O Brasil atingiu nesta quarta-feira, 20, um marco importante na vacinação contra a covid-19: mais de 50% da população está com o esquema vacinal completo. Se no início da campanha as pessoas se emocionavam ao tomar a primeira dose, agora a sensação é de grande alívio. A doença que matou mais de 600 mil pessoas no País vem em curva descendente graças ao aumento no número de vacinados. Claro que não se pode baixar a guarda e medidas restritivas ainda são necessárias. Mas muitos já olham para frente com esperança na expectativa de uma retomada.
Os registros do consórcio de veículos de imprensa, que completa 500 dias de trabalho colaborativo, mostram que 107.407.959 pessoas já tomaram as duas doses da vacina, ou a dose única da Jansen. Já os imunizados parcialmente são 152.450.710, o equivalente a 71,47% da população. Sem contar os mais de 5 milhões que tomaram a dose de reforço. Todo esse avanço na imunização nacional deixa para trás um período de negacionismo científico e discursos contra a eficácia da vacina – apesar de eventos como o de ontem em Porto Alegre, quando um grupo antivacina suspendeu uma sessão legislativa.
Se no “novo normal” as aulas eram virtuais, os shows ocorriam em formato de lives e as reuniões aconteciam com cada um em sua casa, agora a vida se desenha de uma maneira que já conhecemos melhor. Aos poucos o velho cotidiano está voltando. “Eu me sinto, até como personalidade, como influenciadora, honrada de lembrar as pessoas do avanço na nossa civilização que foi a vacina, gente! E é nítido essa queda de casos, a gente está vendo a vacina funcionar, graças a Deus. Então é óbvio que precisamos de vacina”, disse a atriz Marisa Orth, lembrando que as pessoas estão conseguindo ir ao teatro com o comprovante de imunização. “É um prazer enorme estar voltando agora. Tem um gostinho, sim, de resistência, de reencontro, de valorização das coisas do dia a dia, que acho que todo mundo passou por isso. Então, para o teatro, acho que é um momento de luxo, de celebração, de amor mesmo.”
A classe artística sofreu um impacto grande no período mais duro da pandemia. Shows e eventos foram cancelados e os próprios artistas tiveram de se reinventar. Ney Matogrosso, de 80 anos, fez no início do mês o primeiro grande show após o período de isolamento social provocado pela covid-19. Para ele, foi uma apresentação simbólica e marcante. “Foi um dia especial e eu fiquei muito feliz por estar voltando, estava me sentindo muito bem ali no palco. Ninguém podia se levantar, chegar perto do palco ou tirar a máscara. E isso foi respeitado. Foi a primeira vez em que não recebi pessoas no camarim depois de uma apresentação. Meio estranho isso, mas não dava para receber mesmo”, contou.
O cantor revela que esperava que esse período de distanciamento durasse até mais tempo, mas festejou o retorno aos palcos seguindo todos os protocolos. “É bom sentir a vida voltando. Já tenho agenda de shows até o Rock in Rio Lisboa, em junho de 2022. Tudo o que estava paralisado está sendo retomado. Com cuidado, mas está. Ter me vacinado foi importantíssimo. Se não tivesse feito isso, não estaria vivendo essa volta”, explica.
No dia que o Brasil superou a barreira de 50% das pessoas completamente vacinadas, o Estadão visitou a UBS Butantã, em São Paulo, para conversar com as pessoas que estavam buscando a imunização. João Daniel Castro, de 23 anos, e Lucila Ribeiro Jardim, de 22 anos, foram juntos e tomaram a segunda dose. “É um vírus muito cruel, meu avô faleceu em julho por causa dele. Então é muito importante se vacinar para poder voltar à vida normal em breve”, disse, enquanto sua amiga completou: “Quero a minha vida social de volta. Uma tia também morreu de covid. É duro ver as pessoas morrendo por isso”.
O empresário Thiago Tigre e a diarista Rosângela Queiroz também tomaram a segunda dose nesta quarta. Ambos reforçaram que era um gesto mais do que necessário. “Me sinto fazendo o meu dever”, comentou Thiago. A operadora de caixa Filomena Benedito conta que demorou a tomar a segunda dose porque na data que deveria o imunizante estava em falta. “Muitos amigos morreram. Tomar essa vacina me deixa mais tranquila.” A história dela é parecida com a de muitas outras pessoas, que viram de perto a tragédia. Dinilza Azevedo, de 76, aproveitou para tomar a terceira dose, um reforço na imunização. “É muito importante se proteger. Se cada um fizer a sua parte já vai melhorar um pouco.”
Um ponto muito importante do avanço da vacinação foi possibilitar o retorno do ensino presencial nas escolas. Aos 62 anos, o professor Clodoaldo Correia tomou a segunda dose em maio. A maioria das escolas públicas de São Paulo estava parada, mas a dele não. Trabalhador da Escola Estadual Eliza Rachel em Guaianases, zona leste de São Paulo, ele só saia de casa para o trabalho e, quando completou a imunização, sentiu que poderia estar presente na escola com menos riscos. Estar seguro enquanto ensina foi o principal motivo para se vacinar. “O ensino que eu acredito se preocupa com a condição emocional do aluno e olha para a relação entre aluno, escola, família e outros vínculos”, disse.
LINHA DE FRENTE
Em fevereiro deste ano, o médico infectologista Jamal Suleiman tomou a segunda dose. Ele fez parte do primeiro grupo contemplado pela vacina – o de profissionais da saúde – e foi imunizado antes da maioria dos brasileiros, mas, naquele momento, não sentiu o alívio que esperava. A pandemia no Brasil piorava e chegava ao seu momento mais crítico.
Na linha de frente do combate à pandemia no Hospital Emílio Ribas, Suleiman via pessoas e mais pessoas internadas em estado grave a cada dia. O hospital entrou em colapso de leitos de UTI no mesmo mês em que foi vacinado. Pouco tempo depois, Suleiman ainda perdeu para a doença o irmão e a cunhada, que estavam a duas semanas de tomarem o imunizante. “Tomar a vacina naquele momento me deu uma sensação de alívio e frustração. Sabia que a situação era muito grave e, ao mesmo tempo, que a vacina iria mudar a história.”
A janela mais próxima de sua mesa de trabalho dá para uma mureta do necrotério onde familiares esperavam a liberação do corpo das vítimas. Suleiman passou meses assistindo a filas de pessoas e de veículos de funerárias no local – uma cena brutal que não gosta de se recordar. Depois, viu a vacinação avançar e o número de infectados diminuir. Entretanto, continuou recebendo pacientes em estado grave. Oito a cada dez desses, diz, não haviam se vacinado.
O médico continua sem receber visitas em casa, não vai a estabelecimentos fechados, como restaurantes, e usa máscara em todos os lugares, exceto em casa. Pai de duas filhas, ele não as viu até que elas e os maridos estivessem completamente imunizados. “A pandemia não acabou, apesar da vacinação avançar. Daqui a algumas semanas, podemos dizer que isso tudo passou. O momento atual ainda é de preocupação”, concluiu o especialista, lembrando que é importante que a vacinação avance ainda mais. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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