda estão acima daquelas praticadas por países da OCDE, grupo no qual o Brasil tenta ingressar.
Essas reduções, no entanto, foram concedidas com prazo de validade, cerca de dois anos, o que não define uma política efetiva de abertura, ainda segundo os técnicos do governo.
Além disso, em outra frente, a Camex revisou ao menos 58 casos de dumping (venda de produtos muito abaixo do preço justo).
Quando isso ocorre, o país passa a usufruir do direito de aplicar tarifas adicionais além da TEC por cinco anos, em média.
As novas tarifas cobrem produtos de diversas categorias, desde produtos químicos até lápis de escrever e colorir.
Outro lado Por meio de sua assessoria, o Ministério da Economia informou que a TEC está em processo de análise para adequá-la às atuais necessidades de inserção dos países do Mercosul na economia mundial.
Também informou que negociações comerciais, como as com a União Europeia e a Associação Europeia de Livre Comércio (EFTA), permitirão, além da redução tarifária, o acesso a novos mercados.
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