Pela primeira vez na história, quatro gerações dividem o mesmo ambiente de trabalho no mundo corporativo. E essa convivência nem sempre tem sido fácil. Ao mesmo tempo que traz diversidade de ideias, essencial para o crescimento dos negócios, o choque de idades exige que as empresas adotem estratégias e soluções para apaziguar o embate de culturas tão diferentes. De um lado, está o funcionário maduro, fiel e que prima pela estabilidade financeira e profissional. Do outro, jovens inquietos e empoderados, que buscam experiências nas relações pessoais e de trabalho, sem apego a compromissos.
Não conseguir o equilíbrio entre esses dois mundos pode resultar em prejuízos relevantes. Um estudo feito pelas consultorias ASTD Workforce Development e VitalSmarts (hoje Aspectum) mostra que 1 a cada 3 pessoas desperdiçam 5 horas ou mais por semana em conflitos entre colegas de diferentes gerações. Isso significa uma perda de 12% na produtividade do trabalho.
A maior parte dos conflitos surge devido a cultura de trabalho e prioridades distintas. A geração X, por exemplo, acredita na meritocracia ena hierarquia. Entrou no mercado de trabalho em busca do primeiro milhão e de reconhecimento. É motivada pela lealdade e por metas e prazos. Os millennials, ou Y, por outro lado, não gostam muito de hierarquia rígida, são mais informais e têm dificuldade de receber ordens. Já ageração Z, nativa digital, tem dificuldade com interação presencial eére si stent eà escuta ativa. Acredita na ideia de experimentar várias profissões ao longo da vida.
Apesar de algumas empresas estarem avançadas na adoção de medidas para absorver os benefícios dessa diversidade de pensamentos, a maioria ainda parece perdida e em busca de mecanismos para superar o desafio. Muitas acabam se concentrando tanto em formas de retenção das geraçõesYeZ que terminam reféns, além de perder outros talentos.
PERDIDAS. “A maioria das empresas está perdida e não sabe como tratar esses conflitos. Os estímulos tradicionais não funcionam”, diz o presidente da Revvo (empresa de treinamento corporativo), Richard Uchoa. Segundo ele, o choque ocorre com gestores e líderes que, muitas vezes, não sabem lidar com os jovens. “A entrega de um trabalho até o fim do dia, para o mais maduro, pode ser 18 horas, mas para os mais novos pode ser 23 horas.”
Ele explica que esse tipo de conflito, por menor que possa parecer, pode ser motivo até de troca de emprego. Anova geração não tem apreço à posse e quer vivenciar experiências, o que se transforma num grande desafio para as empresas diminuírem a rotatividade. “Eles são ligados ao propósito, não têm muita tolerância e se desestimulam rapidamente.”
O diretor de Negócios Digitais da Weg, Carlos Bastos Grillo, diz que uma das estratégias da empresa é usar o Centro de Formação de Jovens para atrair talentos e moldá-los conforme as necessidades. Mas ele destaca que sempre há um pouco de conflito. As organizações têm padrões a serem seguidos. E, para alguns, há uma certa dificuldade de se adaptar a regras. “Nessa hora é preciso ter habilidade para flexibilizar alguns padrões.”
Dos 26 mil funcionários da Weg, 74% são da geração Y e Z. Outros 25% são da geração X e 1%, baby boomers. Segundo o executivo, uma saída para amenizar o abismo entre as gerações tem sido incentivar o relacionamento entre elas. Uma forma encontrada pela empresa foi colocar profissionais seniores para trabalhar com startups, cuja visão de negócios é ágil e flexível. “A Weg cresce 20% ao ano e precisa sempre de gente nova. Então precisamos superar essa barreira.”
REJEIÇÃO. De acordo com o estudo das consultorias ASTD Workforce Development e VitalSmarts, os maiores conflitos ocorrem entre os baby boomers e millennials. E as maiores discussões estão relacionadas à rejeição de experiências passadas, falta de disciplina e foco, falta de respeito e resistência a mudanças ou falta de vontade de inovar. Mas também já se começa a perceber uma rixa entre a geração Y e Z. Não por acaso recentemente a geração mais nova apelidou a Y de “cringe”, que significa fora de moda, inadequado.
No Santander, essas duas gerações respondem por 65% dos 48 mil funcionários no País. O colaborador mais jovem tem 19 anos, e o mais velho, 74 anos. As características são muito diferentes e cabe às empresas saber contornar essa diversidade, diz a vice-presidente de pessoas da empresa, Elita Ariaz. Segundo ela, as pessoas têm vivido mais, estão produtivas por mais tempo e se aposentam mais tarde.
“Tentamos mostrar para os jovens que os mais velhos já passaram por várias crises e conseguiram encontrar caminhos para problemas complexos. As geraçõesYeZ têm uma inquietude que traz um certo desconforto saudável. São questionadores, eissoémuit orico “, diz E lita. A executiva afirma que a instituição começou políticas para contornares ses conflitos. “Ainda não está pronto, mas estamos estudando programas de mentoria reversa, cursos e eventos sobre o assunto.”
