LISBOA, PORTUGAL (FOLHAPRESS) – O Partido Socialista, no poder desde 2015, venceu as eleições legislativas de Portugal neste domingo (30) e garantiu, sozinho, maioria absoluta no Parlamento -resultado considerado surpreendente.
Com mais de 99% dos votos apurados, a legenda do premiê António Costa conquistou quase 42% dos votos e ao menos 117 dos 230 assentos na Assembleia da República.
Pesquisas de intenção de voto divulgadas na última semana da campanha projetavam um empate técnico entre o PS e o maior partido da oposição, o PSD (Partido Social-Democrata).
Desde 1976, houve apenas quatro maiorias absolutas em Portugal, sendo quatro do PSD. O Partido Socialista também realizou o feito em 2005, com José Sócrates, figura hoje em desgraça na política portuguesa por conta de acusações de corrupção e favorecimento ilícito.
“Uma maioria absoluta não é um poder absoluto. Não é governar sozinho. É uma responsabilidade acrescida. Governar é para e com todos os portugueses. Essa será uma maioria de diálogo, com todas as forças políticas que representam na Assembleia da República os portugueses na sua generalidade”, prometeu Costa, no discurso da vitória.
“Tenho de reconhecer que esta noite é muito especial para mim. Depois de seis anos de exercício de funções como primeiro-ministro, depois dos últimos dois anos num combate sem precedentes contra uma pandemia, é com muita emoção que assumo esta responsabilidade que os portugueses me confiaram.”
Os social-democratas aparecem com 27,8% dos votos e garantiram, por enquanto, uma bancada de 71 deputados. Em discurso após a confirmação da vitória socialista, Rui Rio, presidente da legenda, assumiu a derrota do PSD.
“O resultado que tivemos está muito longe daquilo que entendemos que iríamos ter”, disse o social-democrata. Ele destacou que o PSD ampliou o número de votos em vários distritos, mas atribuiu à mobilização da esquerda a dianteira que os socialistas assumiram nas eleições.
“Houve um voto útil à esquerda absolutamente esmagador. Ou seja: a esquerda mobilizou-se através do voto no Partido Socialista para evitar que o PSD pudesse indicar o primeiro-ministro. Não houve isso no campo da direita”, afirmou.
Uma grande mudança na composição do Parlamento ficará por conta do aumento expressivo da bancada do partido da extrema direita Chega, que assumiu o posto de terceira maior força política do país.
A legenda, que foi criada e entrou na Assembleia da República em 2019, teve pouco mais de 7% dos votos. Com isso, o Chega, que tem atualmente apenas um deputado, garantiu ao menos 12 representantes -apenas uma mulher- no Parlamento.
O partido se apresenta como antissistema e acumula propostas polêmicas, como a volta da pena de morte e a castração química de pedófilos. Também conviveu com integrantes ligados a organizações neonazistas e é frequentemente acusado de discurso discriminatório contra comunidades ciganas.
Líder da sigla e seu único representante no Parlamento até as eleições deste domingo, o deputado André Ventura já foi condenado por “ofensas ao direito à honra” depois de ter chamado de bandidos, durante um debate na TV, os integrantes de uma família negra e moradora de um conjunto habitacional. A decisão foi confirmada em dezembro pelo Supremo Tribunal de Justiça de Portugal. O populista foi o terceiro colocado na eleição presidencial de um ano atrás, com 11,9% dos votos.
“Se o Partido Socialista acha que vai ter a vida mais facilitada nesta legislatura, nós vamos lhe transmitir a mensagem precisamente oposta. O que não foi feito nos últimos seis ou sete anos, começará a ser feito já amanhã”, afirmou Ventura, diante do resultado positivo de sua sigla.
Ao responder perguntas da imprensa, António Costa adiantou que irá se reunir com representantes de todos os partidos, menos com o Chega. A legenda da direita radical deve encontrar mais animosidade durante a próxima legislatura.
“Cada racista eleito no Parlamento português é um deputado a mais. E lá estaremos para combatê-los todos os dias”, disse, em um duro discurso, Catarina Martins, líder do Bloco de Esquerda (BE), em referência aos parlamentares eleitos pelo Chega.
Os resultados do pleito foram particularmente ruins para os partidos mais à esquerda, antigos parceiros dos socialistas na sustentação do governo. Na avaliação de analistas, as legendas desse campo político parecem ter sido responsabilizadas nas urnas pelas eleições antecipadas.
O Bloco de Esquerda e o Partido Comunista Português (PCP) votaram contra o Orçamento de Estado para 2022 apresentado pelo Executivo, o que acabou levando à rejeição da proposta e a uma crise que abalou as estruturas da geringonça, apelido dado à aliança entre os tradicionalmente divididos partidos da esquerda portuguesa.
Com o resultado na votação do Orçamento, o presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, decretou a dissolução do Parlamento e a convocação de novas eleições.
Durante a campanha, o premiê António Costa insistiu no discurso de responsabilização política dos antigos parceiros à esquerda. A estratégia parece ter funcionado, uma vez que as pesquisas indicam uma grande transferência de votos, sobretudo do Bloco de Esquerda para os socialistas.
Ao assumir a derrota, Pedro Filipe Soares, número dois do BE em Lisboa, acusou o PS de chantagem e de provocar uma bipolarização forçada do país.
Os comunistas, por sua vez, perderam representantes em alguns de seus redutos tradicionais, como o Alentejo, no sul do país. Líder parlamentar da legenda e um dos rostos da campanha, João Oliveira não conseguiu se reeleger em Évora. Foi a primeira vez, desde a redemocratização de Portugal, que o PCP não elegeu ninguém na cidade alentejana.
Conhecido pela habilidade de costuras políticas, António Costa adicionou mais uma conquista inesperada para a lista.Prefeito de Lisboa, ele chegou à liderança do Partido Socialista em 2014, após desafiar o então secretário-geral da legenda, António José Seguro, nas primárias que escolheriam o candidato a primeiro-ministro.
À frente do PS nas eleições de 2015, ficou em segundo lugar nas urnas, mas garantiu o posto de premiê após articular uma inédita coalizão com as legendas do mesmo campo político -a geringonça.
O partido ambientalista PAN, que em 2019 elegeu quatro deputados, fica agora com apenas uma representante. Tradicional partido da direita conservadora portuguesa, o CDS-PP, que tinha cinco deputados, perdeu a representação parlamentar. O líder da legenda, Francisco Rodrigues dos Santos, pediu demissão após a confirmação do fiasco eleitoral.
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