Programa “HumanizAção” permite retorno ao lar ou novo começo a pessoas que viviam em situação de rua e afastadas de seus laços familiares

O programa “HumanizAção” realiza, diariamente, abordagens sociais a pessoas em situação de rua, sempre com o objetivo de olhar com humanidade essas pessoas, prestar acolhimento e serviços essenciais para o seu bem-estar, e, sobretudo, buscando proporcionar uma mudança real de vida para cada uma.

E, em várias situações, isso já vem acontecendo. Ao longo do ano, desde que teve início o programa, em janeiro, já puderam reencontrar a família de origem 744 pessoas que estavam em situação de rua. Esse retorno se dá sempre que há o desejo da pessoa e é possível reconectar os laços familiares. Mesmo quando isso não é possível, um recomeço, com novas condições de vida, tem possibilidade de acontecer.

Dois homens em situação de rua que eram acolhidos no Serviço de Obras Sociais (SOS) hoje se orgulham em dizer que encontraram um lar. Cada um mora em sua própria casa, de forma totalmente independente, na chamada Vila Dignidade, localizada na Zona Oeste da cidade. As moradias foram conquistadas a partir do empenho conjunto das equipes que integram o “HumanizAção”, contando com o respaldo da Secretaria da Cidadania (Secid).

As unidades do condomínio Vila Dignidade são residências assistidas, que abrigam pessoas atendidas pelo Centro de Referência do Idoso (CRI) e pelos CRASs (Centro de Referência em Assistência Social) e que preenchem uma série de requisitos, tais como: faixa etária acima dos 60 anos, não contar com o apoio de nenhum vínculo familiar, ter autonomia para uma vida independente (sendo capaz de realizar as próprias tarefas domésticas, por exemplo), ser atendido pelo BCP (Benefício de Prestação Continuada), entre outros. Além da Vila Dignidade, existem algumas unidades residenciais, no Carandá e Altos do Ipanema, que igualmente são disponibilizadas para esse público atendido.

O Sr. Whashington, de 65 anos, está há quatro meses em sua nova casa, na Vila Dignidade. E o Sr. Joaquim, de 60 anos, mudou-se para o seu novo lar, vizinho ao do colega, há pouco mais de um mês. “Pra mim, aqui é o Paraíso. Tenho tudo que preciso, todo apoio. É excelente! E só temos que agradecer a Deus. Porque existem pessoas boas, trabalhando por nós. Eu só tenho coisas boas pra falar desse lugar”, revela Sr. Whashington.

Ele conta sua história de vida, que mudou radicalmente depois que sofreu um acidente com o caminhão que trabalhava. “Eu saí de Bauru (SP) e, às 5h da manhã, estava em Caxias do Sul (RS). Mas dormi ao volante e, quando me dei conta, o caminhão tinha descido uma ribanceira. Na hora que voltei a mim, pensei: graças a Deus estou vivo. Mas estava com o corpo, do pescoço pra baixo, todo engessado. Clavícula quebrada, pena e braço quebrados. Perdi todos os dentes da boca. Nossa! Perdi o movimento das mãos”, ele relata.

Para se recuperar, passou nove meses internado no hospital. Ele nem sabe como, mas sobreviveu ao acidente. Só que, a partir daí, mudou tudo. “Tive uma situação até razoável, mas a vida mostra que, às vezes, o destino não é o que a gente sonha. Tenho família. Está tudo por aí. Mas, aconteceu que quando tinha poder aquisitivo razoável, tinha amigos, família. Quando não tinha nada, realmente não tinha nada. Não tinha mais convivência na família e resolvi sair. Nos primeiros meses, consegui pagar um hotelzinho. Depois, não deu mais. Por sorte, logo fui para o SOS. O acolhimento era muito bom lá. Mas não era minha casa, como eu tenho agora. Hoje, eu só quero ser grato, pelo município que me acolhe, pelo prefeito que faz de tudo para a gente ter um pouquinho de dignidade.

É o que todo mundo quer. E eu me sinto como a Fênix, que renasce das cinzas. Agora, tenho a Vila Dignidade para morar. Como eu digo sempre, um Paraíso!”, descreve Sr. Whashington.

Embora uma nova chance tenha chegado também para o Sr. Joaquim, sua história de vida foi diferente. “Estou aqui há pouco tempo, mas parece mais que um ano. Muito bom aqui, não imaginava. Minha vida estava destruída. Bebia muito. Já faz oito anos que parei. Tomei a decisão e falei: chega! Morei na rua quase 30 anos. Mas o errado era eu. Com o vício, ninguém aceita a gente mesmo. Então, tomei a decisão de largar. Tenho uma filha, que agora está casada e tem filhos. Tentei manter contato, ia visitar de vez em quando, mas agora perdi o contato. O telefone que eu tinha não atende mais. Da última vez que eu vi, ela já tinha uma filha e estava grávida de novo. Depois tentei várias vezes e não consegui mais falar. Ela morava com a mãe, mas aí ela casou e se mudou para Itu”, relembra.

Recentemente, ele estava sendo acolhido no SOS. Mas entendeu que ali não era um lar definitivo e se preocupou com isso. Uma das profissionais que trabalha no lugar falou para ele manter a esperança. “Arrumaram para mim essa casa. E eu estou muito feliz aqui”, diz com a voz embargada, deixando as lágrimas rolarem. Mas, avisa: “Eu estou chorando, mas é de emoção. Não sei como agradecer a Deus de estar aqui. Vamos supor que eu estava morto já. Mas tomei a decisão: um dia, minha vida vai melhorar. E melhorou para mim! Vou fazer de tudo para manter tudo em dia. Gosto das minhas coisas bem arrumadinhas”, fala Sr. Joaquim.

E prossegue: “Aqui, tenho minhas coisas. Ninguém mexe nas coisas da gente. Só sinto falta das amizades que fiz no SOS. Esse (Sr. Whashington) eu conheci lá e temos amizade aqui também. Embora que eu sou difícil de fazer amizade. Porque a gente tem experiência lá detrás. Pensa que era amigo e não era amigo. Vou mais devagar. Mesmo assim, gente que eu conheci há pouco tempo já me deu várias coisas. Dias atrás ganhei um cobertor. E pessoas que eu nem conhecia têm me ajudado. Levaram para receber benefício, para tirar documentos. Gente que eu nunca vi. Estou feliz novamente. Vou seguir o barco”, finaliza.

Cada um tem seu próprio histórico de vida, com passagens sofridas, que eles não escondem. Ao contrário, valorizam a superação de tantos momentos difíceis, conscientes de que não fizeram isso sozinhos.

“Parei com a bebida em um sábado para começar o domingo. Pensei: se eu não gostar de mim, quem vai gostar? Toda vida trabalhei, mas não tinha um Real no bolso. Tudo que tinha era para a bebida. Pensei que a morte ia vir e falei: não, chega! E estou até hoje, graças a Deus. A gente já foi moleque na vida. Mas pensei em mim, na minha filha. Toda decisão é da gente”, aconselha.

Sr. Washington faz questão de olhar para o futuro. “Eu vou fazer 66 anos, em maio, e tenho um detalhe bem peculiar. Diferente da maioria que está na rua. Eu nunca tive vício. Não bebo, nunca fumei. O que me deixou em situação difícil foi realmente o destino, porque eu trabalho desde os seis anos de idade. Pensei, e agora? Agora, vivo no Paraíso e tenho esses anjos cuidando de mim.”

Fotos: Fernando Abreu – Secom


Cidadania – Agência de Notícias