SOFT SKILLS. Como dependem muito dessa nova geração, as empresas apostam em treinamentos para ensinar as chamadas soft skills. “O objetivo é abordar as novas habilidades e competências. As coisas foram tão disruptivas que forçaram todos a entender melhor isso”, diz o vice-presidente global de Gente e Cultura da Stefanini, Rodrigo Pádua.
Os 30 mil colaboradores da Stefanini podem usar uma plataforma de mentoria, como mentor ou mentorado. O objetivo é fazer uma migração de um modelo antigo, de comando e controle, que não funciona mais, para um novo, com mais autonomia e responsabilidade.
Com as mudanças da tecnologia, sobretudo após a pandemia, as empresas também estão tendo de reaprender e reorganizar as estruturas. A área de tecnologia da informação, por exemplo, passou a ter métodos mais ágeis, o que exige colaboração e papéis menos rígidos. “São coisas que não tínhamos há cinco anos”, diz o diretor de Gente e Sustentabilidade da Riachuelo, Mauro Mariz.
Segundo ele, a companhia tem trabalhado com squads, modelo que divide a equipe em grupos para desenvolver assuntos específicos. O executivo diz que os estranhamentos acabam sendo naturais. “Com duas gerações, era mais fácil controlar a situação, pois cada um cedia um pouco. Com quatro, o meio-termo não é uma solução. É preciso atender todos.”
Diálogo entre gerações reduz atritos e amplia aprendizados
A diferença de idade entre Maria Diva Garcia Comin e Gabriela Silva Martins é de 41 anos. As duas pertencem a gerações extremas: uma é baby boomer e a outra, Z. Elas trabalham no Santander e convivem com outras milhares de pessoas. Todos os dias, o desafio é o mesmo: sobressair e tentar aceitar o “jeito” de trabalhar de cada colega. Ainda assim, os conflitos surgem.
Maria Diva faz parte dos 5% de baby boomers que trabalham no Santander e, como tal, gosta de estabilidade. Há 39 anos na empresa, ela acompanhou as mudanças nesta área e o vaivém dos funcionários. “No passado, as empresas eram mais rígidas e não tinham diversidade. Hoje é preciso pensar de forma mais aberta.”
Ela diz que conflitos entre gerações sempre existem. A sabedoria é saber tirar proveito disso. “Os jovens são mais ansiosos e precisam treinar a habilidade de saber ouvir. Por outro lado, eles têm ferramentas para tudo”, diz Maria Diva, que procura tirar proveito da jovialidade de seus companheiros de trabalho para se atualizar. “Já nem uso mais relógio (os jovens acham cringe), mas não abro mão do meu caderninho para fazer anotações.”
Gabriela é da geração Z, tem 21 anos e entrou no Santander com 17 anos, como estagiária. Não se sente como os demais colegas de sua geração, mas tem a característica de persistir nas suas ideias até que alguém lhe ouça. “Já houve situação em que não concordava com determinado processo. Sentei, demonstrei que era melhor simplificar e fui ouvida.”
Na avaliação dela, que adora pesquisar nas redes sociais as tendências do mercado, o mais importante é que a outra pessoa (mais velha e experiente) tenha paciência para ensinar. “Eu tenho disposição para aprender, mas preciso que alguém me ajude a entender como um processo funciona.”
LÍDER. Um pouco mais velho que Gabriela, Mateus Aoki tem 30 anos e é millennial. Sua missão no banco, que tem 40% dos funcionários dessa geração, é um pouco mais complexa. Como líder, precisa tirar o melhor dos profissionais maduros e também dos mais jovens.
“O desafio é conciliar os vários mundos dentro da equipe. É conseguir uma certa rebeldia de forma adulta.”
A estratégia é ouvir as duas partes e tentar encontrar uma solução. “Mas, claramente, os seniores se estruturam melhor na argumentação.” Ele já fez mentoria reversa e afirma que gostou do processo. “Eu queria aprender a priorizar os temas no dia a dia, e ela, que tinha 47 anos, queria saber mais sobre mindset ágil (cultura ou mentalidade de se adaptar às mudanças).”
A representante da geração X é Simone Scrivani, de 54 anos. Na sua equipe, tem profissionais de 19 a 72 anos, sendo a maior concentração nos 35 anos. Como Aoki, ela tenta mirar na integração para evitar atritos. Segundo Simone, os jovens querem ver as coisas acontecendo mais rápido. E não se conformam com o “é assim mesmo”. Ela explica: “Podemos ter momentos de conflito, de ter de explicar mais de uma vez certos processos. Ou de alguém estar ocupado e não ter a solução na hora, mas conversamos e resolvemos.”
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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