Governo cria grupo para decidir o que pode ser ‘classificado’ como desmatamento

O governo decidiu criar uma “Câmara Consultiva Temática”, para decidir o que pode ou não ser enquadrado como desmatamento e incêndios florestais. A ideia é que esse grupo faça uma “qualificação” dos dados que são, há anos, coletados e já qualificados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Ocorre que essa câmara não inclui a participação de nenhum técnico do Inpe, órgão vinculado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), tampouco da própria pasta.

Conforme resolução publicada no Diário Oficial da União nesta quinta-feira, 2, a câmara consultiva será formada por apenas um membro titular e outro suplente dos ministérios do Meio Ambiente, Agricultura, Defesa, Economia e Justiça.

O texto deixa claro que a base dos dados será o monitoramento ambiental coordenados pelo MCTI, em especial nas temáticas de alteração da cobertura vegetal e fogo, com o “objetivo de qualificar os dados de desmatamento e incêndios a fim de diferenciar crimes ambientais de outras atividades, utilizando bases de dados oficiais já existentes”.

Pelas regras, a câmara poderá convidar especialistas e técnicos para reuniões específicas, mas apenas para que façam observações, já que a eventual participação será “sem direito a voto”.

Questionado sobre os motivos de não incluir representantes do Inpe ou do MCTI no grupo, o MMA não se manifestou até a publicação deste texto.

O Inpe tem sido alvo constante de pressão pelo governo Bolsonaro. Um ano atrás, o governo federal decidiu excluir o órgão da atribuição de divulgar alertas sobre incêndios e queimadas em todo o País, passando essa atribuição ao Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), ligado ao Ministério da Agricultura. Naquela ocasião, a pasta da Agricultura declarou que “a iniciativa se deu devido aos incêndios florestais e queimadas, que ocorrem normalmente de julho a setembro no Brasil central, ocasionando grande impacto ao meio ambiente, ao agronegócio e à economia brasileira”.

Em 2019, o físico Ricardo Galvão, reconhecido pelo trabalho científico que desenvolve há décadas no setor, foi exonerado do cargo de diretor do Inpe pelo presidente Jair Bolsonaro, após defender os dados de desmatamento da Amazônia produzidos pela instituição.

Na época, Bolsonaro afirmou que os números do Inpe eram mentirosos e insinuou que Galvão estaria “a serviço de alguma ONG”. O pesquisador reagiu, defendeu a ciência produzida pelo instituto e seus pesquisadores e acusou Bolsonaro de tomar uma “atitude pusilânime e covarde”. Após duas semanas de embates, Galvão foi exonerado. Ele estava no Inpe desde 1970 e cumpria mandato à frente do órgão até 2020.

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