WILLIAM CASTANHO
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Magistrados e a cúpula da Justiça do Trabalho travam uma batalha em torno de um bônus. Juízes querem receber benefícios atrasados. O CSJT (Conselho Superior da Justiça do Trabalho), porém, nega o pagamento.
O caso está no CNJ (Conselho Nacional de Justiça). A Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho) e a Amatra-15 (Associação dos Magistrados do TRT-15 de Campinas) questionam a decisão.
A recusa da quitação é da ministra Maria Cristina Peduzzi, presidente do CSJT e do TST (Tribunal Superior do Trabalho). Ela afirmou que não pagará “nenhum centavo de real de recursos públicos” se houver dúvidas sobre dívidas.
Segundo o CSJT, a Anamatra pede a quitação de R$ 10,5 milhões neste ano de benefícios atrasados, de anos anteriores. O órgão disse que já pagou R$ 111,5 milhões em passivos administrativos.
O impasse está nas chamadas GECJs (gratificações por exercício cumulativo de jurisdição). O benefício foi instituído por lei federal em 2015.
Pelas regras, têm direito ao extra de um terço sobre o salário magistrados que trabalhem em duas varas ou recebam volume excessivo de novos processos, por exemplo.
O pagamento fica limitado ao teto constitucional, de R$ 39,3 mil –o salário de um ministro do STF (Supremo Tribunal Federal). Um juiz ganha R$ 33,7 mil por mês e um desembargador, R$ 35,5 mil.
A lei para o pagamento da GECJ, porém, é regulamentada pelos próprios conselhos de Justiça. O CSJT previa regras mais rígidas.
Por resolução, não recebiam o benefício juízes do trabalho com sentenças em atraso nem entravam na soma de processos novos as chamadas cartas precatórias –quando um magistrado de uma determinada vara colhe um depoimento de testemunha por pedido de um colega de uma outra região.
Essas restrições foram derrubadas pelo CNJ em 4 de fevereiro de 2020. Com a decisão, de âmbito administrativo, juízes com sentenças atrasadas e responsáveis por cartas precatórias ganharam o direito ao bônus.
No dia 2 de dezembro deste ano, Peduzzi, em despacho, rejeitou a quitação de qualquer passivo anterior à decisão do CNJ. É contra esta decisão que se voltam as duas entidades.
Caberá ao ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux, que preside o CNJ, manifestar-se sobre a quitação na reclamação ajuizada pela Anamatra. Já o questionamento da Amatra-15 foi feito no próprio processo julgado em 2020, sob relatoria de Richard Pae Kim.
Questionada, a Anamatra disse que aguarda a decisão. Sérgio Polastro Ribeiro, presidente da Amatra-15, afirmou, em nota, que a entidade pede a execução integral do orçamento de cada órgão.
No documento do início deste mês, Peduzzi afirmou que a Justiça do Trabalho tem disponíveis R$ 210,9 milhões. Há um total de R$ 120,1 milhões que serão destinados a pagamentos de passivos. Para as entidades, há dinheiro.
A Anamatra recorreu ao CNJ no dia 6, com reclamação assinada pelo advogado Emiliano Alves Aguiar. Ele pediu uma liminar (decisão provisória) para forçar o pagamento.
De acordo com Aguiar, “não compete ao CSJT, de forma exorbitante, modular os efeitos da decisão plenária do CNJ, quando este próprio não o fez”.
Fux deu 15 dias para Peduzzi responder. No dia 14, a ministra então afirmou ao presidente do CNJ que segue regras constitucionais.
“A restrição estabelecida quanto ao pagamento da ‘GECJ’ foi pautada no respeito ao princípio da legalidade administrativa (art. 37 da CF [Constituição Federal]), segundo o qual somente é dado ao administrador público praticar aquilo que a lei autoriza”, escreveu Peduzzi.
De acordo com ela, a decisão do CNJ não determinou o pagamento retroativo. Além disso, afirmou, não há previsão do pagamento dessa despesa no orçamento.
“Assim, não caberia o pagamento pela via administrativa, mas apenas e tão somente, se for o caso, pela via judicial”, afirmou. Dessa forma, se a entidade quiser receber retroativos, ela deve ingressar com ação judicial, esperar o andamento do processo e receber, em caso de vitória, por meio de precatórios.
No dia 17, a Amatra-15 questionou a decisão de Peduzzi. Ao conselheiro Kim os advogados Fernando Fabiani Capano e Cristiano Sofia Molica afirmaram que, “a demonstrar costume useiro e vezeiro”, Peduzzi “afastou –sem justificativa motivada e fundamentada– o regular pagamento de tais verbas”.
Kim deu prazo de manifestação até as 18h de terça-feira (21). Ao conselheiro Peduzzi respondeu que o processo “já deveria ter sido extinto por perda de objeto”. A ministra disse se pautar “pelo mais elevado cuidado e rigor no tratamento dos recursos públicos e respeito às normas de gestão fiscal”.
“A presidência do Conselho Superior da Justiça do Trabalho […] não promoverá o pagamento de nenhum centavo de real de recursos públicos que não sejam, induvidosamente, devidos”, escreveu Peduzzi.
Em nota, o CSJT afirmou à reportagem que todos os passivos que poderiam ser pagos administrativamente estão sendo quitados neste ano.
De acordo com o órgão, a decisão do CNJ, de 2020, “não estabeleceu, contudo, comando quanto à retroatividade dos seus efeitos”. “Assim, considerando a lógica da legalidade estrita, não é dado ao administrador público promover interpretação extensiva que levaria à execução de despesas públicas.”
Também em nota, Ribeiro, da Amatra-15, afirmou que as dívidas são “definitivas e consolidadas”. Segundo ele, se não pagas, irão gerar encargos ao Tesouro.
“Esta entidade associativa não pretende a criação de novos benefícios ou a concessão de novas verbas”, disse Ribeiro. “Importante frisar que postergar o pagamento de parcelas vencidas e reconhecidas, seja em lei, resolução ou decisões plenárias do CNJ, em vista dos encargos que se avolumam, em nada contribui para a saúde fiscal do país.”
Desde 2018, as GECJs estão na mira do TCU (Tribunal de Contas da União). Segundo auditoria da corte, o benefício tem sido pago mesmo sem eles terem feito nenhum esforço a mais para merecê-lo.
O relatório calculou potenciais prejuízos aos cofres da União em R$ 82,9 milhões por ano, ou R$ 331,5 milhões até 2021. O MPTCU (Ministério Público junto ao TCU) concordou com o relatório.
Os órgãos do Judiciário ligados à União disseram, na ocasião, pagar somente por excedente de trabalho. O caso seria julgado em 28 de abril, mas foi retirado de pauta e segue em aberto. Já no CNJ, Kim e Fux ainda não decidiram sobre os pedidos das entidades.
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