(FOLHAPRESS) – Nos últimos dias, as atenções dos investidores estiveram voltadas para o processo de privatização da Eletrobras, com análises que apontam para um potencial de valorização de até 85% para os papéis da empresa na Bolsa, resultado dos ganhos de eficiência ao deixar de estar sob o controle do Estado.
Não é apenas a Eletrobras, contudo, que tem atraído a atenção dos investidores.
Com características mais defensivas (ações que geralmente não provocam sustos, mesmo em períodos de crise) e conhecidas por serem boas pagadoras de dividendos, empresas do setor de energia têm marcado presença nas carteiras de gestores de fundos, com foco em transmissão, geração ou distribuição.
As geradoras são as responsáveis pela produção efetiva da energia, com operações de hidrelétricas e de fontes renováveis como eólica e solar, enquanto as transmissoras ficam com o trabalho de fazer o meio-de-campo entre a energia produzida pelas geradoras e as distribuidoras.
As distribuidoras, por sua vez, são as que levam a energia até o consumidor final, e ficam mais suscetíveis à oscilação da demanda de acordo com o cenário econômico.
O caráter essencial da energia e as regras de funcionamento do setor elétrico dão maior previsibilidade às empresas do segmento, o que atenua a volatilidade média de suas ações na Bolsa.
Papéis do setor de energia tendem a se valorizar abaixo da média do mercado, em momentos de euforia e forte alta do Ibovespa, mas, quando o pessimismo toma conta e a Bolsa de forma geral atravessa um período de queda mais acentuada, as ações das companhias elétricas tendem a resistir mais ao vendaval.
No acumulado de 12 meses, até 10 de junho, enquanto o índice amplo de ações Ibovespa registra baixa de 18,9%, o IEE (Índice de Energia Elétrica) da B3 tem recuo mais modesto, de 6,61%.
Sócio e analista da gestora de recursos Perfin, Marcelo Sandri diz que, além da própria Eletrobras, também carrega na carteira dos fundos as ações da Alupar, da Auren Energia (antiga Cesp) e da Equatorial.
O foco principal das empresas selecionadas, diz Sandri, está nas áreas de transmissão e geração renovável de energia, consideradas de maior previsibilidade sob a ótica da geração futura de caixa no longo prazo.
“O setor conta com estabilidade regulatória e é bastante previsível no que diz respeito à geração de caixa. E nesse contexto de crise, são empresas cuja demanda é inelástica, menos suscetível, portanto, aos impactos da perda de renda da população”, afirma o sócio da Perfin, acrescentando que os contratos são reajustados pela inflação, o que garante um ganho real para as companhias e para os seus acionistas.
Sandri diz ainda que, além da valorização das ações na Bolsa no longo prazo, os investidores também costumam ser atraídos pela distribuição de dividendos característica das empresas de energia elétrica.
O especialista calcula entre 6% e 7% o dividend yield (proporção distribuída em dividendos em relação ao valor da ação na Bolsa) anual das elétricas no portfólio da Perfin.
O sócio da gestora entende que, de um modo geral, os papéis do setor de energia estão com preço abaixo do que se poderia experar –o que o mercado chama de excessivamente descontados–, por causa da venda por parte de investidores que intencionavam comprar ações na oferta da Eletrobras.
Os papéis da até então estatal já acumulavam no ano alta de cerca de 20%, mas podem subir ainda mais, segundo Sandri, conforme os ganhos de eficiência com a nova gestão da empresa se materializem.
“A Eletrobras hoje é altamente ineficiente, sob a ótica dos custos em relação à capacidade instalada de geração, que é quase o dobro da média das empresas privadas do setor. Com a privatização, a empresa deve ter a oportunidade de reduzir os custos pela metade, ou até mais do que isso”, afirma o sócio da Perfin, que investiu na oferta de ações.
CEO da gestora Finacap Investimentos, Luiz Fernando Araújo diz que, além de Eletrobras, na carteira dos fundos desde meados do ano passado, já pela expectativa dos ganhos de eficiência pós-privatização, também tem ações de empresas do setor como Transmissão Paulista, AES Tietê, Taesa, Cemig e Energisa.
“Gostamos muito do setor elétrico, especialmente da parte de geração e transmissão, com cerca de 20% da carteira do fundo exposta ao segmento”, afirma o CEO da Finacap, que calcula em algo entre 8% e 10% o dividend yield para as empresas elétricas na carteira.
Ele diz que a eletrificação da economia no longo prazo, com a transição ainda em estágio inicial do combustível fóssil para alternativas de menor impacto climático, tende a impulsionar a demanda das geradoras de energia elétrica em horizonte de longo prazo. Um desses fatores será a adoção crescente de carros elétricos.
Segundo o CEO da Finacap, as discussões em Brasília sobre uma eventual redução na conta de luz, em caso de aprovação do projeto de lei que limita a alíquota do ICMS a 17%, deve ter um impacto positivo para as elétricas de modo geral.
Isso porque, com o alívio no preço da energia cobrada, a tendência é de uma redução na inadimplência das contas em atraso, incentivando um aumento no uso de energia pela população, afirma Araújo.
Gestor de renda variável da AF Invest, Leandro Saliba afirma que, além de Eletrobras, também carrega em carteira uma posição em Neoenergia, mais voltada para a área de distribuição de energia elétrica.
Ainda que empresas do segmento de distribuição estejam mais suscetíveis ao ambiente macroeconômico –com atrasos no pagamento das contas e redução no consumo pela população e por parte das empresas–, Saliba afirma que vê a Neoenergia com um preço bem abaixo do justificável, considerados os resultados operacionais que a companhia tem apresentado nos últimos balanços trimestrais.
“Achamos que a companhia está extremamente barata”, diz o gestor da AF Invest. Ele afirma que a Neoenergira pratica tarifas, em média, até 25% mais baratas do que os pares que também atuam na distribuição, como a Equatorial, por exemplo, o que torna seu negócio mais resiliente em cenários de baixo crescimento econômico, com menor impacto da inadimplência para os resultados.
Saliba acrescenta que a Neoenergia promoveu recentemente investimentos importantes para melhorar a qualidade da rede de distribuição nas praças em que atua – Bahia, Pernambuco, Rio Grande do Norte, São Paulo, Mato Grosso do Sul e Distrito Federal.
Os valores despendidos –cerca de R$ 6,1 bilhões em 2021– foram considerados bastante elevados pelos investidores de forma geral, afirma o gestor da AF Invest, que diz não concordar com a visão que predomina no mercado sobre as estratégias de crescimento das operações da Neoenergia.
“Estamos bem otimistas com o papel da companhia e vemos um potencial de valorização de cerca de 90% nos próximos 2 anos”, diz Saliba.
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